Ditados populares: as primeiras fake news da história?

Livro de Monja Coen desmistifica a verdade sobre o que ouvimos ou falamos de geração para geração

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Por Camila Tuchlinski
Atualização:
Mais vale um pássaro na mão do que dois voando? Foto: Pixabay

"Mais vale um pássaro na mão do que dois voando". Você já parou para refletir sobre essa frase? Até que ponto concorda com ela? Os chamados ditados populares funcionam como uma espécie de 'verdade absoluta' e, por vezes, são considerados eternos. Passados de geração para geração, somos capazes de falar de cor a maioria deles: "Cão que ladra não morde", "Para bom entendedor, meia palavra basta", "A ocasião faz o ladrão", etc. Seriam os ditados populares as primeiras fake news da nossa história? No livro Verdade? - Porque nem tudo o que ouvimos ou falamos é verdadeiro, Monja Coen questiona tais 'crenças absolutas' com bom humor e propõe uma releitura delas. "Há tantas expressões que usamos sem nos questionarmos da veracidade do seu significado. Escolhi algumas. Não apenas para as desqualificar, mas requalificar. É adequado usar certas expressões? Será que os jargões que nos acostumamos a usar são capazes de alterar nossas relações internas e externas?", questiona. Em tempos em que os estímulos ligados à tecnologia, conteúdo e atenção são cada vez mais velozes, o ser humano carece de momentos para pensar. Precisa se permitir refletir. "Nossa capacidade de compreender a realidade, de observar em profundidade fica comprometida se não nos questionarmos", afirma Monja Coen. Ao repetir padrões de comportamento, o indivíduo deixa de raciocinar por si. É preciso, mais do que nunca, analisar esses padrões, crenças e verificar se são verdadeiros. Monja Coen conta que o reverendo Yogo Suigan Roshi, que confirmou seus votos monásticos, certa vez recomendou: 'Antes de falar, passe a língua três vezes por toda sua boca e reflita se o que vai falar é verdade, se irá beneficiar a quem ouve e se será capaz de beneficiar todos os seres. Se as três forem assertivas, fale. Caso contrário, se cale'. Separamos alguns ditados populares analisados por Monja Coen no livro. Você pode não concordar mas, como diria a autora, faça uma reflexão profunda sobre eles.

'Verdade? - Porque nem tudo o que ouvimos ou falamos é verdadeiro', novo livro de Monja Coen, da editora Record. Foto: Divulgação/ Grupo Editorial Record

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Quem espera sempre alcança

O verbo 'esperar' significa 'ter esperança em' ou 'não desistir de algo'. Mas também significa 'não agir, não tomar decisões'. Quem espera, realmente, sempre alcança? "Espero, faço, aconteço, provoco, construo - alcanço. Esperar sentado, na cadeira de balanço, no terraço da fazenda...não vai cair do céu. Não vai surgir da terra. Se não plantou e não carpiu, se não planejou, trabalhou e construiu, esperar apenas não faz alcançar", afirma Monja Coen. Ela propõe a substituição dessa máxima por outra, como uma espécie de provocação: 'Quem sabe faz a hora, não espera acontecer'.

Amor de mãe é incondicional

Monja Coen questiona se o amor de todas as mulheres que se tornam mães é incondicional. "Mulheres que foram estupradas, mulheres que não amam ou jamais amaram seus companheiros e engravidaram, mulheres jovens à procura de afeto e carentes de amor, mulheres mais velhas, que se viram forçadas a adotar filhas e filhos de seus maridos - será que todas elas sentem amor incondicional?", pergunta. Para ela, mães são pessoas, seres humanos, com altos e baixos, apegos e aversões. "Conheço mães que abandonam seus filhos para ir atrás de um novo amor. Conheço mães que nunca quiseram amamentar para não perder a beleza dos seios. Conheço mães que batem, machucam, ferem e até matam seus filhos. Elas sentem amor incondicional?", analisa Coen. A Monja convida o leitor a refletir sobre a idealização de amor, que é diferente de muitas realidades. E, consequentemente, tira o peso das costas dessa mulher que, muitas vezes, só quer exercer a maternidade em paz, sem tantas cobranças.

Mais vale um pássaro na mão do que dois voando

Essa máxima é carregada de significados. Em uma reflexão rápida e superficial, poderíamos pensar que é melhor contar com algo que tenha 'em suas mãos' do que não ter nada. No entanto, Monja Coen faz uma outra análise sobre a mesma sentença: "Qual é o pássaro que está em suas mãos? Quais são os dois pássaros voando? Há pais que não querem deixar seus filhos serem quem são. Gostam de mantê-los nas gaiolas de outro, com presentes, alimento, mimos, mas incapazes de pensar e de ser. Nada se iguala à liberdade de ser, pensar, falar e viver - voando livre nos limites de nossos voos pelo azul, vazio de intenções e pleno de possibilidades". Mais valem pássaros nas mãos ou livres e felizes?

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O que os olhos não veem o coração não sente

Esse ditado popular é muito usado nos relacionamentos amorosos. Mas será que namorados e namoradas não sabem quando estão sendo traídos e, se não flagram, não sofrem? "Seres humanos sentem uns aos outros. Nossas atitudes, sentimentos, são transmitidos. Quem estiver atento, verá com os olhos do coração o que os olhos da visão não veem", reflete Monja Coen. Para ela, o coração sente, mesmo que os olhos não vejam. O Pequeno Príncipe já dizia: 'O essencial é invisível aos olhos. Torne visível o essencial'.

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