Fibromialgia: a difícil trajetória entre a dor e o diagnóstico
Ludimila Honorato - O Estado de S.Paulo
12/05/2019, 10:03
Pacientes relatam descrença na doença e falta de preparo médico para conseguir identificar a enfermidade
Fibromialgia é caracetriza, principalmente, por dores generalizadas e constantes pelo corpo, mas há outras complicações. Foto: rawpixel.com/Pexels
A fibromialgia é uma doença antiga, tendo sido descrita pela primeira vez em torno de 1904. Mas somente nos últimos 30 anos é que ela começou a ser mais estudada e seus mecanismos melhor entendidos. Ainda assim, principalmente por não ter causa definida, muitos pacientes enfrentam uma longa trajetória, acompanhada de dor crônica, até obter o diagnóstico. Entre os motivos estão a descrença na enfermidade e o despreparo médico, e o alerta é reforçado neste 12 de maio, Dia Nacional da Fibromialgia.
A farmacêutica Lívia Teixeira, de 29 anos, conta que sente dores desde criança, com foco nas articulações e coluna. Os médicos diziam que podia ser escoliose, tendinite, dor do crescimento e até começo de tumor ósseo, o que assustou a mãe dela. Nada, porém, se comprovava e ela cresceu sentindo o corpo doer independente de fazer esforço físico.
Após anos sem saber o que tinha, considerando que viver com dor era normal, ela associou seus sintomas a relatos de pacientes com os quais teve contato por meio de seu trabalho em uma empresa que produzia medicamentos para fibromialgia. "Comecei a me identificar, estudar fibromialgia e decidi que era isso que eu tinha, mas precisa de um médico para me auxiliar", relata.
Ela se consultou com reumatologista, fisiatra, neurologista, ortopedista e gastroenterologista, mas ninguém confirmou o que tinha. O autodiagnóstico de Lívia, que tem experiência na área da saúde e está se especializando em dor crônica, veio em 2013 e foi apoiado por um ortopedista da empresa onde trabalhava. Desde então, ela tem se aprofundado cada vez mais no tema e criou o programa De Bem Com a Fibro para ajudar pacientes a lidar de forma mais positiva com a doença.
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Fibromialgia: a difícil trajetória entre a dor e o diagnóstico
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Coluna e membros inferiores sobrecarregados
"As partes do corpo mais afetadas após uma longa jornada dentro de um carro são, principalmente, a coluna (cervical, torácia e lombar) e, também, membros inferiores (joelhos e pés)", afirma o médico. Isso se deve, segundo ele, à postura que se adota dentro de um veículo, com o banco mais inclinado e as pernas mais distantes dos pedais. "Quando fazemos isso, achamos que estamos dando um descanso para o corpo, mas, na verdade, só estamos sobrecarregando as nossas articulações e tensionando os músculos", completa.
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O que fazer para diminuir ou evitar as dores?
Antes de tudo, é importante ajustar o banco e a distância com o volante para que a postura não mude bruscamente. Depois disso, é recomendado encontrar uma posição confortável, mas que não seja relaxada nem muito inclinada - o ideal é que toda a coluna esteja em contato com o apoio do banco. Atividade física também é importante: faça alongamentos diários que priorizem grupos musculares posteriores das pernas.
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Pilates pode ajudar
Visando à melhora da flexibilidade, força muscular e respiração, o especialista diz que, após algumas sessões de pilates, os desconfortos decorrente do tempo preso no trânsito deixam de existir. "Conheço muitas pessoas que iniciaram a prática após apresentarem dor por passarem o dia no trânsito", conta ele. "O pilates é ótimo para adquirir consciência corporal."
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Doenças e lesões
A lesão mais comum entre os motoristas, de acordo com Gonçalves, é a lombalgia, quadro de dor intensa na região lombar. Causada por pressão nas vértebras ou mesmo uma tensão muscular, pode se agravar caso não tratada. Como os joelhos também são muito exigidos e ficam flexionados a maior parte do tempo, tendinite patelar ou do tendão calcâneo também são frequentes.
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Pressa não interessa, descanse.
"Seja com uma boa noite de sono ou uma simples pausa durante o dia, descansar é importante", diz o médico. Não importa se está com pressa: assim que sentir cansaço, recomenda Gonçalves, o motorista deve encostar o carro, realizar alongamentos e beber água, só para, posteriormente, retomar as atividades. "Além de fazer bem para o organismo, um corpo saudável e sem tensões tem condições maiores de escapar das adversidades do trânsito, como acidentes", observa.
Foto: SplitShire/Pixabay
Diagnóstico de fibromialgia
O especialista em fibromialgia e dor José Roberto Provenza, presidente da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), afirma que essa doença é de difícil diagnóstico. Embora a enfermidade seja caracterizada por dor generalizada, nem sempre sentir o corpo todo dolorido significa fibromialgia. "É preciso verificar quais doenças se parecem com a fibro e eliminá-las, como hipo e hipertireoidismo, diabete, doenças inflamatórias musculares e neurológicas", diz o médico.
Exames como ultrassom, ressonância, de sangue e tomografia geralmente são solicitados para descartar problemas semelhantes à fibromialgia. Além disso, para o diagnóstico correto, deve-se examinar bem a história do paciente e a presença de fatores complementares. A doença costuma estar acompanhada de distúrbios do sono, dor de cabeça e constipação, por exemplo.
Provenza afirma que a maioria dos médicos não tem paciência para atender pessoas com múltiplas queixas, que é o caso da fibromialgia. Isso também justifica a dificuldade de conseguir um diagnóstico. Lívia percebe que os especialistas que ela consultou não quiseram se comprometer com a condição dela. "Eu entendia mais de fibro do que eles. Me encaminhavam para outros médicos e não entendiam, não sabiam que o diagnóstico é clínico."
O que se sabe sobre as causas da fibromialgia
O presidente da SBR diz que, com base nos estudos sobre fibromialgia dos últimos 30 anos, entendeu-se que a doença tem um componente emocional. Porém, mais do que isso, trata-se de uma enfermidade física em que existem importantes alterações no sistema nervoso central (SNC) ligadas aos níveis de percepção da dor.
"Na fibro, o paciente tem tanto distúrbio central como de percepção da dor no nível periférico, por meio de sensores na pele, nas articulações que se comunicam com os neurônios no sistema nervoso central", explica Provenza. Essa comunicação se dá por neurotransmissores, substâncias que facilitam ou inibem a dor. Ocorre que, devido às alterações no SNC, essa ligação sofre impacto e as dores passam a ser generalizadas e constantes.
Segundo o especialista, alguns estudos apontam uma tendência de marcadores genéticos na fibromialgia. Além disso, uma queixa comum na maioria dos pacientes é a vivência de estresses, o que pode desencadear a doença em qualquer fase da vida ou agravar as crises de dor.
A jornalista Nathalia Molina, de 48 anos, tem diagnóstico de fibromialgia há seis e recorda que também considerava normal sentir dores constantemente. Atualmente, ela diz entender que a crise ocorrida em 2012 foi motivada por "várias situações traumáticas e pessoais" que ocorreram em sua vida desde 2006. Além do estresse no trabalho, ela teve duas perdas gestacionais seguidas.
VEJA TAMBÉM: Seis dicas e cuidados sobre exercícios físicos durante a gestação
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Confira seis dicas e cuidados sobre exercícios físicos durante a gestação
Exercícios físicos na gravidez trazem muitos benefícios para a saúde e o bem-estar das futuras mamães. Porém, tanto as mulheres que não praticavam exercícios quanto as que já eram atletas antes de engravidar precisam seguir algumas observações. O E+ conversou com Sílvia Gomyde Casseb, ginecologista, obstetra e médica do esporte do Hospital e Maternidade São Luiz Itaim, para tirar dúvidas e esclarecer alguns pontos sobre o assunto:
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Consulte um médico obstetra para descartar contraindicações
A grande maioria das mulheres pode praticar exercícios físicos na gravidez. Contudo, existem certas contraindicações, doenças e patologias que impossibilitam a atividade física. "O obstetra tem sempre que ser consultado para descartar condições mais graves, raras, da própria gravidez. Já um médico do esporte pode orientar melhor quanto à prática dos exercícios porque ele pode dimensionar o condicionamento da paciente", explicou Sílvia. Mulheres que já possuam problemas cardíacos ou respiratórios também devem consultar um especialista.
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Cuidados gerais
"Hidratação é o ponto mais importante: precisa beber água o tempo todo. Outra recomendação é não fazer exercício em jejum. Se for um lugar fechado, o ambiente não pode ter a temperatura muito alta e deve ser bastante ventilado. No caso de um local aberto, a indicação é usar roupa leve e evitar os horários mais quentes", enumerou a especialista.
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Sinais de alerta
As gestantes devem ficar atentas a algumas situações: sangramento, tontura ou cansaço desproporcional. "Caso tenha observado alguma delas, a gestante deve interromper os exercícios físicos e procurar assistência médica imediatamente", aconselhou Sílvia.
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Até que fase da gestação a prática de atividade física é permitida
Sílvia afirmou que os exercícios físicos podem ser praticados até o dia do parto. "A grávida precisa ser avaliada levando em conta todo o histórico de exercício físico e de condicionamento. Se o exercício for bem prescrito no começo, é possível manter até o final. Às vezes, existe uma questão de conforto para a mãe, mas não de risco para o bebê. Os exercícios na água são muito confortáveis no fim da gravidez, por exemplo", disse.
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Modalidades mais indicadas
De forma geral, a médica explicou que exercícios mais seguros são a caminhada e as modalidades na água como, por exemplo, hidroginástica e natação. A musculação também é segura e serve para o fortalecimento dos músculos. Já o pilates é recomendado até para quem nunca havia praticado antes.
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Benefícios para a saúde
Entre os benefícios para a gestante estão a prevenção de doenças cardiovasculares como, por exemplo, pressão alta, enfarte e derrame. Também ajuda no controle do peso e do diabete gestacional. "As mulheres que fazem exercício melhoram a oxigenação para o feto, a qualidade do sono delas e até as dores nas costas, porque todos os músculos estão fortalecidos. Além disso, ajuda na recuperação do pós-parto, que será menos dolorido", falou Sílvia.
Foto: Pixabay / @tasha
Depois de muitas idas ao pronto-socorro, Nathalia resolveu se consultar com um ortopedista. "Ele fez várias perguntas que, para mim, não tinham nada a ver. Mas ele estava fazendo as perguntas que o exame clínico faz para entender síndrome", diz. Após um mês de tratamento com remédio, ela voltou a ter crise e foi orientada a procurar um reumatologista.
"Ele me disse: 'tem gente que acha que existe e tem gente que acredita que não existe'. Ele disse que eu era sedentária, que precisava emagrecer e fazer exercício físico. Fui embora e fiquei de cama", conta a jornalista. Em março de 2013, ela conseguiu obter o diagnóstico correto com outro reumatologista.
Apoio é fundamental no tratamento
Fazer exercícios físicos de forma leve é uma das indicações para tratar a fibromialgia, mesmo que a pessoa comece com cinco minutos de caminhada por dia. Alguns medicamentos, como antidepressivos que atuam na dor e outros que melhoram a qualidade do sono, também são prescritos. Mas uma parte fundamental do tratamento é o apoio emocional e psicológico.
"Na maioria dos pacientes, os familiares começam a não acreditar nas queixas, porque são contínuas e frequentes. A gente tem de mostrar que a doença física existe junto com uma alteração do comportamento e do humor", diz Provenza. A farmacêutica Lívia tem investido em terapia emocional, autoconhecimento e tem o suporte da família.
Nathalia conta, principalmente, com o apoio do marido, que por "sorte" acredita que fibromialgia existe e divide com ela as tarefas domésticas. O filho dela, hoje com dez anos — "ele era mais pesado para mim com três do que agora" —, também compreende a condição. "Passei o primeiro ano de vida dele só com ele. Era prazeroso para mim e acho que compensava possíveis estresses", lembra.
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