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Divã no palco

Em cartaz na cidade, sete peças com temáticas femininas recorrem ao humor para revelar o que pensam as mulheres

Por Ciça Vallerio
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Conflitos, frustrações, temores, vexames e todo tipo de neurose que ronda o universo feminino são temas de sete espetáculos, que estão em cartaz em São Paulo. Apesar do fundo dramático, todas as peças são comédias. Verdade seja dita: rir é sempre melhor do que chorar. Melhor ainda é constatar que os problemas de uma são muito parecidos com os de várias outras mulheres. "As espectadoras se identificam com as personagens, e os homens se deliciam com a descoberta de uma realidade que passa despercebida no dia-a-dia", diz a atriz Juliana Araripe, que atua na peça Confissões das Mulheres de 30. O elenco é formado pelas mesmas atrizes da série Mothern, exibida pelo canal pago GNT. Todas as atrizes estão na faixa dos 30 anos e acabam de comemorar 100 apresentações, com casa sempre lotada. Como é de praxe, elas costumam se misturar à plateia no fim do espetáculo para saber a opinião do público. Surpreendem-se com o que notam e escutam. É comum, por exemplo, a mulher ir primeiro com amigas e depois voltar em outra ocasião, arrastando o respectivo, para que ele aprenda sobre trejeitos femininos. Apesar das confissões serem de mulheres de 30, todas, independentemente da idade, se deliciam com as lucubrações sobre vida pessoal, sexualidade e carreira. O texto, assinado por Domingos de Oliveira, sofreu uma leve adaptação, pois foi escrito nos anos 90, mas continua atual. Uma prova de que assuntos femininos rendem bons negócios no teatro é a peça Os Homens São de Marte... E é pra lá que Eu Vou!. Depois de dois anos em cartaz no Rio de Janeiro, o espetáculo, escrito pela também atriz Mônica Martelli, repetiu o sucesso em São Paulo: já atingiu a marca de mais de mil apresentações e um público de 450 mil. A temporada foi estendida para o começo de março. Outra peça que promete colher bons frutos é Um Dia (Quase) Igual aos Outros, que estreou no começo deste mês com a atriz Débora Duboc. O texto é assinado pelos dramaturgos italianos Dario Fo e, sua mulher, Franca Rame, atual senadora na Itália. A adaptação e tradução foram feitas pela especialista na obra do casal, Neyde Veneziano, premiada diretora e responsável pela montagem do texto pela primeira vez no Brasil. A temática solidão entra em cena, mas com muito humor. A atriz encarna uma executiva, revelando as principais questões das mulheres independentes e bem-sucedidas. A personagem vive protegida em seu mundo hi-tech, que é um apartamento "inteligente", repleto de parafernálias tecnológicas. Mas, cansada de seu fracasso afetivo, resolve suicidar-se. Entre muitas gargalhadas (pode acreditar), o espectador acompanha, impassível, os preparativos: em vez de deixar uma carta, ela inicia a produção de um DVD-testamento, com o intuito de culpar o ex-marido. CAMINHO CERTEIRO "Se tem muitas peças assim é porque está dando certo", avalia Neyde, que também assina a direção do espetáculo. "A mulher é confessional por natureza e acaba revelando suas agruras com humor. Hoje ela enfrenta seus problemas com muito mais leveza. É um olhar de forma distanciada, divertida e, por isso mesmo, contemporâneo. Nossas mães e avós lamentavam, nós rimos." Por ser enigmática, a alma feminina é um aperitivo e tanto para os homens, que, como lembra a diretora, estão acuados diante da mulher moderna e tentam decifrar suas idiossincrasias. Mas mulher em cena é muito mais do que motivo de piada. Para Claudio Marinho, diretor da peça As Ruminantes, a presença feminina tem um brilho especial sobre o tablado. "Elas têm uma beleza incrível, basta lembrar da força cênica das grandes atrizes. Quando adaptei o texto de Saulo Sisnando, eliminei as esquetes com personagens masculinos." Na montagem, seis atrizes divertem-se com seus dramas, que envolvem sexualidade, família, sonhos e por aí vai. A coragem de confessar o inconfessável e de expor as mazelas é um ponto em comum às personagens de As Ruminantes. O título da peça, aliás, refere-se a uma expressão da psicanálise, que indica "pensamentos repetitivos". E uma coisa que mulher sente dificuldade é de parar de ruminar seu passado. A proposta dos espetáculos com temática feminina é colocar uma lente de aumento sobre os dramas pessoais, até torná-los uma caricatura. Também segue essa linha a peça Mulheres, Bobeiras e um Ataque de Risos, que reúne histórias cômicas, em esquetes que falam de família, relacionamento, etc. No rastro dos dramas - e angústias - de algumas solteiras, está em cartaz As Encalhadas, com direção de Bibi Ferreira. É mais uma comédia baseada no complexo mundo feminino. Na lista de espetáculos, há até um no formato stand-up, tipo de comédia que caiu no gosto do público: As Virgens Mas Nem Tanto. Três comediantes, com idades que variam entre 26 e 35 anos, se juntaram para montar o primeiro grupo de stand up no Brasil formado só por mulheres. A proposta desse trio é revelar o cotidiano sob a ótica feminina. "Como há mais homens fazendo stand-up do que mulheres, as piadas ganham versões muito machistas", acredita Andréa Barreto, uma das atrizes. "Agora chegou a nossa vez de mostrar o outro lado da moeda." Embora a marca desse tipo de apresentação seja o fato de o comediante ficar sozinho no palco, elas quebraram o protocolo e, juntas, se revezam nas sacadas hilárias. E mais: entram todas impecavelmente produzidas e lindas. "É a maneira que encontramos de mostrar que mulher que faz humor não precisa ser feia nem fazer o papel da gostosa burra", avisa a comediante.

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