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Luxo só nas paredes

O crítico Olívio Tavares de Araújo vive com as coisas que mais ama: obras de arte

Por Fernanda Medeiros
Atualização:

Olívio fala sem parar. Quase sem pausa, cita livros, poemas, histórias de vida, experiências. Talvez seu raciocínio se ordene como as obras que abarrotam as estantes de seu escritório - por assunto. Cineasta e crítico de arte, Olívio Tavares de Araújo atribui sua extrema organização à vida multifuncional. Tem prateleiras inteiras dedicadas à história da arte, música, pintura, além de pastas separadas por ano e artista. "Sei exatamente onde procurar qualquer tema", explica. Nascido em Belo Horizonte, Minas Gerais, tornou-se jornalista e, ao chegar a São Paulo, trabalhou na revista Veja, em 1971. Foi editor de artes plásticas e música até abandonar as redações para se dedicar à curadoria e textos literários - ocasionalmente, porém, escreve para revistas. Hoje, aos 50 e outros tantos anos não confessos, tem no currículo mais de 30 curtas-metragens e 12 livros, como os que abordam a obra de Mozart e Volpi. Morou em Brasília, teve breve passagem pelo Rio de Janeiro e, em 1983, se instalou no apartamento em que vive, em Higienópolis. O prédio é obra de Franz Heep, arquiteto checo que projetou o Edifício Itália. "Ele era baratinho quando vim para cá, agora custa uma fortuna", afirma. A generosa sala tem três ambientes. O estar fica logo na entrada. Ali, caixas que traziam quadros da Coréia (sobras de uma Bienal) servem de mesas de apoio. Já a mesa de centro foi feita com um tampo de granito de 1,5 m de largura (preto absoluto, R$ 736 o m², na Marmoraria Absoluto) colocado sobre pedras. Em volta, três cadeiras mineiras, outras tantas de couro (modelo Brno, a partir de R$ 1.831,50, na Brentwood) e duas Wassilys (na Forma, R$ 2.404 cada uma). Olívio insiste em afirmar que não há luxo algum em sua morada. Mas o que dizer da coleção de Volpis e das peças do mineiro Farnese espalhadas pelas paredes? Claro que a vida atrelada às artes facilitou a coleção, mas a beleza também está presente no mobilário, como as cadeiras Bertoia (R$ 360 cada cópia, na Maria Jovem) próximas a objetos de madeira e de um pedaço de altar - sobra de uma igreja de fazenda. "Um terço do que tenho comprei; o outro ganhei, e o resto foi permuta por trabalhos." Na área da sala jantar, Olívio reúne amigos ao redor da mesa mineira e cadeiras de aço cromado e couro. O espaço foi decorado com escultura de Luiz Hermano, pintura de Amélia de Toledo e, junto da sacada, um vitral adqui- rido em casa de material de demolição. Uma terceira sala ocupa a área de um antigo corredor, derrubado para comportar o piano alemão Feurich (de 1906), presente de uma amiga. Sobre ele, o único Volpi não comprado: "Ganhei do artista", confessa. Fã de Gaudí Em cada peça, uma história que Olívio tem prazer em contar. Ele é nostálgico como um típico mineiro, mas não gosta de doces, nem sabe cozinhar. O que não significa que sua cozinha seja menos nobre. Em frente à porta, por exemplo, há uma tapeçaria de Jacques Douchez, francês radicado no Brasil. No ambiente com azulejos brancos e azuis, panelas penduradas sobre a pia, pratos e quadros. Sobre móveis mineiros, jarros e potes de cerâmica. Completam a mobília a mesa de madeira comprada em loja de móveis usados e cadeiras de metal. No quarto, um entalhe de madeira serve de base para o aparador de vidro com objetos pessoais. Sobre o criado-mudo pende do teto a luminária de papel de arroz comprada na Liberdade (Tsuruya, por R$ 39) e a colcha da mineira Tuninha Borem forra a cama, com pinturas de Sergio Fingerman no lugar da cabeceira. O banheiro é referência a Gaudí. Depois de uma viagem a Barcelona, encantado com o artista catalão, Olívio encomendou à ceramista Stella Ferraz uma parede de cacos de louça. Num oratório, colocou escovas e cremes, enquanto as paredes ganharam a reprodução de uma estatueta egípcia, do Metropolitan Museum de Nova York, e um prato trazido de Lisboa. Os escritórios, montados em dois dos três quartos, misturam espaço para hóspedes com peças pessoais. O cômodo em que Olívio trabalha é um universo à parte: "Tenho aqui tudo o que mais amo - discos, leitura e arte", admite. Assim é Olívio, que faz questão de ser fotografado usando gravata, mas se sente igualmente bem de bermuda e tênis.

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