Germes da mãe podem ter um importante papel na formação daquilo que somos

A cor dos olhos, dos cabelos, peso e altura - a lista das características passadas de uma geração para a seguinte é longa. Parece um antigo adágio: metade dos nossos genes vem da mãe, metade do pai. Antes mesmo de sabermos o que são genes, compreendemos o princípio básico da hereditariedade graças aos experimentos de Gregos Mendel com ervilhas em meados dos anos 1800. Hoje, 150 anos depois, cientistas da Escola de Medicina da Universidade Washington, em St. Louis, afirmam que a velha aritmética não tem mais sentido.

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Por Amy Ellis Nutt
Atualização:
O DNA de micróbios transportados pela mãe durante a gravidez pode ser transmitido para os filhos Foto: Vinoth Chandar/Creative Commons

Ocorre que o ventre avultado ou a propensão a perder rapidamente o controle podem não ter nada a ver com nossos genes paternos, mas pelo contrário, tudo tem a ver com bactérias maternas. Sim, germes. O DNA de micróbios transportados pela mãe durante a gravidez pode ser transmitido para os filhos, de acordo com estudos publicados em 16 de fevereiro na revista Nature online. "Mantivemos as bactérias de um lado de uma linha separando os fatores que moldam nosso desenvolvimento - o lado ambiental da linha, não a linha genética", disse o coautor do estudo, Herbert W. Virgin, no ScienceDaily. "Mas os resultados mostraram que as bactérias passavam por cima dessa linha. O que sugere que teremos de ampliar substancialmente nossas ideias sobre a contribuição dessas bactérias e talvez as contribuições de outros micro-organismos, para a genética e a hereditariedade". A bactéria, na pele e no intestino, é tão fundamental para a vida humana como o sangue, e a maioria delas é benéfica. Muito menores do que as células humanas, elas também são abundantes. Cada indivíduo tem um número dez vezes maior de bactérias do que células humanas. Como ocorre com frequência na área científica, a descoberta dos cientistas foi motivada por uma pesquisa que não tinha nenhuma relação com o assunto. Virgin, que chefia o departamento de patologia, e Thaddeus Stappenbeck, professor de patologia e imunologia, estavam estudando doenças inflamatórias do intestino, como a colite ulcerativa e a doença de Crohn. Cerca de metade das cobaias testadas tinham baixos níveis de IgA, um anticorpo ligado a doenças do intestino, e metade apresentava altos níveis. Quando procriaram, a prole das mães com baixos níveis do anticorpo também apresentavam baixos níveis. Investigando mais a fundo, os pesquisadores viram que uma pequena bactéria, Sutterela, era provavelmente a responsável pela expansão dos baixos níveis do anticorpo. Em outras palavras, as cobaias não estavam apenas transmitindo apenas o seu próprio DNA, mas também o DNA do germe Sutterella, resultando nos baixos níveis do anticorpo IgA. A curto prazo as implicações para todos os experimentos usando camundongos geneticamente modificados são "profundas", uma vez que este dado explica agora um problema persistente nesses experimentos: a prole dos camundongos que nasce com novas características inexplicáveis. No caso dos humanos as implicações são potencialmente monumentais, embora ainda desconhecidas. Uma notícia promissora: em 2012 os pesquisadores da Mailman School of Public Health da Columbia University reportaram que crianças com autismo e problemas gastrointestinais tinham uma alta concentração de Sutterella em seu intestino.

Tradução de Terezinha Martino

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