Comer bem ou comer pouco? Eis uma questão da longevidade

Estudo reforça tese de que privação alimentar tem mais efeito no aumento da expectativa de vida do que a qualidade dos alimentos

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Por Gabriela Carelli
Atualização:

“Se quiser passar dos 100 anos não coma isso. Mas aquilo ajuda, está liberado, à vontade.” Estamos no século da vida, morte é assunto do milênio que ficou - e o que não falta é notícia, estudo e conselho sobre quais alimentos interferem na longevidade, para o bem e para o mal. Muitas das descobertas de médicos e nutricionistas fazem sentido e devem ser levadas a sério (alguém duvida que se fartar de frituras faz mal?). Mas há outra variável na equação comida e vida longa, além da qualidade do que se come: a quantidade. Ao que tudo indica, ela é a que mais pesa no resultado da conta que define nosso tempo na Terra.

Os pesquisadores sugeriram que a dieta da fome intermitentepode retardar a morte e o aparecimento de doenças Foto: toeatornot horrace/Creative Commons

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Um estudo feito por geneticistas da Universidade de Medicina de Harvard, divulgado há duas semanas, trouxe de volta à tona a discussão “o quê x o quanto” comer para acrescentar anos de vida saudável, que andava meio esquecida. E de forma um tanto polêmica. Os pesquisadores sugeriram que a dieta da fome intermitente (intermittent fasting, em inglês), na qual se alternam períodos de fartura e de privação alimentar, pode retardar a morte e o aparecimento de doenças.

Aos olhos de médicos e nutricionistas convencionais, o regime, moda entre as celebridades de Hollywood, faz um mal danado à saúde - desregula os mecanismos da fome e pode levar a distúrbios alimentares. Mas, segundo os geneticistas de Harvard, os ganhos superam os riscos. Os participantes da pesquisa que se submeteram à dieta apresentaram diminuição do peso, da pressão arterial, das taxas de glicose e colesterol e do nível de inflamação celular. E mais: o regime aumentou a expressão do gene SIRT 3, que tem um papel importante na proteção celular e na longevidade.

Os 24 homens e mulheres avaliados pelos pesquisadores consumiram 25% do total de calorias recomendadas em um dia e 175% desse total no outro, por dez semanas, No cardápio da “fome” , de aproximadamente 650 calorias, rosbife, batata cozida e suco de laranja, em uma única refeição. O menu “fartura”, com 4.450 calorias tinha bagel com cream cheese, sanduíche de peito de peru, macarrão com frango, iogurte, refrigerante, chocolate e sorvete de creme.

Esta não é a primeira vez que a fome intermitente ganha as manchetes dos jornais científicos. No fim do ano passado, pesquisadores do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos fizeram alarde ao divulgar um estudo sobre a eficácia do método para evitar a diabetes e o câncer.

O paradoxo alimentar intriga os cientistas há um bom tempo. Para uma sobreviver, nosso organismo precisa de comida. No entanto, é a comida que nos mata, aos poucos. Para extrair a energia dos alimentos, o corpo produz substâncias oxidantes, os chamados radicais livres, que contribuem para o envelhecimento celular. Foi a partir desse entendimento que a restrição calórica despontou como a mais efetiva maneira encontrada até hoje de prolongar a vida.

Desde 1930, é fato comprovado que a ingerir 30% menos calorias diminui o ritmo de envelhecimento. Funciona em todas as espécies já submetidas a experimentos nos últimos oito séculos - fungos, moscas, répteis, galinhas, cães e macacos, só para citar algumas. Tudo leva a crer que o Homo Sapiens não fuja à regra.

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Mas há dois problemas com a restrição calórica. O primeiro: são raras as pessoas com força de vontade suficiente para consumir, todos os dias, até o último suspiro, míseras mil e poucas calorias. O segundo: fora do laboratório, onde há um controle rígido das calorias e dos nutrientes oferecidos às cobaias, o comedimento alimentar não tem os mesmos efeitos.

Por esses motivos, a dieta da fome intermitente, muito mais fácil de seguir, tende a ganhar mais adeptos e ainda mais atenção dos cientistas.

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