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'Roupa não é obra de arte'

Em entrevista ao Estado, Rony Meisler, 33 anos, co-fundador da marca carioca Reserva, fala sobre o sucesso de sua empresa, seu posicionamento como outsider da moda e sua nova flagship store

Por Michaela von Schmaedel
Atualização:
O empresário Rony Meisler, co-fundador da Reserva, na nova flagship da marca, em São Paulo Foto: Werther Santana/Estadão

 

Dono de uma das marcas masculinas de maior sucesso no país, com 34 lojas (incluindo a marca feminina Eva e a Reserva Mini) e 547 funcionários, Rony Meisler reinaugura hoje sua loja nos Jardins, em São Paulo. Depois de o espaço sofrer dois assaltos e um incêndio, o empresário não seguiu o conselho de familiares e amigos que pediram para ele fechar a loja. Muito pelo contrário, Rony decidiu transformá-la em sua flagship, a loja conceito da marca. "Resolvi resistir e fazer da loja algo maior ainda", conta. Com pocket shows (hoje será do Emicida), uma laje do saber, onde acontecerá cursos e shows, um bar, uma barbearia (em parceria com a Dr. Jones) e um espaço para multimarcas, o lugar de três andares carrega toda a irreverência de seu fundador. A seguir, a entrevista concedida antes da festa de inauguração.

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Qual é o estado do país que você pretende investir daqui para frente?Com a nossa venda em multimarcas, conseguirmos cobrir quase todo o Brasil. Estamos em 14 estados, com 1400 pontos de vendas. Com as lojas próprias, temos muita força no Rio, São Paulo e Minas. Agora, há uma propensão maior em subir para o Nordeste, há um crescimento forte na região. Vemos isso pelo aumento de vendas em multimarcas e também em nossa loja em Salvador.

Como é o investimento de vocês em e-commerce? Você acredita nessa plataforma como uma alavanca para a moda no Brasil? Totalmente. Temos um investimento bem acima da média em e-commerce hoje. Acho que dentro do mercado de moda do nosso segmento, somos o que usamos a tecnologia mais avançada, a mesma de marcas como Gap a Burberry. Fizemos esse investimento no ano passado. Eu não vejo o e-commerce como mais uma loja, para mim, é um canal logístico. Hoje operamos em um modelo nas lojas que é o de reposição automática, ou seja, você faz um pedido de 20 peças, recebe no seu centro de distribuição e manda só duas peças para cada loja. Diariamente, você repõe os produtos com base nas vendas, dessa forma, otimiza seu estoque e garante produto em todas as lojas. O nosso e-commerce lê o estoque do centro de distribuição, então, o maior estoque está disponível justamente para o e-commerce. Para dar uma ideia, as lojas da Reserva faturam 90 milhões de reais por ano, o e-commerce chega a faturar 20 milhões, ou seja, já representa mais de 20% do faturamento total da empresa. 

O quer você acha da moda masculina no Brasil hoje? Acho que ela vai crescer muito por causa da Internet. Você abre o seu armário - ou a sua vida - e percebe um conjunto de influências artísticas, comportamentais, etc. Então, quando a gente decide vestir algo, fazemos uma colagem de coisas que vimos e que fazem sentido para gente. A Internet aumentou muito esse tipo referência no Brasil. Vejo a roupa de uma forma individual, por exemplo, a calça, a camisa, a jaqueta. Acho que a moda masculina caminha para isso: peças básicas que misturadas de certa maneira vão compor a personalidade de cada um. Não acredito nessa coisa de alguém vestir tudo de uma mesma marca. Isso não existe.

Você vende outras marcas no e-commerce da Reserva, como Vans e JanSport, e também em suas lojas físicas, como nessa flagship dos jardins. Qual é a ideia em agregar marcas? Isso faz parte de uma visão "ponto com", que aplicamos no e-commerce. Duas coisas são importantes para quem compra online: a experiência de compra tem que ser rápida e a entrega precisa cumprir o prazo. Esse é o serviço que mais importa, represente 80% do que é mais importante, depois vem o resto. O consumidor da Reserva é um cara prático, ele não usa só Reserva, isso seria uma pretensão nossa. Ele usa várias marcas bacanas, então pensamos que seria uma comodidade para ele e um grande valor agregado para nós se tudo estivesse no site. Queremos que o cara passe uma vez o cartão e ache o que ele precisa, por isso a ideia dos Penetras. Mas não temos pretensão de ser uma Dafiti, o que queremos é fazer uma curadoria. 

E a parceria com a Dr. Jones? Esse foi um projeto que surgiu para essa loja do jardins, que para mim é um símbolo de resistência. Fomos assaltados, a loja pegou fogo, todo mundo disse que a gente tinha que fechar. Mas somos empreendedores e decidimos que ela iria virar a flagship da marca. Eu sou um outsider da moda, sou um curioso patalógico, e é disso que nasce a Reserva. Então, com essa loja queria homenagear o que aconteceu de legal nos Jardins, como a Ellus Second Floor, no início dos anos 2000, cheia de novos estilistas. Essa laje que criamos é uma vontade de homenagear isso, de trazer novos nomes. Conheci a Dr. Jones, adorei os produtos e resolvi convida-los para ter uma barbearia aqui, que vai funcionar de verdade. Isso tem a ver com o nosso DNA, de pegar algo que parece impossível e fazer. Não é o nosso produto que é incrível, é o jeito que produzimos e fazemos essa experiência que importa. 

Você investe muito em marketing? Sim. Temos 20 funcionários nessa área, porque eu entendo a Reserva muito mais como uma marca de comunicação do que de moda. Pra mim, roupa não é obra de arte, existe um consciente coletivo na área que funciona assim: 'eu tenho um lifestyle melhor do que o seu, e eu vou te fazer um favor de te deixar comprar um pedacinho do meu lifestyle'. Acho isso uma besteira. Como eu sou um outsider, a Reserva nasceu em uma mesa de bar, eu e meu sócio falando sobre política, música, arte, cultura. A marca hoje é essa grande mesa de bar, que agregou mais um monte de gente, e que não acha que tem um lifestyle melhor do que ninguém. Quando pensamos em coleção, pensamos primeiro no que a gente quer falar, depois vem o produto. O produto é mídia e a campanha é conteúdo. Sou muito mais um publisher do que um estilista.

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O que você acha da SPFW e do Fashion Rio? Acho o Paulo Borges um gênio, o que ele fez para esse mercado é de um legado sem fim. Agora, ele está tentando inovar algo que virou mainstream. O grande desafio é fazer essa renovação. Ele foi tão bem sucedido que as semanas de moda viraram um produto enorme. Então, percebo claramente um movimento dele de querer descobrir novos talentos pelo Brasil, lançar novos nomes. 

Você acha que ainda se copia muito no Brasil? Muito. Mas, no fundo, tudo é referência. O que é copiar? Olhar algo em uma loja e mandar fazer parecido é copiar? E quando você vê uma jaqueta em uma rua em Berlim, tira uma foto e depois usa de referência? Isso é copiar? Tudo é um remix, referências que se juntam, então, é uma perda de tempo ficar apontando quem copia ou não. Copiar uma logomarca é pirataria, um roubo. Agora, acho que cada vez mais os criativos vão assumir que existe esse remix de tudo, porque já há uma nova consciência e liberdade nesse sentido. Uma juventude que não tem medo de ser feliz, de falar a verdade.

Você se acha polêmico? É conhecido por ter vários desafetos... Em um ambiente em que só tem regras pré-estabelecidas, tudo o que você fala é considerado polêmico. Falo a verdade, coisa que muita gente nesse meio não faz. Não pretendo mudar uma vírgula do que eu sou, porque se mudar, a Reserva morre. Sou um rebelde mesmo, e acho isso bom. 

Por que o lifestyle carioca vende tão bem? Acho que a Reserva tem essa coisa do sorriso no rosto, não tem essa coisa blasé da moda, não fazemos roupa para astronauta. A marca é mais afetuosa. E assim que lidamos também dentro da empresa. Nossa missão é "ser um amigo, não uma marca", isso significa que começamos a ter cada vez mais consciência social. 

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Você tem muitas parcerias e trabalhos com Ongs, não é? Você se preocupa em ter uma empresa sustentável? Sim, mas acho que sustentabilidade virou um produto de prateleira, prefiro pensar em consciência. O lance é começar a fazer, não é criar uma plataforma para discutir o assunto. Uma das coisas que fizemos recentemente foi abrir 40 vagas de emprego para a comunidade de Barreira do Vasco, recentemente pacificada, vizinha de nossa nova sede em São Cristóvão. Aí fizemos uma parceria com a associação de moradores, botamos um carro de som para anunciar. Não fazemos isso pelo negócio, mas por um nível de consciência maior. Assumimos um pacto global com a ONU, um pacto que qualquer empresa pode assumir. Fizemos uma parceria com a Afro Reggae, criamos um selo para eles, o AR, voltando para o licenciamento e iniciativa privada. Qualquer marca pode usar o selo e paga os royalties para o Afro Reggae. Fomos a primeira marca a usar o selo em uma linha de roupas, a fazer uma campanha fotografada na sede do grupo. Mas é um selo que pertence ao Afro Reggae. 

Como nasceu a vertente feminina da Reserva, a Eva? O esquema dela é o mesmo que deu início à marca Reserva. Começamos com um sistema de vendas em multimarcas, conseguimos um volume razoável e partimos para a loja própria. Além de ser um modo economicamente sustentável, também é uma forma de conhecer melhor as necessidades do público, escolher bem os fornecedores, fazer um bom posicionamento da marca, tudo isso antes de abrir uma loja própria. A Eva já era vendida em 200 pontos de venda antes de abrirmos a primeira loja, em Ipanema, no ano passado. Três meses depois, abrimos mais uma, no Rio Design Barra. Nesse ano, pretendemos abrir mais uma. 

A marca Eva tem a mesma irreverência da Reserva? Ela é mais sutil, mais delicada, é a piada que a mulher ri, sabe? Não é aquele tipo de coisa que o homem fala e a mulher não acha graça. Ela, na realidade, não é o espelho da Reserva, que é bem mais rebelde e agressiva, ela é a mulher do homem da Reserva. Mas ainda vamos entender o que é a experiência Eva de atendimento. Para mim, isso é mais importante do que o produto. Temos que entender como a marca Eva vai ser para termos um plano de expansão.

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