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Educação financeira para meninas promove maior liberdade de escolha na vida adulta

Muitas vezes, mulheres abrem mão da gestão dos próprios recursos por questões culturais ou violência psicológica

Por Camila Tuchlinski
Atualização:
Educação financeira para meninas pode ajudar escolhas mais conscientes na vida adulta Foto: Pixabay

As figuras do ‘homem provedor’ e da ‘mulher que cuida da casa’ estão em discussão e não é de hoje. A presença feminina no mercado de trabalho colaborou para o começo do debate. No entanto, algumas crenças antigas permeiam nossa sociedade até os dias de hoje. Alguns exemplos podem estar ao nosso redor. Frases como “Precisa arranjar um marido rico” ou “Você não conseguirá pagar as contas após o divórcio” ainda são comuns. “Quando abordamos o tema violência, encontramos ao lado da física e da psicológica a violência financeira. Muitas vezes as mulheres abrem mão da gestão dos próprios recursos financeiros por uma questão cultural, por falta de interesse, falta de tempo ou porque naturalmente os homens assumem esse papel diante de rotinas femininas tão extenuantes”, avalia a educadora financeira Luciana Ikedo. Para a especialista, é comum que os homens evoluam financeiramente e na carreira, enquanto as mulheres estagnam ou regridem. “E, de repente, a gestão financeira está integralmente nas mãos do marido. E a mulher passa a ter essa crença de que não consegue arcar com os próprios custos de vida sozinha, prendendo-se a relacionamentos que já acabaram por medo da instabilidade financeira”, ressalta. Do ponto de vista psíquico, a educação financeira para meninas desde a primeira infância promove maior liberdade de escolha na vida adulta. “Penso que, para mudarmos, é preciso educar financeiramente as mulheres para fazer com que elas assumam o protagonismo financeiro. Quando tomamos as rédeas de nossas vidas financeiras, naturalmente perdemos o medo de arcar com as próprias contas e percebemos que a liberdade financeira é uma das coisas mais preciosas que podemos almejar”, avalia Luciana Ikedo. Alice, de nove anos, filha da jornalista Fernanda D'avila, tem educação financeira na escola desde cedo. Com o cofrinho, os pais tentam estimular a conscientização. "Ela guarda desde cedo dinheiro para comprar o que quer. Claro que, antes, era mais difícil entender as grandezas de valores, mas agora já entendemais. Tanto que guardou parte das semanadas para gastar nas férias de julho deste ano (damos bem pouco, para ela gastar em besteirinhas mesmo)", conta Fernanda. Em 2019, tudo o que Alice juntar vai para uma instituição de caridade voltada para o cuidado com os idosos.

Alice, filha da jornalista Fernanda D'Ávila, que junta as finanças no cofrinho. Foto: Arquivo pessoal

Por 14 anos, Cristina Sussmann trabalhou em uma instituição bancária. Atualmente, ela é empreendedora na área de calçados. Com três meninas, Adrielly, de nove anos, Daniela, de sete, e a pequena Heloísa, de um ano e quatro meses, Cristina acredita que a noção de independência financeira é importante. “Na escola, elas aprenderam sobre nossa moeda. Ainda não peço para elas irem comprar as coisas, mas como elas têm aquelas notinhas de brinquedo, brincam às vezes com isso. Brincam de restaurante. Aí elas cobram a comida e depois dão o troco. Mas confesso que ainda não conversei profundamente sobre o assunto com elas”, afirma.

As filhas de Cristina Sussman: Adrielly, de nove anos, Daniela, de sete, e Heloísa, de um ano e quatro meses. Foto: Arquivo pessoal

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Por que o ensino de finanças é importante para as meninas?

As mulheres ainda são minoria no mundo dos investimentos, apesar de serem a maioria da população. Uma maneira de contribuir para mudar essa realidade é oferecendo educação financeira para as meninas desde a infância.  “Assim, ao prepararmos nossas meninas para a realidade que enfrentarão quando adultas, teremos mulheres com mais autonomia e consciência financeira. A autonomia financeira nos traz liberdade de escolhas, liberdade para sermos quem quisermos ser e, sobretudo, liberdade de partir quando não nos ajustarmos a determinadas situações ou condições”, analisa Luciana Ikedo.

Educação financeira na infância

Independentemente do gênero, a educação financeira desde a primeira infância pode ajudar o adulto a fazer escolhas mais conscientes, desde a compra de bens materiais duráveis até os itens considerados supérfluos. Algumas escolas tentam adaptar o conteúdo programático para ensinar esses conceitos. “Acreditamos que desde cedo as crianças já se relacionam com o dinheiro como um bem para consumo, seja pelo desejo de adquirir um brinquedo novo, em uma vivência no mercado com os pais, a viagem de férias ou mesmo o lanche na escola em alguns casos”, avalia Bruna Elias, diretora Pedagógica do Colégio Bilíngue Brasil Canadá. A pedagoga afirma que o tema é trabalhado com alunos do 1º ano do ensino fundamental. “Temos um projeto que se relaciona à disciplina de matemática mas, ao mesmo tempo, envolve a alfabetização e a questão de lidar com escolhas. Os alunos finalizam o projeto com a visita ao mercado; cada um faz uma lista de itens necessários para fazer um lanche coletivo, tendo que lidar com um valor médio de dinheiro e fazer escolhas dos ingredientes de acordo com o aporte financeiro que têm. A ideia principal é focar nas discussões e no planejamento que isso envolve”, conta.

Como falar sobre dinheiro com seu filho?

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Conceitos financeiros, quando ensinados desde a infância, promovem hábitos que são aprendidos e desenvolvidos de forma natural. Para a educadora financeira Luciana Ikedo, é possível fazer isso de forma lúdica. “Trazendo os conceitos para a realidade da criança podemos elevar a complexidade do assunto à medida que a criança cresce e introduzindo não somente dinheiro físico, como o bom e velho cofrinho, por exemplo, mas também outros produtos financeiros”, enfatiza. Para Luciana Ikedo, a prática da mesada, dinheiro que os pais dão mensalmente aos filhos, é interessante: “A mesada, que já se mostrou tão importante como ferramenta de aprendizado para a gestão orçamentária, pode ser concedida por meio de um cartão de crédito, com limites bem estabelecidos e respeitados. Devemos estimular que este recurso não somente seja gasto de forma racional e coerente, respeitando as necessidades e não somente os desejos, mas, que também tenha as eventuais sobras investidas em ativos financeiros”. Na opinião da especialista, quando o jovem chegar à idade adulta e tiver acesso à sua renda, a sociedade terá uma nova geração muito mais educada financeiramente, que lidará melhor com os próprios recursos.

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