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Papa lança texto sobre esperança

Em encíclica, Bento XVI critica materialismo e invoca exemplos de fé de ex-escrava sudanesa e cardeal vietnamita

Por José Maria Mayrink
Atualização:

O papa Bento XVI publicou ontem a encíclica Spe Salvi ( Salvos pela Esperança), a segunda em dois anos e meio de pontificado, na qual faz uma profunda reflexão sobre a esperança cristã, a partir de textos da Bíblia e da mensagem de Jesus Cristo, na perspectiva da vida eterna. A primeira encíclica, Deus Caritas Est (Deus é Amor), foi divulgada em janeiro do ano passado. "A redenção nos é oferecida no sentido que nos foi dada a esperança, uma esperança fidedigna, graças à qual podemos enfrentar o nosso tempo presente", afirma o papa na introdução do documento, acrescentando que "o presente, ainda que custoso, pode ser vivido e aceito, se levar a uma meta" que, como diz adiante, é "chegar a conhecer Deus, o verdadeiro Deus". A encíclica é uma carta circular dirigida aos bispos, presbíteros, diáconos, religiosos e a todos os fiéis leigos, ou seja, a toda a Igreja. Embora não seja um documento ex cathedra - quando o papa é infalível - é parte do magistério da Igreja e, nessa condição, deve ser recebido com respeito pelos católicos. "Em Spe Salvi, o papa insiste que a esperança cristã não está situada num além imaginário, mas já se faz presente em nós quando o amor de Deus nos alcança e nos torna capazes de amar, abrindo-nos ao outro", observa nota da presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), divulgada em Brasília. O texto chama a atenção para o fato de a encíclica destacar que o objeto principal da esperança cristã é a vida eterna. Para Bento XVI, a eternidade não é "uma sucessão contínua de dias do calendário, mas algo parecido com um instante repleto de satisfação... o instante de mergulhar no oceano do amor divino no qual o tempo - o antes e o depois - já não existe". Os cardeais que apresentaram a Spe Salvi aos jornalistas no Vaticano - o dominicano Georges Cottier e o jesuíta Albert Vanhoye, ambos teólogos - destacaram a análise que Bento XVI faz da esperança em confronto com a mentalidade moderna. O papa evoca Santa Josefina Bakhita, uma ex-escrava africana do século 19, como exemplo de esperança no amor de Deus. Lembra também o cardeal vietnamita Nguyen Van Thuan que, após 13 anos na prisão, 9 dos quais numa solitária, escreveu Orações na Esperança - "um livrinho precioso". De Santo Agostinho a Lutero, Kant, Bacon e Engels, santos e filósofos que trataram do tema, desfilam na encíclica como testemunhas da preocupação do homem com a esperança. No campo político, Marx errou, na interpretação de Bento XVI, pelo seu materialismo, após ter descrito "com grande capacidade analítica, as vias para a revolução". Após advertir que "não é a ciência que redime o homem", que "é redimido pelo amor", o papa afirma que "quem não conhece Deus, mesmo podendo ter muitas esperanças, no fundo está sem esperança". Bento XVI aponta a oração como "primeiro e essencial lugar" da esperança. "Quando já ninguém me escuta, Deus ainda me ouve." No final, apela para a solidariedade, "pois uma sociedade que não consegue aceitar os que sofrem ... é uma sociedade cruel e desumana".

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