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STF retoma ação sobre célula-tronco embrionária

Relator diz que vai colocar tema em votação no início de dezembro

Por Felipe Recondo e BRASÍLIA
Atualização:

Depois do mensalão, da infidelidade partidária e do direito de greve no setor público, o Supremo Tribunal Federal (STF) prepara-se para uma nova polêmica: julgar se é constitucional ou não a pesquisa com células-tronco embrionárias. O ministro Carlos Ayres Britto, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) que contesta as pesquisas, avisou aos demais colegas que pretende incluir o assunto na pauta no início de dezembro. Para isso, espera concluir seu voto até o fim desta semana. A permissão para as pesquisas está na Lei 11.105, de Biossegurança, aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2005. O texto liberou os estudos, mas impôs restrições. Por exemplo: só podem ser usados embriões inviáveis ou congelados há mais de três anos, com o consentimento dos genitores. No cerne do debate, os ministros terão uma questão complicada pela frente: definir em que momento começa a vida. Se entenderem que os embriões, mesmo nos primeiros dias, têm status de "pessoa", a pesquisa pode ser considerada inconstitucional. Caso contrário, a lei será válida e a pesquisa continuará liberada. A dúvida não é meramente técnica e, mesmo que fosse, haveria várias respostas mesmo entre os cientistas. "Teremos diversas respostas, dependendo de quem estará respondendo", diz Patrícia Pranke, chefe do Laboratório de Hematologia e Células-Tronco da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e do Instituto de Pesquisa com Células-Tronco. "Há gente que diz que só há vida quando nasce, quando a criança vem para o mundo exterior. Agora, é preciso que a Suprema Corte decida quando começa a vida, e para isso está se valendo de toda uma reflexão científica que nós estamos fazendo", diz o ex-procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, autor da ação que questiona no STF a pesquisa com células-tronco embrionárias. PROMESSA As pesquisas com células-tronco são consideradas importantes para o possível desenvolvimento de novos tratamentos, como, por exemplo, para doenças degenerativas. O receio dos cientistas é que a proibição das pesquisas deixe o Brasil para trás em relação aos demais países do mundo. "Nós vamos perder a capacidade de competir com o primeiro mundo e, se houver tratamentos no futuro com células-tronco embrionárias, vamos ter de pagar royalties gigantescos para ter acesso a eles", afirma Mayana Zatz, diretora do Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de São Paulo (USP). Caso isso aconteça, ela diz que quem tiver dinheiro poderá se tratar no exterior, mas quem não tiver, ficará sem o tratamento. Fonteles contesta. "Se (a Adin) for deferida, vai impedir uma única linha de pesquisa no tratamento da degeneração de órgãos. Tudo mais está aberto. A medicina tem uma amplidão enorme de pesquisa." Em abril, a ação foi tema da primeira audiência pública da história do STF, com a participação de vários pesquisadores favoráveis e contrários às pesquisas. A discussão sobre pesquisas com células-tronco embrionárias coloca em conflito conceitos científicos e religiosos. Católico fervoroso e autor da ação contra a pesquisa, Fonteles afirma que seus argumentos são científicos e coincidem com sua crença religiosa. "Casaram lindamente a minha posição religiosa com a minha posição científica", diz. Para ele, a pesquisa viola dois fundamentos da Constituição: o que garante a dignidade da pessoa e o que define que a vida é inviolável. "Há uma diferença muito grande entre uma célula viva e um ser humano. Cada célula do corpo está viva. Um coração a ser transplantado está vivo, mas isso não quer dizer que seja um ser humano", retruca Mayana. "A possibilidade de um embrião gerar células não quer dizer que vá gerar um ser humano." LEGISLAÇÃO O que diz a Lei de Biossegurança sobre as pesquisas com células-tronco embrionárias: "É permitida, para pesquisa, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro." Condições: Os embriões devem ser inviáveis (portadores de defeitos genéticos ou morfológicos) Caso sejam viáveis, devem estar congelados há pelo menos 3 anos Em qualquer caso, é preciso o consentimento dos genitores As pesquisas devem ser submetidas à apreciação e aprovação de um comitê de ética da respectiva instituição de pesquisa É vedada a comercialização de células-tronco embrionárias

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