Filho e neto de intelectuais, dedicou a vida à pesquisa

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Por Redação
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Diz a biologia que as características gerais de um indivíduo são determinadas por uma combinação cumulativa das interações entre seus genes e o ambiente ao qual esses genes são expostos ao longo da vida. A história de Charles Darwin parece encaixar-se perfeitamente nesse roteiro. Filho e neto de intelectuais da alta classe britânica, ele provavelmente tinha os genes necessários correndo na família para se destacar nas atividades científicas. Seu avô paterno, Erasmus, por exemplo, foi um importante filósofo e botânico que já refletia intensamente sobre a evolução e a origem das espécies no fim do século 18. Somado a essa base genética, Darwin tinha muitos fatores "ambientais" atuando a seu favor quando elaborou sua teoria. Assim como seu avô, vários cientistas antes dele já estavam pensando e escrevendo sobre a evolução dos seres e do planeta. Havia muitas ideias no ar. O momento era propício para uma revolução científica. "Foi um contexto social que produziu o darwinismo, não foi algo que saiu só da cabeça dele", diz o biólogo Nelio Bizzo, da Faculdade de Educação da USP. "Darwin viveu num momento histórico que deu a ele os elementos necessários para formular sua teoria", reforça o físico e historiador Ildeu de Castro Moreira, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Por pertencer a uma família rica, Darwin também pode se dar ao "luxo" de trabalhar por anos em sua teoria, sem se preocupar em pagar ou prestar contas a ninguém. Depois que voltou de sua odisseia no Beagle, ele nunca mais deixou a Inglaterra. Passou o resto da vida na sua casa de campo em Kent - a famosa Down House -, dedicando-se exclusivamente a suas pesquisas e sua família (teve dez filhos com sua prima, Emma). Em momento algum, porém, isolou-se do mundo. Uma das características mais marcantes de Darwin era que ele escrevia cartas diariamente. Trocava correspondências com cientistas ao redor do mundo e estava sempre atualizado sobre descobertas recentes. "Charles Darwin foi um super networker", diz Bizzo. "Mesmo um cara na internet hoje tem dificuldade para manter a rede de relações que ele mantinha." Outro hábito compulsivo de Darwin era não jogar nada fora. Guardava até mesmo os rascunhos de suas cartas e manuscritos - uma dádiva para os historiadores. Tinha uma biblioteca invejável. Lia muito, observava muito e tinha uma curiosidade insaciável pelo mundo natural. Além de A Origem das Espécies, publicou trabalhos marcantes sobre minhocas, flores e cracas (mostrando que elas eram crustáceos, não moluscos). Para Thomas Lewinsohn, da Unicamp, uma das características mais marcantes de Darwin era sua capacidade de fazer perguntas relevantes, bem formuladas e passíveis de serem respondidas experimentalmente. "Ele tinha uma capacidade fantástica de generalizar além dos fatos e tirar conclusões, até mesmo com base em evidências parcas", diz o biólogo e historiador Charbel El-Hani, da Universidade Federal da Bahia. A viagem de cinco anos no Beagle, que o levou ao redor do mundo, foi crucial para que Darwin elaborasse sua teoria. Mas não foi durante a viagem que ele "descobriu" a seleção natural. As peças só se encaixaram em sua cabeça em 1838, após ler o Ensaio sobre o Princípio das Populações, no qual o economista britânico Thomas Malthus argumentava que o crescimento populacional é limitado pela disponibilidade de comida e outros fatores de pressão, como guerras e doenças. "Finalmente tenho uma teoria com a qual trabalhar", registrou Darwin. Ele ainda trabalharia em segredo na teoria por 20 anos, até publicá-la em 1859. Era cuidadoso ao extremo. Pensou nas críticas que seriam feitas e queria ter as respostas prontas antes de apresentá-la. "Para mim ele foi um gênio", diz o biólogo Mário de Pinna, do Museu de Zoologia da USP.

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