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A moda étnica-religiosa de Marina Silva

Colares de sementes, batas, xales e roupas comportadas dão pistas do estilo de mulher que a candidata é - e também de sua visão de mundo

Por Maria Rita Alonso
Atualização:
Marina retocou os cabelos brancos, fez a sobrancelha e topou incluir uma maquiadora à comitiva Foto: Marcio Fernandes/Estadão

Quando o estilista Ricardo Almeida soube da morte de Eduardo Campos, ele fez questão de não cobrar os ternos sob medida encomendados pelo candidato. Eles seriam usados durante a campanha, especialmente nas gravações do horário político. Enquanto o guarda-roupa de Campos havia sido bem calculado, o de Marina Silva, alçada de repente a protagonista da campanha à Presidência, vem sendo improvisado e lapidado aos poucos.

 

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De pronto, ela topou abrir três exceções que já tinha dito não na posição de vice: retocou os cabelos brancos, fez a sobrancelha e topou incluir uma maquiadora à comitiva. As olheiras, que dão um ar de cansaço, melhoraram bastante. Alérgica à maquiagem, ela sucumbiu à base, ao corretivo e ao rímel (segundo uma assessora, a única marca que pode usar é a MAC). O batom, que incha seus lábios, ela substitui por um gloss caseiro que inventou, à base de beterraba e açúcar.

 

Recentemente, fez uma compra na loja Gatos de Rua, no aeroporto de Recife, entre um compromisso e outro. A marca é ligada a uma ong que fabrica tecidos com pet reutilizado, misturados a fios de viscose para dar o mínimo de caimento. As batas e os casaquinhos que escolheu custaram entre 50 e 120 reais.

 

Seus assessores chegaram a ligar para o estilista mineiro Ronaldo Fraga, com quem Marina tem uma relação antiga, pedindo emprestado alguns modelos. Mas ele estava de viagem marcada para Londres e não pode ajudar. "As roupas da minha última coleção são muito coloridas e não têm a ver com estilo dela", disse Fraga, pouco antes de embarcar, na última quinta-feira. "Tenho uma grande admiração por Marina, mas não posso vesti-la no momento por uma questão de agenda."

 

Assim, Marina, nessa largada da corrida presidencial, está vestida de... Marina. Um pouco porque ainda não conseguiram montar um novo guarda-roupa com o qual ela concorde e se sinta à vontade e outro tanto porque como ela propõe uma nova política, não seria estratégico ela se "fantasiar" de executiva como costumam fazer as mulheres da velha política.

Campanha no Facebook com a hashtag CoqueTaNaModa, em que aparece fotos de eleitoras jovens imitando o penteado da candidata Foto: Reprodução

 

"Para mim, Marina se manteve fiel ao estilo evangélico e passa a imagem de uma mulher honesta, que escolhe suas roupas de acordo com sua ideologia política e de sua realidade religiosa",avalia João Braga, professor de história da moda. "É uma figura muito autêntica, justamente, porque consegue expressar no seu visual a sua visão de mundo."

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Camisas e paletós molengos e desestruturados, batas com detalhes étnicos e colares de sementes, a maioria feita por ela mesma (e apelidados de "biojoias" por fashionistas), remetem rapidamente ao seu histórico ligado à preservação das florestas e à cultura indígena. "Ela é muito chique! ", diz a empresária Alice Ferraz, criadora da rede de blogs de moda F Hits. "É magra, usa roupas acinturadas, pouca maquiagem, está sempre com peças de linho, algodão, renda, além dos maxicolares que transmitem brasilidade... Sua imagem representaria muito bem o Brasil no exterior."

 

Nas redes sociais, no entanto, a aparência de Marina vem sendo bombardeada pela guerrilha online dos apoiadores do PT e do PSDB. Claro que os ataques têm relação direta com a sua ascensão galopante nas pesquisas. De qualquer maneira, os óculos vermelho, o xale nos ombros e a sua voz ardida não ajudam. 

 

Em contrapartida, seus correligionários lançaram uma campanha no Facebook com a hashtag: CoqueTaNaModa, em que aparece fotos de eleitoras jovens imitando o penteado da candidata. Só que a ação, por enquanto, não vingou.

 

"Eu até gosto de algumas ideias da Marina, mas a imagem dela chega antes do que as palavras", diz a consultora e editora de moda Regina Guerreiro. "Na minha opinião, ela deveria usar uma roupa mais estruturada, blazers que valorizassem seus ombros e que lhe dessem uma certa autoridade. Ela precisa de um visual mais imponente. Se não, ela passa a ideia da coitadinha, que usa o xalezinho, porque sente friozinho. Não é esse tipo de coisa que a gente busca em um líder."

 

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De fato, o estilo pode servir de arma para dar pistas sobre a personalidade e jeito de ser de cada um. Quando se trata de um estilo bem construído, ele diz de cara quem você é (ou quem almeja ser). Essa é a regra número 1 dos manuais de moda e vem daí a intromissão dos marqueteiros no look dos candidatos.

 

Quando Eduardo Campos deu a entrevista no Jornal Nacional, um dia antes de sua morte, ele estava com cara de presidente. Passou a usar o cabelo penteado para traz com gel e, não por acaso, adotou o mesmo estilista que repaginou Lula durante a campanha de 2002. Na época, os ternos bem cortados de Ricardo Almeida, as camisas claras com colarinho francês e a barba aparada ajudaram Lula a desfazer a imagem de metalúrgico radical e raivoso. Seu visual passava a ideia de amadurecimento e equilíbrio.

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Dilma também foi repaginada. Fez uma plástica com o cirurgião Renato Vieira em 2008 e deu uma bela modernizada no corte de cabelo desde que virou cliente de Celso Kamura, o mesmo de Marta Suplicy. Agora, para tentar a reeleição, manteve o corte, mas ficou mais loira numa tentativa de trazer leveza ao rosto. "Fiz umas mechas claras, mantendo a raiz no tom mais escuro para não ficar fake", conta Kamura. A presidente se encontrou nos ternos coloridos, que manda fazer em costureiras. Usa casaquetos com as mangas três quartos, como as de Jacqueline Kennedy, e brincos de pérolas delicados. Permite-se ousar nos tons vivos como o vermelho de seu partido, o azul royal e o verde bandeira.

 

Para se afastar do visual de playboy, Aécio Neves deixou o cabelo mais curto e aderiu aos básicos jeans e camisa branca. "O terno que estava no último debate era sem dúvida de uma qualidade dos que ele costumava usar", observa a consultora de moda Bia Paes de Barros. "O tom de cinza claro também não favoreceu a sua pele". A estratégia de buscar em roupas simples uma identificação com povo, e não parecer um homem de elite, de acordo com as pesquisas, ainda não se reverteu em votos suficientes para um segundo turno. Por enquanto, Marina está na frente. "Se for eleita, provavelmente seu visual vai continuar evoluindo", acredita Bia. "Ela deve adaptar um pouco o guarda-roupa ao cargo. Mas duvido que mude muito o seu estilo."

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