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Brasil abandona a meta de eliminar a hanseníase

País defende agora controle da doença; medida gerou mal-estar com ONGs

Por Ligia Formenti
Atualização:

Diante da perspectiva de ser um dos últimos países a não eliminar a hanseníase como problema de saúde pública, o Brasil mudou as regras do jogo. Abandonou o compromisso firmado com a Organização Mundial da Saúde (OMS) e defende nova estratégia: o controle. A decisão, discutida em 2007 e detalhada em portaria publicada semana passada, provocou mal-estar no cenário internacional e descontentamento entre organizações não governamentais (ONGs). O receio é de que a luta contra a doença enfraqueça. Veja o mapa da incidência da doença no mundo A coordenadora do Programa Nacional de Controle da Hanseníase, Maria Aparecida de Faria Grossi, rebate as críticas e diz que o Brasil tem muito do que se orgulhar. "Controlar é muito mais do que eliminar. Estamos assumindo a vanguarda. Não nos preocupamos apenas com números de casos, mas com prevenção, tratamento, reabilitação." O argumento não convence a todos. "Quando se fala em mudar uma estratégia de eliminação para uma de controle, o entendimento é que se dá um passo atrás", diz o gerente da área de Vigilância e Saúde e Gestão de Doenças da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), Jarbas Barbosa. Ex-secretário de Vigilância em Saúde do ministério, Barbosa elogia os avanços alcançados. "O Brasil tem feito um excelente trabalho, mas pode ter sua imagem internacional abalada, de forma injusta, quando divulga que não trabalha mais com a meta de eliminação." Ele tem certeza de que a mudança será considerada como resignação em conviver com níveis maiores de prevalência. Pelos seus cálculos, se o esforço para eliminação fosse mantido, a meta seria alcançada em três anos. Para o coordenador do Movimento de Reintegração de Pessoas atingidas pela Hanseníase (Morhan), Arthur Sousa, a discussão envolve mais do que semântica. O abandono das metas, diz, é o primeiro passo para a desmobilização. "Objetivos sempre foram importantes. Incentiva profissionais e a população." Ele lembra que essa é a estratégia usada para doenças como poliomielite e rubéola."Se vale para essas doenças, por que não para hanseníase?" Maria Aparecida diz que o programa passou a falar em controle por uma razão: não há vacina. "Sem ela, não temos como falar em eliminação." Ela argumenta que, quando se trabalha com metas, há o risco desmonte do esquema tanto para a assistência, quanto para prevenção, quando os números são alcançados. "Queremos reduzir o número de casos e manter vigilância para que não haja uma retomada." Ela diz que países que atingiram a eliminação passaram a registrar aumento de casos, numa segunda etapa. Sanitarista e por anos coordenador do programa de hanseníase da Opas, Clóvis Lombardi afirma que os conceitos estão sendo confundidos. "Eliminar significa reduzir a menos de 1 caso por 10 mil habitantes. É muito diferente de erradicar."

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