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Ansiedade dos pais estimula ansiedade nos filhos

Crianças contagiadas pela preocupação começam a temer que o mundo não seja um lugar seguro e que ninguém poderá protegê-los dos muitos perigos

Por John Rosemond
Atualização:
Em termos da filosofia, são medos existenciais; atingem o núcleo do inalienável direito da criança à sensação de bem-estar Foto: Gil/Creative Commons

Desde o início do ano letivo de 2014-2015, vários professores da educação infantil me perguntaram por que tantas das crianças de hoje vêm à escola com problemas de ansiedade. Trata-se de uma boa pergunta, que eu acredito chegar ao coração do comportamento dos pais e mães contemporâneos nos Estados Unidos.

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A resposta curta diz que muitas das crianças de hoje - estou me referindo principalmente aos filhos de pais bem intencionados que leem artigos como este - são objeto de um volume tremendo de preocupações por parte dos pais. Essas preocupações vão do realista ao implausível, e um exemplo do último tipo seria a mãe de uma criança pequena que se recusou a mandá-la para a escola porque a professora dela tinha visitado recentemente Dallas, Texas, onde dois (até o fechamento desse texto) funcionários de saúde tinham contraído o vírus do Ebola. Mesmo quando a preocupação dos pais tem como base evidências concretas - sequestros, por exemplo - esta costuma ser inflada muito além de sua real probabilidade.

Minha teoria diz que, com o tempo, essa preocupação exagerada é transferida por osmose psíquica dos pais para os filhos. Essas crianças contagiadas pela preocupação começam a temer que o mundo não seja um lugar seguro e que ninguém - nem mesmo seus pais - poderá protegê-los dos muitos perigos. Em termos da filosofia, são medos existenciais; atingem o núcleo do inalienável direito da criança à sensação de bem-estar. Assim sendo, muitas das crianças de hoje trazem consigo todo tipo de ansiedade para a escola, incluindo a ansiedade quanto ao próprio desempenho, ansiedade diante das provas, ansiedade de ficar separadas dos pais, varias manifestações de ansiedade social e, é claro, a ansiedade em relação à própria escola em si.

Aqueles que enxergam o comportamento dos pais americanos a partir da perspectiva externa - incluindo eu e a maioria dos membros da minha geração - podem ver claramente os efeitos dessa preocupação paterna onipresente. Uma mulher do leste europeu, por exemplo, me disse que, do relaxado ponto de vista dos pais de sua cultura, a principal força que impulsiona as mães americanas é o medo. Bingo! No geral, é o medo de que, se a mãe não estiver constantemente envolvida e vigilante, algo dará errado e, nesse caso, o "algo errado" será apocalíptico.

Esta ansiedade onipresente não se limita às crianças mais novas. Recentemente, uma mãe me perguntou o que fazer com o filho que tira notas B e C nas aulas para estudantes acima da média do ensino médio. O que fazer? Que tal não fazer nada, agradecer pelo que a vida tem de bom e deixar o assunto para lá? Esse adolescente está começando a desenvolver um quadro de ansiedade. A mãe não para de importuná-lo com a questão das notas. Será que existe um elo entre as duas coisas? Eis o apocalipse vislumbrado pela mãe: ela teme que o filho não consiga entrar na faculdade "certa", seja qual for. Assim como ocorreu com muitas pessoas razoavelmente bem sucedidas, eu não frequentei a faculdade "certa", mas a Universidade Western Illinois não me pareceu ser nada má. Como qualquer pessoa que tenha participado de uma reunião de ex-colegas do ensino médio pode atestar, o sucesso que alcançamos na vida não depende da faculdade que frequentamos (exceção feita a um punhado de profissões altamente esotéricas).

Eu disse a ela para deixar o filho em paz, entregue aos próprios recursos; era melhor parar de monitorar diariamente as notas dele e, se possível, melhor seria simplesmente não monitorá-lo. (A essa altura, eu poderia começar uma longa queixa contra os sites de escolas que incentivam os pais a gerenciar microscopicamente cada aspecto da vida dos filhos, mas não temos espaço para isso. Basta dizer que essa é uma de minhas queixas mais magníficas.)

Tradução de Augusto Calil

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