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Diagnóstico de asma grave demora, em média, 4 anos, indica pesquisa

Falta de informação, dificuldade para chegar ao especialista e tipo de rede de saúde são alguns fatores para descoberta tardia

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Por Ludimila Honorato
Atualização:
Estima-se que haja 20 milhões de pessoas no Brasil convivendo com algum nível de asma. Foto: Kim Kyung-Hoon/Reuters

A asma é uma doença crônica das vias aéreas que, estima-se, acomete 20 milhões de brasileiros, entre crianças e adultos. Desse total, de 1% a 2% são pessoas que apresentam o nível grave e entre 5% e 10% têm um tratamento difícil que vai precisar de um centro de referência para acompanhamento. A situação poderia ser diferente caso o diagnóstico fosse precoce, mas, entre o início dos sintomas e a descoberta da enfermidade, são quatro anos de jornada, em média.

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A estimativa é da pesquisa inédita A Voz do Paciente, feita pela Ipsos a pedido da Casa Hunter, que englobou 200 pessoas com asma grave, entre 4 e 64 anos de idade, de todas as regiões do Brasil. Pai ou mãe dos menores de idade e dos jovens de 18 a 23 anos responderam pelo filhos.

Os resultados mostraram que os adultos levam, em média, quatro anos entre os primeiros sintomas e o diagnóstico de asma enquanto as crianças demoram um ano. Ambos os grupos chegam a ter, em média, sete crises no período. A doença é caracterizada por chiado no peito, falta de ar ou dificuldade para respirar, sensação de aperto no peito e tosse.

Do total de entrevistados, 69% buscou atendimento médico no pronto socorro ao sentir os primeiros sinais, onde recebeu encaminhamento para um especialista. E embora apenas 7% não tenha buscado qualquer atendimento de início, 86% deles procuraram somente quando os sintomas pioraram.

O pneumologista Alvaro Cruz, diretor executivo da Fundação ProAr, em Salvador, diz que a asma não começa grave. Por isso, seria fundamental ter um diagnóstico precoce para evitar a piora da doença. "Normalmente, começa mais leve e vêm as crises (exacerbações). De crise em crise, a tendência é ir agravando progressivamente", explica. "Tudo o que se deve fazer é prevenir uma crise, que tem risco à vida."

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Segundo o especialista, a maioria das pessoas que morrem em decorrência de complicações da asma são aquelas com quadro moderado ou leve que vão tendo crises seguidas sem tratamento. “No ProAr, as pessoas estão melhor controladas - porque têm medicação - do que quem não tem asma grave e segue sem acompanhamento regular e mais necessidade de atendimento de emergência”, afirma Cruz. A pesquisa da Ipsos mostrou que, das pessoas que não buscaram auxílio ao terem os primeiros sintomas, 7% recorreu ao médico quando teve uma parada respiratória durante um exame.

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Demora para o diagnóstico de asma

Raissa Cipriano, presidente da Associação Brasileira de Asma Grave, tem uma filha de sete anos diagnosticada com asma grave. A menina nasceu saudável, mas logo nos primeiros meses de vida deu sinais do que se conhece por 'bebê chiador'. A síndrome é caracterizada por um contínuo chiado no peito, mas na época a mãe não entendia bem o que isso significava. Ainda nessa fase, a pequena Giovanna teve crises virais, sendo que o chiado durou até os dois anos.

"Quando eu ia ao pronto socorro, só ouvia do médico para avisar [nas próximas vezes] que ela era bebê chiador. Eles tinham uma conduta diferente, que era inalação com broncodilatador. Mal sabia que ali já era asmática", conta. Os anos sem um diagnóstico provocou alta sensibilidade no pulmão de Giovanna, até que ela teve uma crise grave após contrair um adenovírus.

Na maioria dos casos, a infecção viral causa sintomas leves, mas como a garota já tinha as vias respiratórias debilitadas, a reação foi mais grave. Dos 31 dias que precisou ficar internada em uma unidade de terapia intensiva (UTI), sete foram com entubação. Foi nesse momento que as duas tiveram o primeiro contato com um pneumologista e receberam o diagnóstico de asma.

Raissa Cipriano com a filha Giovanna, de sete anos, que foi diagnosticada com asma grave. Foto: Cedida por Raissa Cipriano

A falta de informação e o direcionamento tardio para um especialista são alguns dos fatores apontados por Raissa para a demora em atestar a doença na filha. A hospitalização trouxe mais agravos ao pulmão da menina, que desenvolveu fibrose e, dois anos e meio após a crise, ainda sofria com baixa oxigenação crônica.

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O pneumologista do ProAr explica que o diagnóstico de asma em crianças abaixo dos cinco anos é muito difícil mesmo, principalmente porque é complicado realizar com elas o exame que mede o volume e o fluxo de ar nos pulmões. Para isso, é preciso assoprar em um aparelho. "Mas não é impossível, pode fazer o diagnóstico com outros critérios", afirma. Episódios de chiado no peito que não se repetem podem descartar asma nas primeiras vezes, mas se for frequente e acompanhado de falta de ar, o alerta é acionado.

Alvaro Cruz diz que um grande problema para a demora no diagnóstico é que o profissional de saúde que atende emergência no pronto socorro geralmente não recomenda que se procure um especialista ou outro médico para fazer acompanhamento. E mesmo que a indicação seja feita, nem sempre o paciente procura, ou porque acha que não é importante, visto que os sintomas ainda são leves, ou porque não tem acesso, o que é mais frequente no sistema público de saúde.

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O médico destaca, ainda, que dificilmente se pode confirmar o diagnóstico de asma no momento inicial dos sintomas, que são uma novidade para a pessoa, família e profissionais de saúde que o costumam atender. "É pela recorrência do problema que a gente vai tendo segurança no diagnóstico", diz. Mas serão necessárias visitas frequentes à emergência até que um especialista avalie o caso.

O impacto causado no tempo de diagnóstico pela diferença da rede de atendimento é apontado pela pesquisa. No pronto socorro, 37% das pessoas com sintomas receberam encaminhamento para um especialista, 32% foram liberadas para voltar para casa e 16% realizaram exame e foram diagnosticadas com asma. Dos que foram ao consultório ou ambulatório, 60% teve exame laboratorial solicitado pelo médico, 32% recebeu prescrição de medicamento para os sintomas e 4% foi identificado com asma já na consulta.

Os impactos da asma grave na vida social

Além do diagnóstico tardio, que vai levar a um sofrimento prolongado com sintomas e crises de asma, 14% das pessoas que responderam à pesquisa disseram que a doença interfere totalmente no convívio social enquanto 58% afirmaram que interfere em nada. Mas 52% delas deixaram de fazer atividade física e 23% deixou de trabalhar por causa da enfermidade.

A Giovanna, filha da Raissa, teve parte da infância comprometida porque, com os agravos no pulmão, a baixa oxigenação a impedia de brincar, correr e até mesmo rir ou caminhar de um cômodo a outro da casa era desgastante. Nessa fase, a mãe descobriu que outras medidas faziam parte do tratamento além das medicações, como eliminar fontes alérgicas dentro de casa, porque qualquer irritação pulmonar poderia desencadear uma crise. Evitar cortinas, pelúcias e trocar fronhas e lençóis com mais frequência passaram a ser rotina.

Alvaro Cruz afirma que, com esses cuidados e medicamento adequado, é possível viver normalmente na maioria dos casos, desde que haja também um acompanhamento de um especialista em quadros graves de asma. De modo geral, a doença traz uma hipersensibilidade das vias aéreas e qualquer coisa pode desencadear sintomas.

“Falta de capacidade de fazer atividade física, caminhar, subir ladeira para ir ao trabalho… A pessoa pode ter limitações decorrentes da asma”, diz o médico. Mas ele reforça que, com tratamento adequado, é possível tolerar essas ‘barreiras’. Mais do que isso, é importante estar atento aos sinais da asma, se informar e detectá-la o quanto antes.

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