“Se quiser passar dos 100 anos não coma isso. Mas aquilo ajuda, está liberado, à vontade.” Estamos no século da vida, morte é assunto do milênio que ficou - e o que não falta é notícia, estudo e conselho sobre quais alimentos interferem na longevidade, para o bem e para o mal. Muitas das descobertas de médicos e nutricionistas fazem sentido e devem ser levadas a sério (alguém duvida que se fartar de frituras faz mal?). Mas há outra variável na equação comida e vida longa, além da qualidade do que se come: a quantidade. Ao que tudo indica, ela é a que mais pesa no resultado da conta que define nosso tempo na Terra.
Um estudo feito por geneticistas da Universidade de Medicina de Harvard, divulgado há duas semanas, trouxe de volta à tona a discussão “o quê x o quanto” comer para acrescentar anos de vida saudável, que andava meio esquecida. E de forma um tanto polêmica. Os pesquisadores sugeriram que a dieta da fome intermitente (intermittent fasting, em inglês), na qual se alternam períodos de fartura e de privação alimentar, pode retardar a morte e o aparecimento de doenças.
Aos olhos de médicos e nutricionistas convencionais, o regime, moda entre as celebridades de Hollywood, faz um mal danado à saúde - desregula os mecanismos da fome e pode levar a distúrbios alimentares. Mas, segundo os geneticistas de Harvard, os ganhos superam os riscos. Os participantes da pesquisa que se submeteram à dieta apresentaram diminuição do peso, da pressão arterial, das taxas de glicose e colesterol e do nível de inflamação celular. E mais: o regime aumentou a expressão do gene SIRT 3, que tem um papel importante na proteção celular e na longevidade.
Os 24 homens e mulheres avaliados pelos pesquisadores consumiram 25% do total de calorias recomendadas em um dia e 175% desse total no outro, por dez semanas, No cardápio da “fome” , de aproximadamente 650 calorias, rosbife, batata cozida e suco de laranja, em uma única refeição. O menu “fartura”, com 4.450 calorias tinha bagel com cream cheese, sanduíche de peito de peru, macarrão com frango, iogurte, refrigerante, chocolate e sorvete de creme.
Esta não é a primeira vez que a fome intermitente ganha as manchetes dos jornais científicos. No fim do ano passado, pesquisadores do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos fizeram alarde ao divulgar um estudo sobre a eficácia do método para evitar a diabetes e o câncer.
O paradoxo alimentar intriga os cientistas há um bom tempo. Para uma sobreviver, nosso organismo precisa de comida. No entanto, é a comida que nos mata, aos poucos. Para extrair a energia dos alimentos, o corpo produz substâncias oxidantes, os chamados radicais livres, que contribuem para o envelhecimento celular. Foi a partir desse entendimento que a restrição calórica despontou como a mais efetiva maneira encontrada até hoje de prolongar a vida.
Desde 1930, é fato comprovado que a ingerir 30% menos calorias diminui o ritmo de envelhecimento. Funciona em todas as espécies já submetidas a experimentos nos últimos oito séculos - fungos, moscas, répteis, galinhas, cães e macacos, só para citar algumas. Tudo leva a crer que o Homo Sapiens não fuja à regra.
Mas há dois problemas com a restrição calórica. O primeiro: são raras as pessoas com força de vontade suficiente para consumir, todos os dias, até o último suspiro, míseras mil e poucas calorias. O segundo: fora do laboratório, onde há um controle rígido das calorias e dos nutrientes oferecidos às cobaias, o comedimento alimentar não tem os mesmos efeitos.
Por esses motivos, a dieta da fome intermitente, muito mais fácil de seguir, tende a ganhar mais adeptos e ainda mais atenção dos cientistas.