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Cientistas ''ressuscitam'' gene de tigre

Grupo faz funcionar em camundongo DNA de espécie extinta; material foi retirado de filhotes preservados em álcooGrupo faz funcionar em camundongo DNA de espécie extinta; material foi retirado de filhotes preservados em álcooll

Por Carlos Orsi
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Pesquisadores australianos e americanos descrevem, em artigo publicado na Public Library of Science One (PLoS One), a "ressurreição" - no corpo de camundongos transgênicos - de um gene extraído de um animal extinto: o tigre-da-Tasmânia, ou tilacino (Thylacinus cynocephalus), espécie marsupial que desapareceu há cerca de cem anos, e cujo último exemplar em cativeiro morreu em 1936. De acordo com os autores do trabalho, esta é a primeira vez que um gene de um animal extinto volta a funcionar em um organismo vivo. Experimentos anteriores já haviam conseguido reativar a função de genes de algumas espécies extintas em culturas de células em laboratório, incluindo genes do homem de neandertal. "Considero o experimento extremamente importante", disse o pesquisador João Bosco Pesquero, do Departamento de Biofísica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). "É uma façanha muito importante para o estudo da evolução, porque permite ver a função dos genes de espécies extintas." "O gene do tilacino foi colocado em outro animal, o camundongo. São espécies separadas por milhões de anos de evolução e o gene se mostrou funcional mesmo assim", destacou. Os cientistas, das universidades de Melbourne e do Texas, utilizaram tecidos retirados de quatro espécimes, todos com cem anos: três filhotes preservados em álcool e o couro de um animal adulto. O gene usado no experimento regulava a formação de cartilagem no tilacino, e os cientistas demonstraram que o DNA implantado esteve ativo durante o desenvolvimento das cartilagens nos camundongos transgênicos. Uma outra equipe de pesquisadores, ligada ao Museu Australiano, havia anunciado, em 2002, que pretendia criar um tilacino clonado, efetivamente trazendo a espécie de volta à vida, até 2012. Pesquero acredita que o feito recente pode ajudar nesse objetivo, mas que ainda "há um bom caminho pela frente". "Para trazer uma espécie de volta, é preciso reconstituir o genoma completo", explica. "Em animais mortos há muito tempo, há uma degradação, e o DNA se quebra". O geneticista Sandro Luis Bonatto, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), concorda que, em termos de trazer espécies extintas de volta à vida, o avanço descrito na PLoS One "é um passinho a mais". Ele considera "muito difícil" que a meta de clonar um tilacino até 2012 seja cumprida. "A clonagem em si não é difícil, mas conseguir um genoma completo, é", diz. "Talvez uma nova técnica, como a conjunção do seqüenciamento dos genes com a criação de um genoma sintético, possa acelerar isso", completa. Bonatto diz que o processo descrito no novo trabalho permitirá estudar as causas das diferenças entre espécies próximas, como seres humanos e chimpanzés, ou até entre o homem moderno e o neandertal. "Em espécies muito próximas, as maiores diferenças estão nos genes que regulam a função de outros genes", disse. "Os genomas, em si, são muito parecidos". Segundo ele, a possibilidade de testar esses genes reguladores em modelos vivos permitirá ver como funcionam as diferentes regras de cada genoma e descobrir as causas de diferenças que separam espécies de parentesco próximo. "Porque não adianta apenas olhar para a seqüência", afirmou. "A regulação do genoma é muito complexa. É preciso ver funcionar."

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