Na direção, Fernanda Parra

Única mulher piloto na Copa Vicar (antiga Stock Car Light), ela acabou de anunciar sua ida para a Pick Up Racing

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Por Marta De Divitiis
Atualização:

Ser piloto de automobilismo nunca esteve nos planos da menina Fernanda, mesmo familiarizada com o ambiente desse esporte (seu pai é o ex-corredor da Stock Car V8 e Mil Milhas, Fernando Parra). Pensava em ser advogada ou veterinária. Mas foi em Administração que se formou, em São Francisco, nos Estados Unidos. "Comecei, ainda adolescente, a trabalhar na empresa do meu pai, de tecnologia. Acabei me envolvendo bastante com essa atividade e, por isso mesmo, optei pelo curso", conta ela. Quando voltou ao Brasil, uma amiga a convidou para fazer um curso de pilotagem e ela aceitou, só por brincadeira. Foi então que as pistas a atraíram. "Gostei tanto que resolvi entrar nesse universo." Curiosamente, para ingressar no automobilismo, teve que enfrentar a resistência do pai, preocupado com as dificuldades do esporte. Afinal, a frustração é quase constante, devido à necessidade de patrocínio, um requisito fundamental - não bastando, portanto, a habilidade do piloto para vencer. Fernanda não participou, por exemplo, da primeira corrida dessa temporada, pois teve problemas com o motor de seu carro. "Numa corrida, você depende de muitos fatores. O resultado não está apenas nas suas mãos. Muitas vezes, você não consegue chegar ao final por problemas técnicos ou outros motivos", esclarece. Logo após essa primeira corrida, decidiu mudar de categoria: foi para a Pick Up Racing, um outro braço da Stock Car - o motor dos carros é o mesmo, e a "bolha", como é chamada a "casca" do carro, é de pick up. "Resolvi mudar porque essa categoria tem menos competidores. Além de aumentar as chances de uma boa classificação, isso favorece uma ampla cobertura de mídia, oferecendo visibilidade maior", explica Fernanda, que manterá o mesmo preparador, Jaime Silva, e continuará na equipe Katálogo Racing, patrocinada pela Corel, Embarcadero e Rádio Transamérica. "Até hoje, meu maior desafio foi correr na antiga Stock Car Light, devido à grande competitividade e à grande experiência da maioria dos pilotos", revela. Pretende, com essa mudança de categoria, ficar entre os dez primeiros na temporada. Aguarda com ansiedade sua estréia na segunda etapa, em 8 de junho, no autódromo de Santa Luzia, em Belo Horizonte. Apesar de todas as dificuldades próprias desse esporte, Fernanda já subiu ao pódio algumas vezes: ficou em quarto lugar no Campeonato Paulista de Força Livre, em 2005, um torneio com 24 provas, no qual competiu com um Ômega; e ocupou o quinto lugar no Troféu Maserati, em 2006. Ao lado do pai, Fernando, ficou em segundo lugar nas Mil Milhas Brasileiras, em 2006. "Essa, aliás, foi a corrida mais marcante na minha curta carreira, pois éramos apenas nós dois (as outras equipes eram formadas por três pessoas). Enfrentamos dez horas de prova, supercansativa. Ao mesmo tempo, foi uma grande emoção correr na mesma equipe do meu pai." Paulistana, Fernanda se mudou para Curitiba há um ano, por conta do trabalho na empresa. Diz que gosta muito da cidade, embora ainda estranhe um pouco o frio. Sua rotina inclui exercícios físicos: corrida duas a três vezes por semana, durante quarenta minutos; natação, duas vezes por semana, e musculação. É preciso condicionamento físico para agüentar os 60ºC que faz dentro do carro - isso acontece porque o calor do motor invade o cock pit, isto é, o local onde fica o piloto. A musculação visa a fortalecer a área dos ombros e pescoço, muito requisitadas durante as corridas. Esse, aliás, é um ponto fraco para ela, que, por ser mulher, não dispõe da mesma resistência muscular dos homens. "Sempre, após a corrida, sinto dores nos ombros, pois o esforço é grande", relata. Antes das provas, faz bastante alongamento e bebe muita água. Perfeccionista, sempre acha que poderia ter feito melhor. Mas sabe que, com a experiência, a performance tende a melhorar cada vez mais. "Pretendo viver só disso e gostaria ainda de me mudar para a V8, categoria principal, mas, para isso, preciso de mais dois ou três anos. Sinto que, se tivesse mais experiência, seria bem melhor. O problema é que comecei tarde e, ao contrário da maioria dos pilotos (que começam ainda crianças, em karts), nunca havia dirigido carros de corrida ou karts antes daquele curso", confessa. No entanto, para a garota que só resolveu entrar nessa atividade aos 24 anos - completou 29 anos no dia 28 de abril -, ela já provou que pode chegar lá. CLUBE DO BOLINHA O fato de ser mulher não a atrapalha nem um pouco, mas já lhe rendeu um certo desconforto. Hoje, porém, diverte-se quando lembra de algumas passagens inusitadas. Bem-humorada, conta que, em uma de suas primeiras corridas, um torcedor, na hora das visitas ao box, pensou que ela fosse a cozinheira da equipe. "Quando ele soube que eu era piloto, pediu desculpas." Algumas pessoas estranham, a consideram "pequena" (tem pouco mais de 1m60) para dirigir carros tão possantes. Dos colegas nunca ouviu nada. Quanto aos mecânicos, se deixam escapar algum palavrão quando estão perto dela, logo pedem desculpas. A sensibilidade feminina, no entanto, a ajuda, especialmente nas pistas molhadas. "Ando melhor sob a chuva, pois sou supercuidadosa, não sei se pelo fato de ser mulher, mas sinto quando posso acelerar ou não." Vaidosa, mantém seus cabelos longos e loiros presos em trança durante a corrida, pois o capacete forma inúmeros nós quando ficam soltos. Para evitar que se quebrem ao volante, as unhas andam agora sempre bem aparadas, embora as prefira longas. Fernanda gosta de carros grandes: segundo ela, têm tração traseira, e isso dá mais segurança na direção. Em junho, ao lado do pai, ambos na mesma equipe, correrá num Ômega os 500 quilômetros de Interlagos, uma das mais tradicionais corridas brasileiras. Normalmente, como na Stock Car o treino só é permitido antes da prova, ela costuma correr em karts, apenas para se manter em atividade entre as corridas. Faz isso ao lado do noivo, o também piloto Rubens Carrapatoso, do circuito American Le Mans, com quem vive há dois anos. "Nos conhecemos através de um amigo comum, o corredor Tuca Rocha, há três anos." O casamento já está marcado para fevereiro do ano que vem. "Na verdade, vamos apenas oficializar nossa união." Sobre a vida em comum, diz que o que mais lhes favorece é o fato de os dois gostarem das mesmas coisas. "Isso é muito bom, facilita o relacionamento, sempre nos divertimos juntos, pois temos os mesmos gostos", justifica. Em Curitiba, concilia as rotinas de administradora, trabalhando na área de marketing da empresa de seu pai, e de piloto, participando agora da Pick Up Racing. "Tanto eu como o Rubens viajamos na época das corridas, e treinamos no kart aqui em Curitiba, sempre que possível." Em sua casa, conta com a ajuda de uma empregada, já que trabalha das 9 às 18 horas diariamente e, nas horas vagas, se exercita, para estar pronta para a próxima largada. A paixão pelo esporte é total: na internet, praticamente só acessa os sites de automobilismo. "Gosto demais dessa profissão, não vejo a hora de conseguir viver somente como piloto de corrida!"

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