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Vigília permanente

A opção por produtos que não agridam o meio ambiente, ganha adesões e mobiliza a atenção do consumidor

Por Fabiana Caso
Atualização:

O consumo consciente vem ganhando terreno. Na pesquisa mais recente realizada pelo Instituto Akatu, foi detectado que um terço dos brasileiros já pratica 8 das 13 condutas consideradas referência (veja texto abaixo). De acordo com definição da própria ONG, essa prática significa "consumir com consciência do impacto sobre o o próprio indivíduo, as relações sociais, o meio ambiente e a economia, buscando também mobilizar outras pessoas na mesma direção." Há quem vá além, e conjugue o consumo consciente com uma busca por maior qualidade de vida, e até espiritualidade. Nos Estados Unidos, esse segmento tem nome: LOHAS, sigla para Lifestyles of Health and Sustainability - o que quer dizer, literalmente, estilo de vida de saúde e sustentabilidade. Diz respeito tanto aos consumidores quanto às empresas, cujas ações e produtos seguem a preocupação de não agredir o meio ambiente nem a sociedade. Apesar de essa tendência ainda não receber um nome no Brasil, existe um movimento importante nessa direção. Um exemplo é a advogada paulistana Thene Melaré, de 48 anos. Foi uma das fundadoras da ONG SOS Mata Atlântica, e já carregou até baleia inflável na Avenida Paulista, em protesto contra os maus-tratos a esse mamífero. Especializou-se em Direito Ambiental, e depois de morar por um ano em Londres, mudou radicalmente de comportamento. "Lá é muito forte o consumo consciente. Todas as embalagens de produtos indicam se há selo verde, se houve testes em animais", conta. "Morava perto do Tâmisa, e via os peixes e plantas daquele rio, que foi despoluído. Em São Paulo, moro próximo ao rio Pinheiros e, quando bate um vento, o mal cheiro chega em casa", compara. Desde as compras simples até as maiores, Thene prioriza produtos que não agridam o meio ambiente, feitos de materiais biodegradáveis. E mais: pesquisa em sites, como o do Greenpeace, para não consumir nada de empresas que estejam poluindo a natureza. Mesmo se for para trocar o piso de casa, jamais passa o cartão antes de comprovar que a madeira é certificada. E ensina: é preciso que tenha o selo da FSC (Forest Steward Council) - ou Conselho de Manejo Florestal -, o qual atesta que aquele produto veio de processos de manejo sustentável. O mesmo se dá com relação aos cosméticos: não consome nem um simples esmalte de empresas poluentes ou que testam os produtos em animais. Desde que voltou de Londres, Thene abriu mão da advocacia, com o sonho de montar um negócio relacionado ao meio ambiente. Recentemente, inaugurou a loja Prendas da Marquesa, onde vende artesanato feito por comunidades de todo o Brasil, que fazem uso dos recursos naturais de forma sustentável, em parceira com o programa Artesanato Solidário. Na loja, fornece uma sacola de tecido para os clientes, como incentivo para que deixem as plásticas de lado. Também busca qualidade de vida fora do trabalho. Faz ioga há nove anos, medita e frequenta uma casa espírita. "O consumo consciente e a busca espiritual estão ligados. Dizem respeito ao amor: pelas pessoas, pela natureza e pelo mundo." NOVA TRAMA A mineira Ana Cândida Zanesco, de 28 anos, criou o Instituto Ecotece (www.ecotece.org.br) em 2005. Além de propor reflexões sobre o uso de materiais ecologicamente corretos nas roupas - como o algodão orgânico - também busca conscientizar sobre o trabalho das pessoas que integram a cadeia produtiva. "Uma camiseta não é apenas um produto, mas um conteúdo de histórias", fala. "A partir do momento em que temos essa visão mais ampla, podemos buscar as origens dos produtos e os impactos socioambientais que são gerados." Ana também dá cursos, presta consultoria (promoveu o primeiro curso do Brasil sobre princípios de como se vestir de forma consciente) e está à frente de projetos de desenvolvimento social. O Retece, por exemplo, é voltado para mulheres da periferia de Santo André, que recebem roupas doadas e retalhos, e aprendem técnicas para prolongar a vida das roupas. No seu dia-a-dia, Ana adota algumas "técnicas" para driblar o desejo desenfreado por roupas. "Procuro identificar o que é um desejo verdadeiro, e o que é um impulso consumista, despertado por estímulos da mídia, e propagandas." O Ecotece também promove trocas de roupas: uma maneira ecológica de se vestir, pois otimiza recursos que já foram produzidos. "Já consegui peças bem legais nesses bazares. Na Europa, estão cada vez mais populares entre amigos, e nas festas, cafés, eventos. Por aqui, ainda não há uma cultura do velho. Muitas pessoas me perguntam sobre a energia que fica em uma roupa usada: costumo responder que colocá-la para tomar sol é a melhor solução." VISÃO COMUNITÁRIA Um grupo de comunicadores criou a comunidade urbana Semente Una, em São Paulo. São 11 integrantes que, desde março deste ano, investem em metas sociais. Cada um deles trabalha com uma atividade diferente, mas congregam recursos em prol da comunidade - "que não é alternativa!", frisa Gustavo Prudente, integrante do grupo. Apesar de cada um ainda ter sua residência, passam o dia juntos na casa da Pompeia, sede da comunidade. As parcerias e permutas com outras empresas são recorrentes: estão trabalhando para promover uma feira de trocas solidárias na zona oeste. "Procuramos fazer compras nas lojas do bairro", conta Rita Monte, advogada e jornalista de 28 anos. Como ela, a maioria dos integrantes é vegetariana. "Não compramos em supermercados de grandes redes porque queremos estimular o comércio de bairro e porque nem sempre concordamos com algumas de suas políticas". Também quase não consomem roupas. "À medida que você alcança uma paz e felicidade perenes, começa a enxergar o consumismo como um movimento doentio", diz Rita. "Consumimos o mínimo possível." Sempre consulta a "lista suja" da ONG Repórter Brasil (www.reporterbrasil.com.br), e a divulga para os outros integrantes, para que não comprem produtos de empresas que fazem uso trabalho escravo ou semiescravo. No próximo ano, pretendem fazer uma composteira (para transformar o lixo em adubo orgânico) no jardim. E têm um projeto de reforma da casa por meio da bioconstrução - modelo de arquitetura que utiliza materiais reciclados e não poluentes, muitas vezes naturais, como barro e palha. "Queremos ter um banheiro seco", empolga-se Rita. A comunidade segue a Prout (ou Teoria da Utilização Progressiva), uma filosofia sócio-econômica voltada para o desenvolvimento físico, mental e espiritual das pessoas. Junto com outros parceiros da rede Prout de São Paulo, os integrantes da Semente Una estão elaborando o mapa de toda a cadeia produtiva da cidade na área da saúde: vão mapear o processo de produção, desde a obtenção da matéria-prima, passando por montagem, até chegar ao produto final. "O objetivo é buscar produtores que queiram participar das trocas solidárias, sem o intermédio das grandes empresas", conta Gustavo Prudente. "A onda do consumo consciente pode cair em algo que as pessoas acham ?bonitinho?. Queremos mostrar que não é bonitinho: é real, possível e necessário." 13 PRÁTICAS SUSTENTÁVEIS 1. Evite deixar lâmpadas acesas em ambientes desocupados. 2. Feche a torneira enquanto escova os dentes. 3. Desligue aparelhos eletrônicos quando não estiver usando. 4. Planeje as compras de alimentos. 5. Peça nota fiscal quando faz compras. 6. Planeje a compra de roupas. 7. Aproveite o verso de folhas de papel já utilizadas. 8. Leia o rótulo atentamente antes de decidir a compra. 9. Separe o lixo para reciclagem. 10. Espere os alimentos esfriarem antes de guardá-los na geladeira. 11. Compre produtos feitos com material reciclado. 12. Compre produtos orgânicos. 13. Procure passar para o maior número possível de pessoas as informações que aprende sobre empresas e produtos.

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