Mercado popular de maquiagens cresce, mas barateamento pode trazer consequências à saúde

Produtos de má qualidade podem provocar desde acne até envelhecimento precoce; saiba como identificá-los

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Por Mílibi Arruda
Atualização:
Sombras com muito corante podem desencadear alergias. Foto: Pixabay / @Kaboompics

O setor de cosméticos cresceu 2,8% no último ano - mais do que o Produto Interno Bruto (PIB), que avançou 1%, e do que a produção industrial do País (aumento de 2,5%), conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec). A alta está de acordo com o crescimento das vendas de maquiagens populares, mesmo em momento de crise econômica.

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Na Rua 25 de Março, conhecido centro comercial de São Paulo, o número de lojas que vendem maquiagens aumentou 30% desde o início de 2016, segundo a associação de lojistas da região. A expansão dos cosméticos em conta favorece o mercado, mas pode ter outras consequências. O barateamento, somado à pouca regulamentação no ramo, expõe o consumidor a riscos de saúde.

Certos compostos trazem efeitos que vão desde acne e manchas na pele até sintomas mais gerais, como dores de cabeça e tonturas. Entretanto, produtos baratos não necessariamente são sinônimo de má qualidade, como explica a dermatologista Tatiana Gabbi, da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD). “O custo para fazer um cosmético é relativamente baixo, portanto não é preciso que seja supercaro para ser bom”, informa a médica.

O problema está, principalmente, no aumento da importação que o barateamento traz. Tatiana explica que, nos importados em conta, é comum que a fabricação seja realizada sem muito cuidado. Isso pode trazer a contaminação de lotes ou o uso de substâncias consideradas tóxicas.

De acordo com a dermatologista Máira Astur, o consumidor deve checar cinco fatores para fazer uma compra consciente: a quantidade de produtos na composição; data de validade; fragrância; cor e o ponto de venda - este último para evitar falsificações. “Se houver muitos ingredientes, a chance de o cosmético apresentar substâncias problemáticas é mais alta. Prazo de vencimento muito longo indica uso de muitos conservantes. Fragrâncias e cores fortes podem implicar em alergias”, pontua.

Já Tatiana Gabbi, da SBD, faz uma ressalva. Ela explica que, caso uma empresa não siga normas de higiene, não adianta olhar o rótulo - tão exposta à contaminação, seria impossível informar a composição exata. Para a médica, a melhor forma de evitar problemas é pesquisar sobre a empresa.“Procure sempre saber a história da organização, se está há bastante tempo no mercado, tem SAC, possui certificações e é bem recebida pelas pessoas”, orienta.

Anvisa, riscos e regulamentação

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No Brasil, o órgão que regulamenta a produção de cosméticos é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em 2016, a entidade publicou uma resolução proibindo pouco mais de 1.300 substâncias em produtos de beleza e higiene pessoal. A regra geral para o impedimento é a classificação dos compostos como substância cancerígena, ou de provável potencial cancerígeno, na lista oficial da Organização Mundial da Saúde (OMS). Muitas substâncias que comumente provocam alergias só são regulamentadas pela agência caso a empresa queira classificar o produto como “hipoalergênico”.

A dermatologista Máira Astur analisa que há uma diferença na forma que países da União Europeia e o Brasil promovem o banimento de substância. “Na Europa, há uma consciência maior sobre isso. Quando existe algum indício de que pode haver malefícios, associações da indústria e consumidores fazem denúncias e essas substâncias são proibidas. Aqui é exigida a comprovação do malefício”, compara.

Outras reações que alguns produtos de beleza podem causar são ressecamento - por períodos prolongados, isso gera envelhecimento precoce - tosse e crises de asma. Alguns itens para a área dos olhos expõem quem usa a conjuntivites e coceira. Mas vale lembrar: as substâncias da tabela não são exclusivas de produtos populares - existem maquiagens bem caras que as levam na composição.

Sobre as indicações de câncer e puberdade precoce, a médica Máira Astur afirma que há questionamentos. “Ainda não há estudos de médio e longo prazo revisados sistematicamente que confirmem isso”.

Vlogueiras de beleza são fenômeno de publicidade

O crescimento do consumo das maquiagens baratas está associado a dois fatores, de acordo com a União dos Lojistas da 25 de Março e Adjacências: baixos preços dos cosméticos vendidos por lá e divulgação cada vez maior do local por canais do YouTube - de maneira publicitária ou não.

A youtuber Bia Siqueira mostra, em seu vlog, cílios postiços comprados na rua 25 de Março. Foto: YouTube / @Ficando Gata

Na tarde de sábado, 22 de setembro, o movimento no centro comercial que engloba a Ladeira Porto Geral e ruas próximas era grande. A massa de clientes se compunha, na maioria, de mulheres de várias idades - e boa parte procurava justamente esses produtos. “Vim por ser baratinho e por indicações de vlogueiras”, diz Nicole Silva, de apenas 12 anos. Viviane Oliveira, professora soteropolitana de 32 anos, chegou ali por sugestão de amigas e também de youtubers, mas não compra tudo que dizem ser bom. “Sempre vejo a composição, confirmo a data de validade e checo se testa em animais”.

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Em meio à crise econômica, o brasileiro deixa de gastar com lazer e outros bens de consumo, mas não abre mão da beleza, como informa levamento de 2016 do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) Brasil. Camila Silva, gerente de uma loja especializada em maquiagens na Rua 25 de Março, conta que o movimento se mantém mais ou menos constante desde que a loja abriu, no meio do ano passado. “Só tem uma exceção: quando as youtubers com as quais temos parceria vêm gravar aqui, o público aumenta”, afirma a lojista.

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Bia Siqueira, dona do canal Ficando Gata, também acredita que os vídeos de beleza no YouTube tiveram influência na alta das vendas de maquiagens baratas. “As youtubers começaram a indicar e viram que o público aceitou muito bem. As marcas entenderam isso e passaram a investir na divulgação para vlogueiras”.

Sobre a escolha de quais produtos irá resenhar, a administradora do canal de quase 1 milhão de inscritos afirma que a demanda é o fator principal. “Confesso que não olho muito a fórmula. Já usei uma base que minhas seguidoras alertaram que a composição era horrível e ia me fazer mal, eu nem sabia. Mas o YouTube permite essa troca. Passo a informação, mas também estou ali para aprender.”

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