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Reagindo à angústia no trabalho

Por que as pessoas não param de subir na profissão quando estão felizes?

Por Arthur C. Brooks
Atualização:
As pessoas são programadas para progredir e a regressão é ressentida como fracasso Foto: Pic Basement/ Creative Commons

Todos já ouviram falar do Princípio de Peter, ou seja, os administradores sobem ao nível da sua incompetência. Hoje, contudo, uma classe inteira de americanos competentíssimos jamais chegará a um nível de incompetência. Pelo contrário, eles devem se submeter a um princípio similar, mas aumentando seu nível de angústia.

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O princípio atua assim: profissionais ambiciosos, que trabalham muito e com ótima formação são indicados pelos seus superiores para cargos de prestígio e responsabilidade crescentes. O que é interessante e empolgante - até o momento em que deixa de ser.

As pessoas geralmente entram numa espécie de "zona de euforia", de grande entusiasmo, uma oportunidade de trabalho criativo e responsabilidade de acordo com suas competências e paixões. 

Mas então começam os problemas. Aqueles que amam participar de equipes e processos criativos são promovidos para áreas de administração. Engenheiros satisfeitos se tornam supervisores estressados. 

Redatores são encarregados de outros redatores e seu trabalho é censurá-los pelos títulos das matérias. Nos meus anos de faculdade, conheci professores felizes que se tornaram reitores amargos, lembrando-se constantemente dos velhos tempos em que realizavam pesquisas de vanguarda e davam aulas que adoravam.

Por que as pessoas não param de subir na profissão quando estão felizes? Porque fomos criados para achar que quanto mais, melhor - mais poder, mais autoridade, mais dinheiro e responsabilidade. E assim, erroneamente, inferimos que promoções equivalem a uma maior satisfação. Numa economia que deixou tantas pessoas para trás nos últimos anos, este pode parecer um belo problema a ser enfrentado por alguém. Mas é um problema, como demonstra claramente uma recente pesquisa.

Em 2009, pesquisadores da Universidade de Illinois publicaram um estudo na revista Social Indicators Research, traçando um mapa da relação entre sucesso e estresse. Assim, o que não surpreende, pobreza é um indicador de estresse. Mas o interessante é que a riqueza também aumentaria o estresse, provavelmente por causa do trabalho sob forte pressão e limitação de tempo. Embora o sucesso possa no início aliviar o estresse à medida que o indivíduo ascende para a classe média, ele pode introduzir uma nova série de problemas estressantes para ele.

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Então qual é a solução?

Uma saída que muitas pessoas procuram: beber muito. Pesquisa realizada em 2010 concluiu que pessoas com renda muito alta consomem muito mais bebida alcoólica do que aquelas com recursos mais modestos. Especificamente, 81% dos entrevistados que ganhavam mais de 75 mil dólares por ano bebiam, contra 66% dos que recebiam entre 30 mil dólares e 49 mil dólares e 46% dos que ganhavam menos de 20 mil dólares.

Se estratégias como beber são menos do que satisfatórias, a pessoa deveria então enfrentar o problema de frente: identificar a zona de euforia e retornar a ela. Um reitor infeliz deveria renunciar ao cargo e retornar à feliz vida de professor, certo?

Mais fácil falar do que agir. As pessoas são programadas para progredir e a regressão é ressentida como fracasso. Além disto, se o indivíduo é um diretor de empresa há muito tempo ele corre o risco de ficar para trás em competências que antes dominava muito bem.

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Se o caminho de volta está bloqueado, existem outras opções? Uma ideia surge de estudos acadêmicos sobre empregos planejados para servir outras pessoas. Em 2014 dois pesquisadores publicaram um artigo no Journal of Positive Psychology sobre advogados. Concluíram que advogados em áreas que pagam muitíssimo bem como direito corporativo, delitos de natureza civil, eram infelizes e menos satisfeitos do que seus colegas que ganhavam menos em outras funções como de promotor público ou defensor legal. (E, o que não surpreende, eles também bebem muito mais).

Então eles deveriam abandonar a profissão e se juntar ao Peace Corps? Não necessariamente. Nas palavras imortais do Bhagavad Gita, "renunciar ao trabalho ou trabalhar por devoção são dois bons exemplos de libertação. Mas assumir tarefas que implicam muita dedicação é melhor do que renunciar ao trabalho". Em outras palavras, melhor do que renunciar à sua elevada posição é transformá-la numa fonte de liberdade pessoal dedicando-se ao bem de outros.

Acho que servir aos outros reduz o estresse e aumenta a satisfação porque desvia a atenção de si mesmo. Quando estou trabalhando para mim mesmo algum resultado decepcionante me deixa estressado e provoca uma sensação desagradável. Por outro lado, quando estou prestando um serviço a alguém, o trabalho é sempre intrinsecamente valioso por causa da sua intenção. Essa atitude por si só já garante um certo sucesso.

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Quando adicionado esse elemento, a intenção, qualquer trabalho pode ser compreendido como um trabalho autêntico de servir a alguém ou alguma coisa. O tipo de trabalho na verdade é menos importante do que a atitude do trabalhador. O que está ilustrado na parábola de um viajante que por caso passou por um canteiro de obras. Quando perguntou aos operários o que estavam fazendo, um pedreiro respondeu: "estou ganhando a vida". Mas um outro lhe disse: "estou construindo uma catedral".

Todos nós estamos construindo uma catedral humana. No nosso mundo interconectado e nossa economia global, o nosso trabalho transforma as vidas de inúmeras outras pessoas. Às vezes o impacto é óbvio: diretores e executivos diretamente controlam a felicidade e o sucesso na carreira de seus empregados. 

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Mas todos, em todos os setores, afetam as vidas dos colegas de trabalho, supervisores, clientes, fornecedores, doadores ou investidores. Com que frequência passamos nossa manhã no transporte pensando conscientemente sobre como sua vida é melhor por causa do trabalho. E se tornássemos isto uma rotina no nosso café da manhã?

Portanto, ânimo, choramingas. O alívio está tão perto quanto a amabilidade que você expressa com relação aos outros. Construa sua catedral. E por favor, pare de beber tanto.

Arthur C. Brooks é presidente do American Enterprise Institute e autor do livro "The Conservative Heart"

Tradução de Terezinha Martino 

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