Pinhão-manso move geradores na África

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Por André Monteiro
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Leonardo Perdomo, de 28 anos, físico, cursava o mestrado na área de Planejamento Energético da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em 2006, quando enfrentou um inesperado desafio. Aluno dedicado, ele se destacava entre os colegas. Mas, de repente, foi parar numa aldeia africana, colocando em prática tudo aquilo que havia aprendido nos laboratórios. Com criatividade, Leonardo havia inventado um equipamento para produzir biodiesel de forma simples, que pode mudar a realidade de muitas regiões remotas. Onde fazer o teste? Uma possibilidade: a remota Tanzânia. Por meio de um convênio internacional, Leonardo fez um intercâmbio na ONG Organização Tradicional para o Desenvolvimento Energético e Ambiental da Tanzânia (Tatedo). Localizado na costa leste da África, esse país é um dos mais pobres do mundo. Menos de 1% da área rural tem rede elétrica. O pesquisador embarcou em São Paulo para ficar 18 meses na Tanzânia e auxiliar projetos locais com seu conhecimento. Era o único estrangeiro na organização. Após informar-se sobre algumas iniciativas, ele se concentrou no problema de muitas aldeias espalhadas pelas savanas: falta de combustível para geradores e veículos agrícolas. O alto preço do óleo diesel e a enorme distância entre as aldeias e as cidades tornam o abastecimento muito difícil. A solução foi encontrada no biodiesel, um tipo de combustível renovável e biodegradável, derivado de óleos vegetais ou de gordura animal, que pode substituir ou ser adicionado ao diesel do petróleo. Sua combustão produz menos fuligem (fumaça preta). Estudos indicam que o uso de um quilo de biodiesel reduz em cerca de três quilos a quantidade de gás carbônico na atmosfera. Além disso, sua queima é mais regular que a do diesel convencional. Leonardo encontrou na Jatropha curcas, planta utilizada para cercar as aldeias, uma ótima fonte de óleo vegetal. Conhecida como pinhão-manso, a planta não é comestível e não ameaça a oferta de alimentos. Como falta eletricidade no país, foi criada uma prensa movida pelo próprio óleo. A energia acumulada na prensagem ainda move um pilão de farinha e um gerador para pequenos utensílios elétricos. Com apenas uma máquina de solda, uma serra quebrada, um alicate e um martelo sem cabo, o pesquisador e a equipe da ONG construíram o sistema. Um filtro de lona prepara o óleo, que reage com álcool e soda cáustica em um tambor de aço, equipado com um motor a bateria. Por meio desse processo de transesterificação, são produzidos até 200 litros de biodiesel em cada etapa, ao custo de 20 centavos de dólar o litro - sete vezes menos que o diesel convencional. Como a população das aldeias não tem educação formal, foi elaborado um treinamento rápido e simples com desenhos explicativos. De volta ao Brasil, Leonardo está em fase de encerramento do mestrado. Ele fará palestras em universidades, em busca de parcerias. "No Brasil o reator seria muito útil, sobretudo nas regiões Norte e Nordeste. O óleo de pinhão-manso pode ser substituído por outros, como o de mamona, soja ou dendê", explica. O incentivo não é apenas social e ambiental. A Lei 11.097/2005 prevê para 2008 a incorporação de 2% de biodiesel ao diesel do petróleo vendido no País. Para atingir essa cota, será preciso aumentar em quase 100 milhões de litros a produção atual, que este ano deve atingir os 750 milhões. * André Desenso Monteiro é aluno da Facamp - Faculdades de Campinas

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