Depois de serem os ‘Maiores Perdedores’, seus corpos lutaram para recuperar peso

A maior parte dos 16 competidores da 8ª temporada de ‘The Biggest Loser’ recuperou grande parte, senão todos os quilos perdidos com árduo trabalho

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Por Gina Kolata
Atualização:
Danny Cahill tocando baixo durante um serviço em um igreja perto de Tilsa, Oklahoma, nos Estados Unidos Foto: Ilana Panich-Linsman/ The New York Times

Danny Cahill foi o ganhador da 8 ª Temporada do reality show da NBC, "The Biggest Loser", porque perdeu mais peso do que todos os outros concorrentes - impressionantes 119 quilos em sete meses. Quando subiu na balança para todos verem naquela noite de 8 de dezembro de 2009, ele pesava apenas 95 quilos, em comparação aos anteriores 214. De camiseta e shorts até o joelho, ele estava magro, atlético e lindo, um verdadeiro modelo. "Recebi minha vida de volta", declarou. "Tenho a sensação de ter ganho um milhão".

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Mas desde então, cerca de 50 quilos voltaram para a sua estrutura corporal: mais de 1,80 metro, apesar dos seus esforços. Na realidade, a maior parte dos 16 competidores daquela temporada recuperou grande parte, senão todos os quilos perdidos com árduo trabalho. Alguns até estão mais gordos agora.

Entretanto, suas experiências, e a sua amarga decepção, foram uma dádiva para a ciência. Um estudo realizado com os participantes da 8ª temporada forneceu novas e surpreendentes descobertas a respeito da fisiologia da obesidade que ajudam a explicar por que tantas pessoas lutam inutilmente para não recuperar o peso perdido.

Kevin Hall, cientista de um centro federal de pesquisa, que admite ter um fraco pelos reality shows da TV, decidiu acompanhar os competidores do "Biggest Loser" durante seis anos depois daquela noite vitoriosa. O seu projeto foi o primeiro a avaliar o que acontecia com as pessoas, ao longo de seis anos depois de terem perdido grandes quantidades de peso graças a uma dieta e a exercícios intensivos."É assustador e espantoso", disse o especialista em metabolismo do Instituto Nacional do Diabetes e das Doenças Digestivas e Renais, que faz parte dos Institutos Nacionais de Saúde. "Estou abismado".

Tudo tinha a ver com o metabolismo em repouso, que determina quantas calorias uma pessoa queima quando em repouso. Quando o programa começou, os concorrentes, embora com um sobrepeso enorme, tinham um metabolismo normal para o seu tamanho, o que quer dizer que queimavam um número normal de calorias para pessoas do seu peso. Quando o programa acabou, seu metabolismo se reduziu radicalmente, e seus corpos já não queimavam calorias suficientes para manter seu peso reduzido.

Os pesquisadores sabiam que, em geral, toda pessoa que perde peso deliberadamente - mesmo que comece com um peso normal ou que esteja abaixo do peso - terá um metabolismo mais lento quando a dieta terminar. Portanto, eles não ficaram surpresos ao constatar que os participantes do programa tinham um metabolismo lento quando o programa se encerrou. 

O que chocou os cientistas foi o que aconteceu a seguir: à medida que os anos passavam e os números na balança aumentavam, o metabolismo dos concorrentes não se recuperava. Aliás, ficou ainda mais lento, e os quilos continuaram se acumulando. Era como se seu organismo intensificasse seus esforços para fazer com que os concorrentes voltassem ao seu peso original.

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Cahill foi um dos que tiveram a maior decepção. Assim que recuperou mais de 50 quilos, seu metabolismo desacelerou a tal ponto, que, para manter seu peso real de 175 quilos, agora ele precisa comer 800 calorias ao dia a menos do que um homem do seu tamanho. Se ultrapassar esta cifra, tudo se transformará em gordura.

Uma realidade biológica básica. A luta dos concorrentes continuou mostrando por que tem sido tão difícil fazer algum avanço em relação ao problema nacional da obesidade, que afeta mais de um terço dos adultos americanos. Apesar dos bilhões de dólares gastos em medicamentos para a perda de peso e em programas dietéticos, até os mais motivados trabalham contra sua própria biologia.

Sua experiência mostra que o organismo contra-atacará durante anos. E esta descoberta, disse Michael Schwartz, médico que se dedica à pesquisa da obesidade e do diabetes, e é professor de medicina na Universidade de Washington, é "algo novo e importante".

"A questão fundamental é que você aparece na TV, pode perder enormes quantidades de peso, pode continuar por seis anos, mas não escapará de uma realidade biológica básica", disse Schwartz, que não participa do estudo. "E quando você conseguir chegar abaixo do seu peso inicial, seu organismo tentará fazer com que você volte atrás".

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O médico do programa, Robert Huizenga, diz que imaginava que as taxas metabólicas dos participantes cairiam logo após o programa, mas previa uma queda menor. Entretanto, ele indagou se as avaliações feitas seis anos mais tarde seriam precisas. Segundo ele, manter a perda de peso é difícil, e é por isso que ele diz aos concorrentes que devem se exercitar pelo menos nove horas por semana e monitorar a própria dieta para não engordar.

"Infelizmente, muitos participantes não conseguem encontrar ou pagar um suporte adequado com médicos que acompanhem seus exercícios, psicólogos, especialistas do sono, e trainers - e esta é uma coisa que todos nós precisamos mudar e, para tanto, trabalhar com afinco", ele disse num e-mail.

Dina Mercado em casa com um de seus filhos, Jericho, em Commerce, na Califórnia, Estados Unidos Foto: Emily Berl / The New York Times

As conclusões do estudo, publicadas na revista Obesity, fazem parte de um programa científico que se propõe a responder a algumas das questões mais fundamentais sobre obesidade. Os pesquisadores estão tentando compreender por que motivo muitas pessoas gordas acabam sofrendo de diabetes e de outras doenças, e decidiram estudar novos métodos para bloquear o veneno contido na gordura. Começaram então a destrinchar as razões pelas quais a cirurgia bariátrica permite que a maioria das pessoas perca quantidades consideráveis de peso ao passo que uma dieta fracassa com tanta frequência. E procuram encontrar tratamentos médicos específicos para pessoas obesas.

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Espera-se que este trabalho acabe levando a novas terapias que tratem a obesidade como uma doença crônica e possam ajudar a manter o peso sob controle por toda a vida.

A maioria das pessoas que tentaram perder peso sabe como é difícil parar de engordar; entretanto, muitas culpam a si mesmas quando os quilos voltam a se acumular. Mas o que a pesquisa da obesidade tem mostrado particularmente é que os que seguem dietas estão à mercê dos próprios organismos, em que os hormônios e uma taxa metabólica alterada os arrasta de volta aos seus pesos antigos, sejam as dezenas de quilos a mais ou aqueles 10 a 15 extra que muitos tentam evitar.

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Há sempre um peso que o corpo da pessoa mantém sem nenhum esforço. E embora se desconheça o motivo pelo qual este peso pode sofrer alterações com o passar dos anos - talvez pelo efeito do envelhecimento - a certa altura, há um peso que é fácil manter, e é o peso que o corpo briga para defender. O objetivo que os cientistas defendem é encontrar uma maneira de impedir a atuação destes mecanismos. Em primeiro lugar, eles tentam compreendê-los mais a fundo.

David Ludwig, diretor do New Balance Foundation Obesity Prevention Center do Children's Hospital de Boston, que não participou da pesquisa, disse que as conclusões mostraram a necessidade de novas abordagens do controle do peso. Ele alertou que o estudo foi limitado em razão do seu tamanho reduzido e pela falta de um grupo de controle de pessoas obesas que não perderam peso. Mas concordou que as conclusões fazem sentido.

"Este é um subconjunto das pessoas mais bem-sucedidas em suas dietas", afirmou. "Se elas não mostrarem uma volta ao normal em seu metabolismo, que esperança haverá para nós outros?" No entanto, acrescentou, "isto não deve ser interpretado como se fôssemos condenados a lutar contra a nossa biologia ou a permanecer gordos. Significa que precisamos explorar outras abordagens".

Tradução de Anna Capovilla

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