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Doenças erradicadas podem voltar por falta de vacinação

Índices de imunização para doenças como sarampo e poliomelite estão em queda entre crianças menores de 1 ano

Por Danielle Sanches
Atualização:
Índice de vacinação no Brasil é o maismais baixo dos últimos 16 anos. Foto: Pixabay / whitesession

O número de bebês e crianças vacinadas no Brasil apresentou nova queda em 2017 e atingiu o número mais baixo do País nos últimos 16 anos. Os dados, fornecidos pelo Ministério da Saúde, mostram ainda que todas as vacinas indicadas para crianças com menos de um ano não alcançaram a meta de imunização. 

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Embora os valores deste ano ainda sejam preliminares, a situação já causa preocupação. O índice de crianças que receberam a dose contra a poliomelite, por exemplo, está em 77% - uma queda de 7,5% em relação a 2016 e 21% em comparação ao índice de 2015, último ano em que o número ficou acima dos 80%. 

No caso da vacina quadrupla viral (tetraviral + vz), que protege contra sarampo, caxumba, rubéola, catapora e varicela, o índice está em 70%, uma queda de 8% em relação a 2016. A única vacina que apresentou leve alta no ano passado foi a da Hepatite A - o que se explica, em parte por conta do surto da doença durante o período.

Para Carla Domingues, coordenadora do Programa Nacional de Imunização (PNI) do Ministério da Saúde, esse é um dos problemas: ver a vacina como curativa. “Vemos o aumento da busca pela imunização quando a doença aparece, mas esse cuidado deve ser de prevenção. Não devemos esperar a doença aparecer”, esclarece. 

Reconhecido internacionalmente por sua eficiência, o PNI foi criado em 1973 para organizar o calendário de vacinação, facilitando o controle e a erradicação de doenças que podem ser prevenidas por meio da imunização. É o caso, por exemplo, da poliomelite e do vírus autóctone da rubéola, ambos erradicados no País. 

Para a especialista, outro fator importante para a queda nos índices é justamente o sucesso do PNI desde a sua criação. “O Brasil tinha índices alarmantes de mortalidade infantil antes do programa”, afirma. “A geração atual tem uma saúde adequada porque foi vacinada. Mas, como não conviveu com o medo de doenças, acham que não é necessário manter a prevenção”, acredita. 

O custo disso, no entanto, tem se mostrado alto, já que doenças que estavam controladas em terras brasileiras voltaram a apresentar surtos. É o caso do sarampo, que já tem casos confirmados em Roraima, no Amazonas e no Rio Grande do Sul. 

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Carla acredita ainda que a inserção da mulher - que é a responsável por cuidar dos filhos na maioria dos casos - no mercado de trabalho criou uma nova dinâmica na rotina da família brasileira que não foi acompanhada pelo sistema de saúde. “Os horários para que a mãe leve seu filho para ser vacinado não se encaixam na agenda de quem precisa trabalhar”, diz. 

O problema já vem sendo discutido há algum tempo pelo Ministério da Saúde que, embora reconheça a questão, ainda não prevê uma solução principalmente por entraves financeiros na política do atual governo. “Há uma limitação de recursos”, afirma Carla. 

Criação natural. Muito mais forte nos Estados Unidos e na Europa, os movimentos antivacina também criaram problemas ao incentivar que os pais não levem seus filhos para serem imunizados. Recentemente, a tatuadora e ativista vegana Kat Von D., que está grávida de seu primeiro filho, disse em um post no Instagram que não iria vacinar seu filho por querer criá-lo na filosofia vegana.

No Brasil, embora o movimento ainda seja considerado fraco, há grupos em redes sociais que disseminam informações contra a vacinação e estimulam o debate sobre “os riscos” desse procedimento. 

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Para a infectologista Renata Coutinho, do Hospital Rios D’Or, o ganho com a imunização vai além do individual. “Existe um grande benefício coletivo, pois diminui a circulação dessas doenças na população em que essas crianças convivem”, explica. 

Outros ganhos incluem ainda menores taxas de hospitalização e de sequelas (o sarampo, por exemplo, pode provocar surdez e problemas neurológicos), além de reduzir a abstinência dos pais no trabalho. “Os ganhos acontecem em várias áreas, não só na saúde individual”, reforça a médica. 

A médica respondeu a algumas dúvidas bastante comuns sobre vacinação. Confira:

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As vacinas são 100% seguras? As vacinas têm seus riscos e benefícios, e, neste caso, recomenda-se a comparação entre os riscos da doença e os riscos da vacina. Exemplo, a febre amarela: o risco de ter um evento grave pela vacina é de 1 em 1 milhão de doses; e o risco de ter febre amarela selvagem grave é 10 em 100 casos – e a mortalidade é muito alta. Matematicamente, é incomparável o risco da doença selvagem e o risco da vacina. Assim, a vacina tem indicação e em caso de dúvidas, deve-se consultar o médico.

Existe algum fator que impeça a criança de tomar vacina? Dependendo da vacina, sim. Por exemplo, não devem ser vacinadas crianças que têm comorbidade específica (ocorrência de duas ou mais doenças ao mesmo tempo), imunodeficiência, portadoras de HIV, pacientes que tenham recebido transplante de órgãos ou de medula e indivíduos que sofram com doença renal crônica. Apesar de ser um procedimento seguro, sempre colocamos na balança os riscos e os benefícios. Se o risco da vacina for maior que os benefícios, ela não deve ser aplicada. O médico que acompanha a criança deve ser sempre consultado para uma orientação mais específica e segura.

Para quais reações deve-se ligar o alerta de que algo deu errado? Placas ou pintas no corpo até 24 horas depois a vacinação, convulsão com ou sem febre e alguma dificuldade motora. Nesses casos, a criança deve ser encaminhada ao serviço de emergência e/ou ao médico pediatra o mais rápido possível.

As reações às vacinas são menos prejudiciais se comparadas aos efeitos da doença em uma criança não imunizada? Seguramente. E os pais/responsáveis têm que compreender que algumas doenças são graves e não dependem das condições clínicas das crianças. Ou seja, não é válido o argumento de que crianças saudáveis e bem nutridas estão imunes a doenças e não precisando ser vacinadas. Já tivemos casos em que mães que tinham essa filosofia [de não vacinar] mudaram de ideia uma vez que os filhos estavam na UTI com doenças que poderiam ser evitadas com a vacinação.

Qual o melhor período do dia para vacinar as crianças? Do ponto de vista prático, o ideal seria pela manhã, pois, assim, teria o dia inteiro para observar a criança. De noite, todos estão dormindo. Mas não é um procedimento que exija o acompanhamento dos pais o dia todo, pois, geralmente, as crianças ficam bem.

Criança doente pode tomar vacina? Não é indicado quando a criança está com febre. Em caso de dúvida, recomendamos sempre que o pediatra seja consultado. 

Pode tomar mais de uma vacina em um dia? As que são programadas para serem juntas no calendário não têm interferência. Mas, existem outras com indicação de intervalo mínimo de aplicação, como a tríplice viral e a da febre amarela. Isso tudo é respeitado pelo esquema de vacinação pública, que tenta ao máximo simplificar as vacinações, diminuindo as chances de falha de cobertura e o número de visitas da criança nos postos.

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