Conheça Yamara, brasileira que percorreu a América Latina fazendo trabalhos voluntários com um Fusca

Mulher viajou para os EUA com pouco dinheiro; na volta, deu suas roupas para desabrigados em Honduras e doou sangue para feridos de guerra civil na Nicarágua

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Por Caio Nascimento
Atualização:
Sem falar inglês e espanhol, Yamara passou cerca de oito meses numa aventura pela América e diz que os interessados em fazermochilão precisam 'se jogar', mesmo que tenham medo. Foto: Instagram / @yamara__

"Fazia tempo que a rotina de escritório não me agradava, perdi as contas de quantas vezes voltei chorando no transporte público me questionando sobre a vida. Há quem diga que isso é viver, mas isso definitivamente não era para mim".

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Foi com esse desabafo que Yamara Silva, publicitária de família humilde e nascida em Interlagos, na zona sul de São Paulo, decidiu se reinventar. Ela pegou um vôo para Califórnia, nos Estados Unidos, em março deste ano, com pouco dinheiro e sem ter a menor ideia do que lhe esperava. "Saí sem saber o que fazer da vida, com vontade de encontrar o caminho para a felicidade", explica.

Yamara, de 27 anos, chegou a alugar um carro para dormir - por ser mais barato que uma casa -, trabalhou entregando comida, pedia dinheiro na rua e fazia uma refeição por dia no país. "Não lembro ao certo quanto de grana levei. Passei os maiores perrengues da minha vida e agradeço ao McDonald's por oferecer comida a um dólar", brinca. "Jamais imaginei conquistar tantos sonhos em uma única aventura", completa.

Yamara chegou a cortar o cabelo com gilete por não ter 40 dólares para ir ao cabeleireiro. Foto: Instagram / @yamara__

No entanto, o esforço não foi em vão: ela queria conhecer seu ídolo Justin Bieber e comprar um Fusca amarelo para Sandra Regina, sua mãe, de 54 anos, que teve um carro igual roubado quando a jovem ainda era pequena.

Determinada em conhecer o cantor, ela acompanhou a agenda dele, viajou para San Diego e o conheceu em frente a um mercado da cidade, em maio. "Cheguei pertinho e falei logo  'hey Justin, I don't speak english very well meu filho, but I love you muito pu** que pa***, você é fo**', e desse jeitinho nos entendemos", relata. "Ele sorriu e falou que 'tudo bem', perguntou de onde eu era e eu quis berrar 'Brasil, viado. Você acredita?'. Gastei todo meu inglês e mandei um 'inspiration for me viu, you know? You are amazing'. Ele agradeceu o carinho e a gente se abraçou", completa. Veja abaixo o momento.

Quatro meses se passaram e ela comprou um Fusca amarelo conversível de 1972 para sua mãe, após trabalhar muito e conhecer pessoas que a ajudaram. "Às vezes a gente precisa mais de cara e coragem do que de dinheiro, e você vai descobrir que tem muitas oportunidades e muita gente boa nesse mundo", assegura.

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Parecia que a aventura tinha acabado, mas, vendo o apoio financeiro das pessoas que se solidarizaram com ela pelas postagens do Instagram, Yamara foi além e criou a campanha solidária Quilômetros do Bem, em que percorreu a América Latina fazendo trabalhos voluntários em 12 países por dez semanas, de setembro a novembro. "Queria retribuir a ajuda que eu estava recebendo", explica.

Ela ajudou orfanatos, asilos, limpou praias, visitou abrigos de animais abandonados e começou a vender camisetas do projeto para se sustentar. Uma das primeiras instituições que Yamara visitou foi a Naturalia, no México, que promove iniciativas que ajudam a preservar a natureza e proteger animais em perigo de extinção.

"Uma das coisas que disseram foi que a construção do muro na fronteira do país com os EUA rompeu o corredor biológico e atrapalhou a conservação dos animais, prejudicando a fauna e flora local", escreveu em seu perfil no Instagram.

Além disso, ela se solidarizou com vidas em risco de nações em crise. Nicarágua, por exemplo, está em guerra civil e mais de 400 pessoas já foram mortas pela repressão do governo de Daniel Ortega e grupos paramilitares contrários ao regime. Entretanto, isso não intimidou Yamara, que procurou ajudar os feridos do conflito. "Nicarágua é um país incrível, com pessoas maravilhosas. A gente chegou lá e doou sangue por todo o sangue derramado nos últimos meses", afirma.

Em Honduras, a jovem recorda que as fortes chuvas da tempestade tropical Michael deixaram pessoas desabrigadas no país. "Encontramos uma comunidade [Choluteca] que tinha perdido tudo. Eles estavam morando em igrejas e escolas", diz. A miséria fez com que Yamara doasse todas suas roupas aos sem-teto. "As pessoas falam que esses lugares são perigosos, mas chegamos no país e é diferente", completa.

De acordo com Yamara, o mochilão a fez perceber que é possível se virar em qualquer lugar do mundo. "O principal disso tudo é fazer contato, fazer amizade. Não falo inglês nem espanhol. Tudo que aprendi foi falando errado. Está com medo? Vá com medo. Tem pouco dinheiro? Se joga", ressalta. "Você vai trocar trabalho por hospedagem, por comida e não adianta só pesquisar, porque você só descobre como as coisas funcionam quando você se joga", analisa.

Viajante de longas datas, Yamara diz ainda que nunca foi difícil viajar sendo mulher, e se recorda de sua preocupação quando foi para o Marrocos. Ela nasceu sem a mão direita e, no país, pessoas que cometem crimes perdem essa parte do corpo como punição. "Eu cheguei a pensar que sofreria por isso, mas os marroquinos respeitam muito os turistas. Fui bem tratada e não tive problemas, mesmo sendo gay e não tendo a mão. Mulheres, encorajem-se!", conclui.

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*Estagiário sob a supervisão de Charlise Morais