Arte com efeitos colaterais; você já desmaiou ao ver um quadro?

Síndrome de Stendhal faz pessoas passarem mal fisicamente em frente a obras de arte

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Por Luiza Pollo
Atualização:
 Foto: An Rong Xu para o New York Times

Museu do Louvre: dezenas ou centenas de pessoas se amontoam para ver a Mona Lisa. Uma delas desmaia. Pode até ser por causa do calor e da multidão, mas também pode ser um motivo mais raro, a Síndrome de Stendhal.

A Mona Lisa no museu do Louvre, em Paris Foto: Guia Besana para o New York Times

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“O ser humano é uma tríade: mente, corpo e espírito. Nós sempre vivemos de desejos e expectativas. Quanto maiores elas são, maior o impacto quando você os realiza”, afirma Artur Zular, presidente da Associação Brasileira de Medicina Piscossomática, regional São Paulo. Quando a expectativa de ver uma obra importante é grande, o impacto do primeiro contato pode ser enorme. Até um desmaio, por exemplo.

A síndrome foi descrita pela primeira vez pelo escritor francês Marie-Henri Beyle, conhecido pelo pseudônimo Stendhal. Na sua primeira visita à Basílica de Santa Cruz em Florença, na Itália, ele ficou extremamente emocionado ao ver os famosos afrescos de Giotto. 

"Eu caí numa espécie de êxtase, ao pensar na ideia de estar em Florença, próximo aos grandes homens cujos túmulos eu tinha visto. (...) Eu senti palpitações no coração (...). A vida foi sugada de mim. Eu caminhava com medo de cair”, publicou posteriormente no livro Nápoles e Florença: uma viagem de Milão a Reggio.

Basílica de Santa Cruz em Florença, na Itália Foto: Giovanni Ciprian/The New York Times

Zular explica que a reação do corpo a um objeto belo é, sim, real. “Tem gente que fica taquicárdico, tem mal súbito. Algumas pessoas podem ter aumento de pressão arterial, fenômenos visuais, dor de cabeça e até desmaiar. É o corpo reagindo ao momento inebriante.” Nessa hora, são liberados hormônios próprios da emoção, como a adrenalina, a noradrenalina e o cortisol, segundo o médico.

A reação só acontece em quem já tem uma grande expectativa de ver a obra, diz Zular. “Para alguém que não conhece Leonardo da Vinci, a Mona Lisa não diz nada, podem haver 500 mil pinturas mais interessantes. Já alguém que estuda há anos e vai fazer a primeira viagem e vê-la, a expectativa é tão grande e o impacto também deverá ser.”

No centro, 'One: Number 31, 1950' de Jackson Pollock, no MoMA, em Nova York Foto: Fred R. Conrad The New York Times

Mas não se preocupe se você é um apaixonado por arte, o maior fã de Pollock do mundo inteiro e, mesmo assim, não desmaiou ao ver o gigante One: Number 31, 1950 no MoMA, em Nova York. Isso não quer dizer que você conhece ou gosta menos da obra do que outra pessoa. É preciso ter uma predisposição para reagir fisicamente à emoção forte.

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“Se alguém desmaiou porque viu a Mona Lisa, provavelmente vai desmaiar em outras situações. É sim um sinal de alerta para que a pessoa veja que é suscetível. Em outros quadros de adaptação, bons ou ruins, também pode ser que ela tenha os fenômenos físicos”, explica Zular.

Portanto, a Síndrome de Stendhal não deve ser levada como uma ‘prova’ do conhecimento ou da paixão pela arte, mas sim como o que realmente é: uma disfunção. “É um sinal de alerta de que algo não está bem do ponto de vista biopsicossocial. É importante buscar ajuda para se dessensibilizar”, afirma o doutor. “Um médico com olhar psicossomático tem condição de fazer o diagnóstico. Quando o profissional não tem conhecimento, pode achar que não é nada, pois os exames podem mostrar que está tudo bem”.

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