Falando sobre sexo com as crianças

Quando as crianças começam a fazer perguntas, elas manifestam interesse e têm o direito de ter a resposta certa

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Por Pamela Druckerman
Atualização:

PARIS - Um dos muitos problemas dos pais é que os filhos mudam. Quando você se habitua a uma fase da vida deles, eles passam zunindo para a outra. Foi o que percebi recentemente quando minha filha de 8 anos perguntou-me sobre bebês. Ela sabe que as crianças crescem na barriga da mãe, mas como chegam lá?

Segundo a psicóloga, os pais devem dar respostas simples e claras Foto: texas.713/Creative Commons

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Não sabia ao certo o quanto deveria revelar, então procurei ganhar tempo. "Vou lhe contar em breve", disse, acrescentando que "isso envolve o pênis". Não quis chocá-la ou tirar sua inocência. Como qualquer boa americana, achei que um dia (daqui a muitos anos) teríamos essa conversa meio forçada em que revelaria a estranha mecânica do sexo e ela me diria que já sabia tudo a respeito.

Como vivo na França, decidi investigar como os europeus abordam a questão. Os pais europeus também preferem essa conversa de aves e abelhas se reproduzindo? O assunto seria menos incômodo por aqui? Existiria algum "savoir-faire" que me ajudaria a atravessar esta próxima etapa e outras depois dela?

Comecei minha pesquisa num museu de ciências parisiense e uma exposição chamada Zizi sexuel l´expo (seu título em português é Sexo - Qual é o grande problema?), destinada a instruir a garotada dos nove aos 14 sobre sexualidade. Há conselhos sobre o beijo (vire a cabeça para o lado, "especialmente se tiver um nariz grande". Não gire demais a língua na boca de outra pessoa). Na seção mais direcionada à puberdade, pediram para eu identificar um cheiro (sovaco) e pisar num pedal que produz bolinhas brancas - representando o esperma - fluindo de um pretenso pênis.

Há também uma seção inteira dedicada a mostrar o quão complicado é o amor. Um cartaz explica que "amar alguém às vezes o torna feliz e outras o torna realmente triste. Mas mesmo quando você se sente infeliz ainda quer amar e ser amado porque isso o faz sentir vivo".

Os franceses não são o melhor exemplo em termos de educação sexual. As escolas são obrigadas a dar aulas a respeito, embora nem sempre o façam. Em vez de uma "conversa", as crianças francesas comumente têm "o livro", diz Phillippe Brenot, sexólogo. "Em geral é assim na França. Aos 12, 13, 14 anos de idade, o assunto é tratado assim, "tome este livro e leia".

Como a exposição, esses livros (pelos menos os que eu vi, mas há dezenas deles) fornecem informações claras sobre como não engravidar ou contrair uma infecção, e todos sublinham que a pessoa deve fazer sexo somente quando estiver absolutamente pronto. Mas a mensagem predominante é que se você usar proteção e tiver uma relação saudável, o sexo pode ser alguma coisa genial. Aparentemente os holandeses estão na linha de frente no tocante à educação sexual e quase não têm problemas para abordar o tema. Os pais na Holanda têm inúmeras conversas informais adequadas à idade da criança, sobre sexo, e elas já começam desde que eles são muito pequenos. A educação sexual obrigatória começa na escola primária e inclui lições sobre o respeito aos transexuais, bissexuais e gays.

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"Se iniciamos a educação sobre sexualidade quando as crianças são adolescentes, ou mesmo pouco antes de começarem a ter despertado o interesse em sexo, acho que aí será muito tarde", disse Sanderijn van der Doef, psicóloga do grupo holandês Rutgers WPF, dedicado à saúde sexual. "Quando as crianças começam a fazer perguntas elas manifestam interesse e têm o direito de ter a resposta certa".

Segundo a psicóloga, os pais devem dar respostas simples e claras. "Você pode começar a explicar, de maneira muito simples, que a mãe tem um pequeno ovo na barriga, que o pai tem espermas muito pequenos no seu corpo e quando os espermas se encontram com o ovo um bebê cresce na barriga da mãe". Crianças de 3 anos de idade raramente perguntam como o esperma e o ovo se encontram. Se o fizerem, "então seu filho é muito inteligente nessa idade e isto significa que ele tem de ter uma resposta", acrescentou.

Para a socióloga Amy Schalet, autora do livro Not Under My Roof, os pais holandeses "tornam algo normal" o sexo no caso dos adolescentes, também. Eles comumente permitem que os filhos de 16 ou 17 anos levem o namorado ou namorada para dormir em casa, se é um relacionamento estável, usarem anticoncepcional e estiverem emocionalmente preparados. Os pais americanos, ao contrário, "dramatizam" o sexo: realçam seus perigos, proíbem qualquer relação sexual em casa, o que leva os adolescentes a manter uma relação sexual em segredo, diz a socióloga.

Americanos e europeus normalmente têm sua primeira relação sexual em torno dos 17 anos. Mas na França os pais estão mais propensos a aceitar este fato. Uma amiga francesa disse-me que recentemente, ao tentar entrar no quarto de hóspedes da sua casa, ele estava trancado por dentro. Depois de um minuto, seu filho de 17 anos colocou a cabeça para fora e disse, envergonhado, "nós estamos aqui".

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"Foi uma gracinha", disse ela. Felizmente seu filho estava com a garota que namorava há muito tempo. E provavelmente não havia risco de uma gravidez. Na França as pílulas anticoncepcionais são liberadas para adolescentes de 15 a 18 anos, com receita, e menores de idade podem entrar em qualquer farmácia e obter grátis a pílula do dia seguinte. Na Holanda também.

Não sei bem como minhas amigas americanas achariam daquela cena "gracinha". Mas observe que o número de adolescentes que engravidam na Europa é bem menor do que nos Estados Unidos. Na França e na Holanda é cinco vezes menor. Ao que parece, se você trata o adolescente como pessoa responsável, ele corresponderá às expectativas. Felizmente meus filhos não estão ainda neste estágio. Mas armada com minha nova pesquisa, acho um momento relaxado para conversar com minha filha sobre como se faz um bebê. Depois que, calmamente, contei a ela a história do encontro do pênis e a vagina, ela não pareceu surpresa. "Ah, você quer dizer fazer amor. Li sobre isso num dos meus livros", disse ela.

Tradução de Terezinha Martino

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