Menino com deficiência é deixado na escola enquanto colegas vão a passeio

A mãe de João, de 9 anos, relatou o caso no Facebook, que repercutiu e chegou à Secretaria de Educação; ela pede capacitação dos profissionais da área

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Por Ludimila Honorato
Atualização:
João chegou em casa apenas com uma bexiga amarrada na cadeira de rodas, uma 'lembrança' do passeio que ele não foi. Foto: Imagem cedida por Adriane Cruz

Na semana passada, uma mãe de Belo Horizonte relatou pelo Facebook que o filho dela, de 9 anos, foi deixado na escola enquanto a turma tinha ido para o cinema. João, que tem paralisia cerebral e se locomove em cadeira de rodas, ficou das 7h às 11h20 circulando pelos corredores da escola municipal na companhia do cuidador dele, segundo a publicação.

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"No dia 28, eles ligaram, falando que a escola ia ao cinema, mas ia deixar o João porque ele não iria gostar. Eu falei que ele gosta, já foi comigo e podiam levar ele. A escola falou 'tudo bem', mas eles não levaram", contou ao E+ Adriane Cruz, de 41 anos, mãe do menino.

O passeio ocorreu no dia seguinte à ligação. Adriane conta que João chegou em casa todo alegre com um balão verde amarrado na cadeira de rodas, "como prêmio de consolação". Ao descobrir pela responsável do transporte escolar que o filho não tinha ido ao cinema, a mãe diz que ficou arrasada.

Tendo passado por outras duas escolas municipais da cidade, a mãe diz que é a primeira vez que João vive essa situação. Desde maio na instituição atual, ele não é convidado ou levado para nenhum evento, nem mesmo para assistir a alguma apresentação dos colegas. "Neste ano, nem mesmo convidado à festa junina da escola foi. Motivos da escola: porque está frio, porque ele grita, porque levanta a perna, porque não sabem qual será a reação dele", escreveu Adriane na rede social.

Com a repercussão do post (mais de 3 mil compartilhamentos no mesmo dia), o caso chegou à Secretaria de Educação de Belo Horizonte, que organizou uma reunião com a escola de João para o dia seguinte. "Falaram que não levaram porque acharam que ele ficaria nervoso, que ele grita e não iria gostar. Pediram desculpa e disseram que não vão mais fazer isso", conta a mãe.

Porém, Adriane não acredita nas promessas. Presidente da Associação Mães que Informam (AMI), que defende a inclusão escolar, ela conhece outros casos semelhantes ao de João. Na última terça-feira, 5, ela participou de uma audiência pública na Câmara Municipal da cidade cujo tema era inclusão escolar.

"Nessa reunião, eu percebi que o que tem acontecido não são casos pontuais como a Secretaria de Educação fala, são casos permanentes, constantes, diários", disse Adriane. Ela afirma que as audiências públicas têm sido um passo para que as mães possam falar sobre as dificuldades que enfrentam, mas, embora ouvidas, não são respondidas. "É um ouvir só para ser educado, mas não vão fazer nada", lamenta.

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Na publicação no Facebook, Adriane questiona quando os profissionais da educação estarão prontos para incluir. Segundo ela, os professores não recebem a capacitação adequada que o governo deveria oferecer para lidar com estudantes com alguma deficiência. "As mães tem de denunciar toda situação que acontece na escola do filho, mas nós não estamos contra a escola. Queremos que o governo capacite e estamos abertos para ajuda", disse.

"Eu tenho conhecimento da deficiência cognitiva do meu filho e sei que ele não vai aprender como outras crianças, mas pode, sim, participar da escola em outros saberes, que é socialização e conhecimento cultural. Eu levo ele para o cinema, para conhecer os espaços culturais da cidade. Não é impossível de fazer", diz.

E+ entrou em contato com a Secretaria de Educação de Belo Horizonte que, até a publicação desta matéria, não tinha um posicionamento sobre o caso. O comunicado foi enviado somente às 16h41. Confira:

"Em relação ao ocorrido na Escola Municipal Monsenhor João Rodrigues de Oliveira, no bairro São Geraldo, em Belo Horizonte, a Secretaria Municipal de Educação (Smed) informa que, ao tomar conhecimento do fato, na última semana, se comunicou imediatamente com a mãe do aluno e uma reunião foi realizada com a participação da mãe, da direção da escola, dos professores do estudante, da coordenação da escola integrada e da diretora regional de educação para esclarecimento dos fatos e reforço dos preceitos da política de inclusão adotada na Rede Municipal de Educação, de maneira a garantir que esse fato não se repita.

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É importante ressaltar que o ocorrido na escola não reflete as ações adotadas pela Smed em sua política de inclusão. Todas as escolas são orientadas a desenvolver atividades que contemplem a participação dos estudantes com deficiência.

Atualmente, as escolas municipais atendem cerca de cinco mil alunos com deficiência e esses estudantes contam com várias opções de atividades que garantem seu desenvolvimento. Dentre as iniciativas desenvolvidas na inclusão escolar, podemos destacar o acompanhamento dos alunos durante a jornada escolar por monitores de apoio que passam por treinamentos constantes e as salas de Atendimento Educacional Especializado (AEE) que promovem a acessibilidade pedagógica. Na Rede Municipal existem 46 salas de AEE, sendo que outras14 serão entregues até o fim do ano.

Com relação à capacitação dos profissionais da educação, a Smed informa que permanentemente são desenvolvidas ações diversificadas com os educadores como, por exemplo, os cursos de formação, orientações individualizadas por meio de parcerias com associações e institutos, além de seminários. 

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O compromisso da atual gestão com a inclusão está sinalizado na estrutura organizacional da Secretaria. Após a reforma administrativa da Prefeitura, finalizada neste segundo semestre, criou-se na Educação a Diretoria da Educação Inclusiva e Diversidade, que tem alto grau de importância no organograma, e vai fortalecer as ações de inclusão na Rede Municipal. A Smed ressalta, ainda, a importância dos canais de diálogos com as famílias para a construção de uma política educacional inclusiva."

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