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Casa inteligente: não é só conectar

Até que uma cozinha possa perceber por conta própria que está suja e se limpar automaticamente, ainda me soa prematuro falar em casa inteligente

Por Marcelo Lima
Atualização:

Tomando por base os cenários preconizados pela ficção científica – do cartoon Os Jetsons, nos anos 1960, até o recente Black Mirror, da Netflix, para ficar apenas nos mais populares – a essas alturas já deveríamos estar circulando por esteiras rolantes de um ambiente para outro da casa. Os desafios, no entanto, provaram ser mais complexos do que os previstos pela imaginação. Ou talvez a tecnologia necessária para viabilizar tais façanhas até exista. Mas não está madura o suficiente para justificar sua adoção em larga escala. 

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A rigor, a estrada rumo a uma maior automação residencial começa no início do século passado, com o surgimento dos eletrodomésticos movidos a eletricidade ou gás, como máquinas de lavar, geladeiras e secadoras de roupa. Já a primeira tecnologia de comando de que se tem notícia data de 1975 e, pouco tempo depois, em 1978, muito antes de Alexa, Siri ou Google Assistant terem sido sequer imaginados, um console de controle para uso doméstico já previa 16 canais de comando. 

Estima-se que, em 2018, nada menos que 45 milhões de dispositivos de automação foram instalados em residências nos Estados Unidos, proporcionando o acionamento remoto de aparelhos eletrônicos e iluminação, além da manutenção das condições de aquecimento e ventilação. Tudo pela internet e, em alguns casos, com dispositivos de vigilância acoplados para monitorar o movimento de pessoas ou animais, bloquear ou permitir o acesso, produzir o travamento ou abertura de portas e detectar vazamentos de fumaça e gás. 

Claro que nenhuma destas conquistas deve ser menosprezada. Principalmente se levarmos em conta o papel que tais recursos tecnológicos podem desempenhar na ampliação da mobilidade e garantia de segurança para grupos populacionais mais vulneráveis, como crianças e idosos. Mas, no caso, é preciso ter claro que ainda estamos falando de automação residencial. E não propriamente, como por vezes nos faz querer crer o mercado, da mítica casa inteligente e autônoma, capaz de antecipar e responder aos nossos desejos, gerando um impacto radical na maneira como vivemos. 

Na verdade, muitos dos sistemas vendidos hoje como inteligentes ainda são, na realidade, mecanismos de acionamento remoto que, em maior ou menor grau, ainda não podem prescindir de nossa participação, ainda que o comando possa partir da nossa voz ou das telas dos nossos smartphones. 

Para cair nas graças dos consumidores, entendo que um produto deve ir além. Deve resolver um problema real e objetivo e, em se tratando de afazeres domésticos, isso geralmente tem a ver com poupar tempo e trabalhar menos. Ou, exemplificando, até que uma cozinha possa perceber por conta própria que está suja e, a partir daí, se limpar automaticamente – por mais estranho que isso possa parecer –, ainda me soa prematuro falar em casa inteligente.

Na grande maioria dos lares, a última revolução realmente significativa se deu com o advento de eletrodomésticos que otimizam operações repetitivas como lavar e secar. Ou, em tempos mais recentes, por meio da difusão de aparelhos eletroeletrônicos, a partir da segunda metade do século passado. A próxima, por certo, ainda está por vir. E se dará quando o cotidiano doméstico se tornar, de fato, automatizado. E isso certamente vai acontecer um dia. Com ou sem internet.

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