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Pé na tábua

Os ralis proporcionam diversão, aventura e superação de limites para mulheres de diferentes idades

Por Fabiana Caso
Atualização:

Terrenos acidentados ou pistas de alta velocidade estão sendo desbravados por mulheres. Ao invés de apenas acompanharem namorados ou maridos, elas participam de ralis como pilotas ou navegadoras (quem senta no banco do carona, dando as coordenadas). "De três anos para cá, muitas começaram a correr", atesta a diretora de projetos especiais da Mitsubishi, Corina Souza Ramos, que trabalha nos ralis da marca há 12 anos. Há até premiação específica: a melhor dupla feminina da categoria Turismo ganha uma viagem. No ano passado, a dupla Caroline Köhler e Edileusa Köhler faturou uma viagem para a Bahia: mãe e filha ficaram em primeiro lugar na classificação feminina do rali de regularidade da Mitsubishi. Caroline, de 25 anos, pilota, e Edileusa, de 46, navega. Ambas advogadas, elas moram em cidades diferentes: a filha em Florianópolis, e a mãe, em Rio do Sul, também em Santa Catarina. Aventureira, a filha sempre gostou de dirigir: tinha um Buggy e um de seus passatempos favoritos era descobrir cachoeiras e explorar cidades dos arredores. "Com o rali, conheci lindos cenários." Apesar da então falta de experiência no esporte, não hesitou quando a mãe a convidou para substituir uma amiga pilota, em 2006. "A prova de regularidade exige concentração. Há pegadinhas, como duas entradas que têm 20 metros de diferença e, se você se confundir, perde muito tempo." Nessa modalidade, o objetivo não é chegar mais rápido, mas sim cumprir a prova no tempo estabelecido. É possível levar o chamado "Zequinha": um passageiro que acompanha tudo no banco de trás. Outra vantagem é que se pode competir com o próprio carro. "É preciso ter uma sintonia completa com o navegador, que vai ficar corrigindo o caminho e a velocidade." Caroline conta que ela e a mãe têm personalidades fortes: brigam muito durante as provas, mas acabam se entendendo. "Nesse momento, deixamos todos os problemas para trás." ACELERANDO Como o nome já diz, nos ralis de velocidade, o barato é outro. Ganha quem chega primeiro, e o esporte pede um carro preparado e exclusivo. Há itens de segurança, e os competidores usam macacões à prova de chamas, além de capacete, sapatilhas e outros acessórios de proteção. A agente de viagens Adriana Parra, de 35 anos, corre a Mitsubishi Cup há quatro anos, como navegadora do marido piloto, o comerciante Paulo Rugna. Antes, fazia trilhas de jipe na Serra da Cantareira. Na primeira prova que participou, em Campinas, Adriana foi com a cara e a coragem. Presenciou acidentes, não conseguindo acreditar que se tratava de um esporte seguro. Mas insistiu: já em 2005, a dupla ficou em terceiro lugar na classificação geral. "A navegadora é o cérebro: visualiza o caminho e deve passar dados com precisão", resume. "É preciso gostar de números, distâncias e de velocidade." Adriana foi trocando ideias, aprendendo com navegadores experientes, até dominar o ofício. "Quando soa o apito, é uma sensação de montanha russa, que só para na bandeirada final."Nessas provas, a dupla faz três voltas de cerca de 30 minutos cada, com intervalos de uma hora entre cada uma. Mas o trabalho já começa na sexta-feira à noite, antes do sábado de provas. "Estudo as planilhas, marcações e as regras. Não há muito tempo para fazer turismo: nos concentramos nas provas e na checagem de todos os itens do carro." Um dos maiores desafios foi quando o carro da dupla capotou, justamente no momento em que liderava a prova, a quatro metros da linha de chegada, na etapa de Londrina, em 2005. "Não me mexi", conta Adriana. "Estava tão focada em ganhar que não queria sair, mesmo com o carro apoiado em uma das laterais. Só depois me toquei que estava numa posição de risco, porque outro veículo poderia bater no nosso." O carro foi desvirado e continuaram a prova. Adriana conta que tem notado um crescimento no número de mulheres que participam de ralis, principalmente esposas e namoradas de pilotos. "Não é fácil para a mulher. Tem muito impacto: é preciso fortalecer a região lombar e peitoral." Por isso, pratica pilates e descobriu até um sutiã específico que traz maior sustentação. Também capricha na alimentação: come muitas fibras e vitaminas para ter mais energia e resistência. "Tudo é feito para os homens, inclusive o macacão com zíper para facilitar a ida deles ao banheiro." Pelo menos no quesito sapatilha, conseguiu dar um toque feminino. "Um amigo me trouxe um modelo cor de rosa do exterior." CÁLCULOS A analista de sistemas Gilze Ferreira de Araújo, de 44 anos, é a primeira navegadora mulher da Copa Pegeout. Seu entusiasmo pelo esporte vem de longa data: em 1996, começou a participar de ralis de regularidade com a amiga Cláudia de Lima Teixeira. "Adoro fazer contas, pensar em distâncias e velocidade: é pura física", exclama ela, que chegou a cursar essa matéria na faculdade. Depois da primeira participação, passou a frequentar cursos e palestras na Federação de Automobilismo de São Paulo. "Tem gente que sente enjoo por ter de ler planilhas e fazer contas dentro do carro em movimento. Felizmente, não sinto nada disso." Depois de correr muitas provas de regularidade, a amiga de Gilze se casou com um piloto do rali. "Havia uma planilha para chegar à igreja", conta Gilze, que ficou sem parceira depois que a amiga engravidou e abandonou as provas. Nessa época, começou a se interessar mais pelos ralis de velocidade. Tanto que em 2003 lançou, junto com outros amigos do esporte, o Campeonato Paulista de Rali de Velocidade, em parceria com a Federação. Por dois anos, deixou de lado a navegação para organizar esse evento. No entanto, cansados da falta de estrutura e tendo de colocar dinheiro do próprio bolso, Gilze e os parceiros entregaram o campeonato para um organizador profissional, em 2005. Foi então que o piloto Renato Kahn a convidou para ser sua navegadora na Copa Peugeot. Para ela, que sempre gostou de esporte e competições, o rali foi uma grande descoberta. "Gosto de me divertir, mas na hora da prova, quero fazer tudo certo." Há gente de todas as idades nas provas. Sem nenhuma experiência anterior, a aposentada Maria Clara Petraglia participou da etapa de Petrópolis da Copa Peugeot, aos 84 anos. "Tenho um carro antigo, mas bem conservado. Gosto de pegar a estrada, costumo dirigir até o Rio, São Paulo e todos os cantos", conta ela, que mora em Petrópolis. Sua sobrinha, Danielle Damico, de 22 anos, foi a navegadora. "Não ganhamos, porque não tínhamos prática, mas quero participar novamente no ano que vem. Agora que já sei como funciona, vamos conseguir uma colocação melhor", aposta Maria Clara, que não levou o troféu para casa, mas foi homenageada: recebeu um livro como a candidata mais velha da prova.

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