Após maternidade, bailarina volta à ativa

A primeira bailarina do Balé da Cidade de Nova York enfrenta uma lesão crônica no tornozelo, além dos habituais problemas físicos - músculos enfraquecidos, menos resistência e perda de força

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Por Gia Kourlas
Atualização:
Maria Kowroski está de volta para a temporada de primavera do balé nova-iorquino Foto: Nicole Bengiveno/The New York Times

No mundo do balé, gravidez não é mais um segredo que a bailarina tem que esconder do chefe. Já não é uma ameaça de fim de carreira. Porém, uma pergunta permanece: o quanto é difícil sair de uma gravidez e voltar a ser bailarina?

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A experiência é diferente para cada uma, mas no caso de Maria Kowroski, a escultural primeira bailarina do Balé da Cidade de Nova York, foi difícil. Maria, que teve um filho com o marido, o ator e ex-bailarino Martin Harvey, em novembro, enfrenta uma lesão crônica no tornozelo, além dos habituais problemas físicos - músculos enfraquecidos, menos resistência e perda de força.

"Depois que dei à luz, não fiz nada durante um mês e meio e me senti literalmente como um mingau", disse Maria, que ganhou 16 quilos durante a gravidez e se exercitou na barra de balé até algumas semanas antes da data prevista para o parto. "Nunca havia sentido minhas pernas assim."

Maria faz aulas de Gyrotonicpara voltar à forma Foto: Nicole Bengiveno/The New York Times

Ela ainda está trabalhando na confiança para voltar a dançaren pointe, (o que provavelmente acontecerá quando a companhia se apresentar em Paris, no final de junho) mas, para Maria, cuja apresentação de retorno ocorreu no dia 10 de maio com "Vienna Waltzes", de George Balanchine, há uma questão nova: a força emocional de seu filho, Dylan, que a fez se questionar se de fato quer voltar a dançar.

Começando no início de fevereiro, segui seu progresso entre aulas de balé e sessões privadas de Gyrotonic até seu retorno aos palcos. Seu trabalho está longe de ter acabado. "Não tenho medo de não conseguir me apresentar tão bem. Talvez minhas pernas não subam tão alto. Talvez eu pareça mais velha. Também quero trazer algo novo para tudo. Eu me sinto uma pessoa diferente. Sou uma pessoa diferente. Sou mãe."

Maria volta às aulas com sua antiga professora, na Steps on Broadway Foto: Nicole Bengiveno/The New York Times

11 de fevereiro: Olhos grandes, mãos grandes, pés grandes. Maria começou lentamente levantando os pés em releve e se examinado no espelho no Ballet Arts, mordendo o lábio quando não conseguia manter o equilíbrio. Depois, no Studio Spiratis, no Gyrotonic (sistema para reequilibrar e realinhar o corpo), Emily Smith, sua instrutora, perguntou o que ela havia feito na aula daquela manhã. "Fiz o centro", disse Maria, referindo-se ao adágio. "Muito mal."

Tudo é mais difícil quando se é tão alta quanto Maria, que, com 1,80 m, é solta e flexível - o que pode ser um problema para manter a força. "Agora estou realmente percebendo como minhas pernas são compridas, porque parecem pesadas. Coloquei as sapatilhas de ponta e pensei: 'Ai, meu Deus, sou tão alta! O chão fica lá longe'."

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16 de março: Maria espera usar seu tempo fora do palco para reabilitar o tornozelo direito, que já a incomodava muito antes da gravidez. Ele está mais forte, mas mesmo assim ela tem dificuldade. Depois de uma aula com o professor de longa data, Wilhelm Burmann, no Steps on Broadway, Maria retornou ao teatro para praticar o en Pointe sozinha, quando ouviu um estalo. A principio, achou que pudesse ter encaixado o tornozelo no lugar certo - pois parecia enferrujado - mas então, ele começou a inchar. Em vez de entrar em pânico, ela encarou o fato com calma. "Acho que a diferença é a minha mentalidade de ser uma bailarina mais velha. Não quis me desesperar."

8 de abril: Após cerca de três dias, o tornozelo parou de doer. Em seu apartamento, como Dylan brincando ao lado, Maria disse: "Contanto que não haja qualquer outro imprevisto, estarei bem. Sinto que minha força está voltando. Pus a sapatilha de ponta na aula e pulei um pouco. Pular é difícil. Não é meu forte. Não sou uma Ashley Bouder".

Ashley, companheira do Balé da Cidade que recentemente teve uma menina, postou vídeos seus fazendo fouettés durante a gravidez. Ela é a atleta olímpica das bailarinas. Porém, quando Maria se apresentou durante a gravidez, o que ocorreu até o quarto mês, algo mais misterioso aconteceu: a tensão se desfez quando dançou com força e controle, mas também totalmente livre. "Havia algo de muito incrível em dançar grávida. Foi bom que no início ninguém soubesse, porque eu tinha um segredinho só meu; estava dançando com um bebê crescendo dentro de mim."

E esse sentimento de transformação continuou mesmo depois que deu a notícia a todos. "Eu me sentia como se não pudesse fazer nada errado. Pode soar estranho, mas parecia que havia um brilho dentro de mim."

Maria se aquecendo Foto: Nicole Bengiveno/The New York Times

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27 de abril: Maria sentiu uma fisgada no tornozelo em meados de abril; no final do mês, retornou à aula rigorosa de Burmann. "Ela está quase lá. Está preparada fisicamente, mas será que também mentalmente?", disse ele. Mas logo que o problema aconteceu novamente, Maria decidiu fazer uma ressonância magnética. Desde que operou o pé, em 1996, para remover um osso, sofre muitas torções e agora tem ligamentos soltos. A lesão a perseguiu por anos e ela queria saber o que estava ocorrendo.

10 de maio: Na noite de seu retorno, Maria ainda não tinha visto os resultados da ressonância, mesmo eles já estando disponíveis. "Ficar sabendo antes de subir ao palco? Não acho que seja uma ideia muito inteligente."

Mesmo assim, estava de bom humor. (Ela logo ficaria sabendo que o exame revelou apenas danos na cartilagem; a cirurgia não era necessária.) Sentada em frente ao espelho do camarim no Teatro David H. Koch, Maria riu de sua imagem. "O rabo de cavalo é uma plástica facial instantânea. Uau, pareço mais jovem."

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Nos bastidores, após a apresentação: "Estou muito emotiva. Todas as sensações me inundaram de novo", ela disse, abanando os olhos.

Maria em sua primeira apresentação depois de se tornar mãe Foto: Nicole Bengiveno/The New York Times

11 de maio: a manhã seguinte. Em "Gold und Silber Walzer", o movimento final de "Vienna Waltzes", a bailarina cruza o palco lentamente em um longo vestido branco. Quando Maria pisou no palco, passou uma imagem frágil e vulnerável. Ela também sentiu isso. "Estava escuro. Não acreditava que estava ali sozinha, que fazia aquilo para viver e que havia pessoas me assistindo. Às vezes, isso me pega."

Mais tarde, continuou: "Dancei minha vida toda, mas foi muito estranho. Não me vi como uma bailarina. Senti que estava voltando para casa, mas ao mesmo tempo me senti muito diferente. Nem sei por que fiquei emocionada. Não sabia o que vinha de dentro de mim".

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