Passado vivo

A casa do antiquário Luiz Cláudio Bez, no Morumbi, comprova que o apreço por peças antigas é capaz de transpor gerações

PUBLICIDADE

Por Roberto Abolafio Jr.
Atualização:

Anjos barrocos da fundição francesa Val d?Osne (século 19) pontuam a passarela que leva até a porta de entrada da casa em estilo inglês, com tijolos aparentes. Essa é apenas uma amostra do que se verá no interior da construção em que mora o antiquário Luiz Cláudio Bez, no Morumbi. A partir do hall, a impressão é de voltar no tempo até épocas glamourosas. "Aqui o moderno não tem vez", brinca ele, que está à frente do tradicional Antiquário Began desde que o pai, Alexandre Bez, morreu há sete anos. Não foi fácil encontrar um novo endereço que comportasse as peças da casa ocupada durante anos pela família na Rua Matias Aires, em Cerqueira César. "Precisava ter um pé-direito alto para caber ao menos esta peça", conta o proprietário, apontando, com visível orgulho, aquele que seria o maior lustre de cristal Baccarat na cor rubi (século 19) existente nas Américas. No hall de entrada, vê-se a exuberância de seus mais de quatro metros. Alguns passos adiante chega-se à sala da lareira, onde chamam a atenção o sofá e as poltronas vitorianas do século 19, arrematados em leilão, e que teriam pertencido ao acervo do estúdio da Metro-Goldwyn-Mayer, sendo usados nas filmagens de E o Vento Levou (récamier, de mesmo estilo e época, custa cerca de R$ 9 mil, na Basile Antiguidades). Se, no filme, Scarlet O?Hara, interpretada pela atriz Vivien Leigh, afirma tirar sua força da terra de Tara, a fazenda da família, pode-se dizer que o clã dos Bez extrai sua energia das peças que arrematam há quase um século, quando a família de origem libanesa aportou por aqui. O negócio teve início por volta de 1908, quando o avô, Nagib Bez, começou a comercializar entre famílias libanesas peças e objetos europeus de famosos ebanistas, bronzeiros e prateiros. Mais tarde, dois de seus filhos assumiram o antiquário e o transferiram para a Rua Barão de Itapetininga, no Centro. Habitar locais onde quase tudo tem história é uma constante para o antiquário de 33 anos, que mora com a mãe, Helena, na casa de dois pavimentos. Do pai Luiz Cláudio também herdou a predileção pelos lustres de cristal. "Quando vejo algum, faço de tudo para comprar", diz ele, que viaja com freqüência ao exterior para garimpar antigas novidades. Algumas aquisições são pessoais, como os candelabros e o lustre de cristal Baccarat, do século 19, expostos na sala da lareira. Sobre o frontão ressaltam a coleção de peças de marfim (estatueta francesa Napoleão, de 1815, estilo e época Império, custa R$ 7.200, na Passado Composto Clássico) e o espelho francês (estilo Luís XVI, de 1880, em madeira folheada a ouro, sai por R$ 17.700 na mesma loja). Um jogo de pinhas emoldura as cortinas e, num canto, destaca-se um vaso de cristal Baccarat do final do século 20 (no antiquário, um similar custa R$ 5.500). Na parede oposta, sob o quadro Festa da Primavera, da Real Academia de Londres, de 1860, um arcaz (grande arca com gavetões, típica de sacristias) com 4 metros de comprimento, de jacarandá-da-baía (reprodução em perobinha-do-campo, com 2,86 m de comprimento, custa cerca de R$ 19.500, na Casa Antigua), expõe o par de ânforas de porcelana de Sèvres, do século 18, e a coleção de 30 vasos Gallé. No hall da escada que leva ao segundo andar, o antiquário criou o que ele chama de "galeria do Segundo Império". Ali estão um imponente brasão, além de quadros com retratos de d. Pedro II e da imperatriz Thereza Cristina, adquiridos no leilão do Paço Imperial. Em meio a tanta história, ele recorda um sonho do seu pai: criar um museu para cada filho administrar, composto por peças que eles jamais venderiam. A idéia povoa os pensamentos do jovem, mas em outros moldes. "Gostaria de fazer algo como a Fundação Maria Luisa e Oscar Americano",diz. Ao contrário do patricarca, Luiz Cláudio explora a locação de peças para eventos. "Pode-se dar um ar palaciano a qualquer ambiente, alugando desde lustres de cristal até mobiliário", conta ele, cuja empresa se encarrega da embalagem, do transporte e da instalação. Outro destaque do Began, administrado com o irmão Alexandre, é a parceria com a Arte São Paulo - Escola de Arte e Profissões em cursos de história da arte, do mobiliário e pintura.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.