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Fugindo de estereótipos, séries mostram a velhice como outra fase da vida

Confira dicas de produções disponíveis nos serviços de streaming estreladas por atores idosos

Por João Pedro Malar
Atualização:
Algumas séries lançadas nos últimos anos têm buscado se afastar dos estereótipos envolvendo o envelhecimento, buscando uma representação mais realista Foto: Netflix / Divulgação

Muito mais que integrantes do grupo de risco do novo coronavírus ou pessoas que apenas possuem uma vida tranquila e pacata, os idosos compõe um grupo diverso em interesses, problemas, histórias e objetivos. No geral, porém, a representação deles em séries, propagandas, filmes e novelas ainda deixam a desejar e caem em estereótipos, apesar dos avanços.

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A análise é de Sandra Maria Ribeiro de Souza, professora aposentada da Escola de Comunicações e Artes da USP. Sandra pesquisa a representação de idosos na mídia, e as análises que ela tem coordenado e produzido mostram que ao aparecerem nas telas, da televisão a celular, os idosos ainda caem em duas caixas: “existe o jovem com rugas e a pessoa próxima da morte”.

A professora explica que, no primeiro caso, o idoso é retratado em uma “eterna juventude”. “Os idosos sempre agem como jovens e adultos, fazendo coisas de jovens”, explica ela. Aqui são ignoradas questões naturais que podem surgir na velhice, como aposentadoria, doenças, cansaço ou até uma visão de mundo mais madura.

Já no segundo caso todos esses pontos são exacerbados. O idoso é retratado como se estivesse com o pé na cova, repleto de doenças, sem disposição. Às vezes também é visto apenas reclamando ou repreendendo os mais jovens.

Para Sandra, existe uma grande dificuldade em encontrar um meio termo entre essas representações, que significaria uma representação mais realista da velhice como  “uma fase como qualquer outra”. E ela ressalta que é exatamente esse realismo que “os idosos realmente buscam” ao ver produções audiovisuais.

Tratar a velhice como outra fase normal da vida seria entender que nela as pessoas têm seus problemas, mas também mantém uma série de hábitos e atividades que realizavam quando era mais jovem, e também podem ter novos interesses, relacionamento e projetos. 

Em 'O Método Kominsky' Michael Douglas e Alan Arkin vivem dois amigos que lidam juntos com o processo de envelhecer e outros desafios do dia a dia Foto: Netflix / Divulgação

Uma das grandes causas para esse cenário, segundo a professora, é uma ausência dos idosos no processo de criação dos conteúdos. “Os jovens tentando fazer a produção ainda têm problemas. Eles ainda não passaram por essa fase [a velhice], e caem em ideias romantizadas - o que ela pode ser, o que querem que seja para eles -, mas isso é irrealista ou é passado”, explica Sandra.

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Mas o aumento da expectativa de vida da população e a existência de idosos que ainda se mantém no mercado de trabalho têm mexido nessa questão. “Os artistas estão ficando mais velhos, querem papéis a sua altura, querem ir além da visão do idoso como se ele estivesse para morrer e precisa ser cuidado, ou que é um idoso galã. Buscam papéis que respeitam a idade”, pontua a professora. E esse processo de ouvir o idoso e suas experiências, e insistir em uma representação mais realista já tem tido trazido mudanças positivas.

As séries Grace e Frankie, O Método Kominsky e Star Trek: Picard possuem todas um ponto em comum: são protagonizadas por atores idosos, todos consagrados e premiados, e que também participaram, como produtores, do desenvolvimento das produções, trazendo com isso suas opiniões e visões sobre o processo que estão vivenciando.

Patrick Stewart interpreta novamente o capitão Jean-Luc Picard na série 'Star Trek: Picard', agora como um oficial mais velho e aposentado Foto: Amazon / CBS / Divulgação

Os problemas, seja no espaço ou na Califórnia, dos protagonistas envolvem a idade, mas vão além dela. Criar uma empresa, dar aulas de atuação, viajar pelo espaço, tudo isso enquanto lidam com preconceitos devido à idade, incômodos diários e, sim, doenças. Ao mostrar as camadas que existem na velhice, como em qualquer outra fase da vida, essas produções conseguem apresentar as múltiplas facetas do processo de envelhecimento.

Sandra destaca que “é difícil achar essa medida de representação”, mas considera ser inevitável, com o surgimento dos idosos como mercado consumidor e a existência de consagrados atores que chegaram à terceira idade que, cada vez mais, as produções não deixem os idoso como figurantes, jovens com rugas ou pessoas à beira da morte. E com isso consigam dar o protagonismo que esse importante grupo da sociedade merece.

Confira séries que buscam fugir de estereótipos ao trabalhar a velhice:

Grace e Frankie - Lançada em 2015, é estrelada por Jane Fonda, com 82 anos, e Lily Tomlin, 80, que atuam também como produtoras executivas. Ela mostra a relação de duas mulheres que são obrigadas a conviver juntas depois que os maridos se separam delas e revelam que são homossexuais. Retratando as aventuras e desafios da terceira idade, a série conta com seis temporadas. Ela está disponível na Netflix.

O Método Kominsky - Lançada em 2018, é protagonizada por Michael Douglas, de 75 anos, e Alan Arkin, 86, e mostra a relação entre dois amigos, um professor de teatro e um agente de Hollywood, que enfrentam juntos a velhice com bom humor. Passando pelo amor, aulas de teatro e problemas na próstata, a série conta com duas temporadas. Ela é dirigida por Chuck Lorre, com 67 anos, e está disponível na Netflix.

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Star Trek: Picard - Lançada em 2020, a produção resgata o personagem Jean Luc Picard, da renomada série de temática espacial Jornada nas Estrelas: A Nova Geração. Agora aposentado e vivendo recluso em uma vinícula, o personagem vivido por Patrick Stewart, de 79 anos, acaba voltando à ativa após descobrir uma conspiração contra seres artificiais, que tenta impedir. Stewart atua como produtor executivo da série, que está disponível na Amazon Prime Video.

Os Experientes - A produção nacional foi lançada como uma minissérie pela Rede Globo, em 2015. Ela conta com nomes de peso no elenco, como Beatriz Segall, Selma Egrei, Juca de Oliveira e Lima Duarte, e mostra quatro histórias sobre o envelhecimento e o ato de se redescobrir ou se reinventar com ele. Cada episódio apresenta um elenco e cenários diferentes, de um assalto a banco a uma roda de samba. Ela está disponível no Globo Play.

*Estagiário sob supervisão de Charlise Morais