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Fuga rumo ao bom gosto

Londres e Paris são o máximo em termos de exposições e décor, mas não estamos tão distantes das tendências e modismos

Por PRODUÇÃO: M.Regina Notolini e FOTOS: Divulgação e
Atualização:

Numa manhã de sábado, depois de alguns anos sem ir, baixei em Londres, cidade onde morei por muito tempo, casei, tive filhos, fiz amigos, aprendi sobre usos e costumes, vi despontarem criadores e de onde até do mau tempo percebo que tinha saudades!

 

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Na primeira noite, a ideia foi levar para jantar os amigos que nos hospedavam. Tudo lotado: os clássicos Yvy, Harry’s Bar e Mark’s e também os novos, como o Sketch e o Yauatcha, pois era Valentine no dia seguinte. Acabamos no velho San Lorenzo, em Beauchamp Place, a osteria italiana que fazia sucesso tanto nos anos 60 quanto nos 90, e que, temi, pudesse não ter atravessado bem o milênio. Continuava linda, bem decorada, cheia de gente, a mesma comida gostosa e honesta que, quando se comia ainda muito mal na Inglaterra, só ali era possível comer com gosto.

 

No domingo, fomos almoçar em casa de um casal amigo de muitos anos, Winston e Luce Churchill, ele neto de Winston Churchill e filho da famosa Pamela Harriman e de Randolph Churchill, e ela, belga. Já sabíamos que Winston estava doente, mas não esperávamos encontra-lo tão mal, em verdade, desejando despedir-se. Logo nos demos conta de que seria a última vez que nos veríamos. Usando termos de relatos de guerras, ele nos contou que tinha consciência do avanço do "inimigo", que a batalha de anos contra o câncer estava perdida, mas que tivera tempo de planejar o próprio enterro e os detalhes da cerimônia fúnebre. Me veio à lembrança um conterrâneo seu, o famoso decorador David Hicks, que havia feito o mesmo, escolhido o pano que cobriria o caixão, a música e as flores.

 

Não fazia muito, o casal havia se mudado para uma casa nova. Percebi que minha amiga entrara em fase décor anos 50. Contou que havia vendido em leilão móveis e antiguidades da casa anterior e que se tornara amiga de uma brasileira, Vera, que tinha uma loja com mobiliário modernista. Fez questão de até lá ir para apresentar-me à dona do antiquário.

 

A pequena DASILVA Interiors está instalada em local nobre, no 73 da Elizabeth Street, a mesma rua onde vi lançar-se, nos anos 90, a inglesa Lulu Guiness, hoje uma famosa criadora de bolsas hipercharmosas que tanto sucesso fazem nos Estados Unidos.

 

Vera da Silva resolveu focar no período modernista, confiante de que os ingleses, em geral tão conservadores em matéria de decoração, haverão de sucumbir ao modismo desse retrô. Duas poltronas de John Graz chamam minha atenção. Descubro que Vera as encontrou no Brasil, onde gosta de se abastecer.

 

Circulando. Em matéria de exposições, como sempre, Londres dá de dez. No Victoria &Albert, andei pelas novas galerias de arte medieval. No dia 20 de março seria inaugurada a grande exposição Quilts: 1700-2010, em torno do patchwork. Na Royal Academy of Arts, descobri um novo aspecto de Van Gogh, por meio de cartas e quadros menos conhecidos, em exposição inédita e concorridíssima. Na National Portrait Gallery, que tem desde retratos Tudor até a imagem do nosso DNA, passando pelos artistas contemporâneos que retratam figuras da realeza, da sociedade inglesa e celebridades, vi uma linda exposição de fotografias de Irving Penn. E no Barbican, uma divertida e abrangente exposição dos móveis do designer Ron Arad, arquiteto e artista israelense radicado em Londres. Demais foi, pela segunda vez, visitar a atual Galeria Saatchi, na Kings Road, e rever, em seu subsolo, a fantástica instalação de Richard Wilson, um gigantesco tanque de óleo que, tal qual um espelho escuro, reflete o entorno e ali - pois é outro agora espaço expositivo - reaparece como se fosse uma nova obra. E, ao sair da galeria, o impacto de ver no gramado em frente, contrastando com esse templo vanguardista, os alunos da Hill House, uma antiga escola do bairro, correndo na hora do recreio, vestidos com o calção de veludo vermelho-ferrugem e a suéter mostarda tradicionais.

 

Depois de entrar na loja Farrow & Ball, onde, entre cores históricas para paredes, há umas dez nuances de branco, segui a pé pela Fulham Road até o Lucio’s, para almoçar com dois amigos do mundo do décor: Christophe Gollut, decorador de sucesso, e Min Hogg, a fundadora da bela The World of Interiors, a meu ver ainda a mais bela revista de decoração em circulação no mundo. Min, que há alguns anos deixou o dia a dia da revista para ser uma editora at large, resolveu criar uma linha de tecidos e papéis de parede e trouxe-me um folder com modelos e cores. Uma aventura que será em breve tema na WOL.

 

Em outro jantar, em que o casal anfitrião tem no hall de entrada um busto de George Washington embonecado com chapéus de palha, pude rever outra amiga do universo do décor, Nina Campbell, a mil e contando algumas dificuldades com certos clientes russos, que levam tempo para entender que coisas que não combinam entre si podem ter tudo a ver no conjunto de uma decoração.

 

E voltar ao escritório de Gabhan O’Keeffe e ver as sedas, tapetes, luminárias e móveis que ele e o sócio George Warrington estão criando para seus projetos foi outro prazer. Gabhan estava na Rússia, onde tem inúmeros clientes e uma dacha que comprou recentemente, mas insistiu que eu revisse sua casa londrina sob um novo décor. Num sobrado de vários andares, o salão ganhou pé-direito altíssimo na união de dois deles. E, ali, luminárias de vidro soprado by Gabhan feitas no interior da Inglaterra parecem voar. Caixas de som, mesas laterais, aparadores, tudo é produção própria. E cortinas, luz e som, funcionando à base de um controle remoto que George parecia tirar de letra. Num dos banheiros, couro trançado nas paredes é o suprassumo do chique. E de impressionar mais que qualquer coisa, a cozinha e (ou) sala de jantar no subsolo, onde tudo está mascarado atrás de um lambri clarinho com veios formando desenhos. Sobre a mesa, travessas de vidro soprado prometem comidas tão extraordinárias quanto seu design. É também de Gabhan o décor do restaurante Sketch, um templo em Mayfair que reúne comida, bebida, música e artes visuais, um point supercool.

 

Em Paris, a primeira coisa foi, no Musée Maillol, visitar Vanités, de Caravagio à Damien Hirst, um show de trabalhos das mais variadas origens e períodos em torno do crânio, ou da vanitas, a imagem emblemática da morte.

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No Musée des Arts Decoratifs, que sem falta visito quando vou a Paris, uma exposição do casal Lalanne seria inaugurada em 20 de março, após minha volta ao Brasil. Conformei-me com a bela Animaux, uma bem curada mostra em torno de criações com imagens de animal. Abrange mobiliário, utensílios de mesa, têxteis, brinquedos, joias e material de publicidade que mostram como o animal nunca deixou de ser central na história do homem. Uma amiga acabara de comprar para seu apê em Paris um urso branco de pedra e, em muitas lojas, eram visíveis estampas e pequenas esculturas com imagem de bicho. E, já de volta a São Paulo, numa manhã de domingo, confirmando como estamos antenados em relação a tendências e modismos, dou com o nosso Casa, falando justamente de objetos decorativos onde a figura do animal está presente. Viva! (www.mariaignezbarbosa.com)

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