Amamentação: mães relatam dificuldades no processo de aleitamento

Parto prematuro, falta de informação e aspectos emocionais podem impedir oferta adequada de leite materno aos bebês

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Por Ludimila Honorato
Atualização:
Depois de não conseguir amamentar o primogênito Eduardo, Willana se informou mais e pôde oferecer o próprio leite para a filha Ana Carolina. Foto: Cedida por Fabiana Leite Graciano

A amamentação pode ser considerada um desafio do puerpério, porque geralmente não é um processo fácil, inato e natural. Embora pareça simples, e em alguns casos possa ser, o bebê precisa aprender a mamar corretamente e a mulher tem de aprender a ofertar o seio adequadamente. Em torno disso, existe muito preparo para que o aleitamento materno seja eficiente e as dificuldades na amamentação sejam as menores possíveis.

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O Agosto Dourado, mês de incentivo à amamentação, tem o objetivo de ampliar a conscientização sobre a importância desse ato, mas para algumas mulheres, a falta de conhecimento e um parto prematuro, por exemplo, causam surpresa quando se fala em amamentar, o que dificulta o processo.

A engenheira Tissiane Cristine Mantoani Biassi, de 31 anos, deu à luz gêmeos em 22 de junho e desde o início da gravidez foi alertada pela médica que uma gestação gemelar tinha um pouco mais de risco, com uma possível antecipação do parto. Ela não sabia, porém, que isso poderia impedi-la de alimentar os filhos logo após o nascimento deles.

> Perguntas e respostas sobre dificuldades na produção de leite materno

Joaquim e Vicente nasceram com 30 semanas, às 19h de uma segunda-feira, e foram direto para a incubadora da UTI neonatal, pois precisavam de oxigênio. A mãe só pôde ver os recém-nascidos no dia seguinte, quando foi avisada de que não poderia amamentá-los porque eles eram muito pequenos, sem força para pegar o peito. "Eu não sabia (sobre a amamentação). Nem tinha passado pela minha cabeça que podia ter algum impacto", contou Tissiane sobre a prematuridade dos bebês.

Ao falar sobre como se sentiu por não poder amamentar os filhos nesse primeiro momento, ela se emociona. "Antes de ter essa conexão com eles, eu não fazia ideia de como eu ia ficar. Até então, falavam que era um momento muito importante, mas eu não fazia ideia de que ia ficar tão balançada. Quando você olha os filhos que você não vai poder amamentar, pegar no colo, é muito triste", disse.

Tissiane engravidou dos gêmeos Joaquim e Vicente, que nasceram prematuros e não puderem ser amamentados nas primeiras semanas de vida. Foto: Arquivo pessoal

O que confortou o coração de Tissiane foi saber que os bebês receberiam o leite materno de outras mulheres, que doaram o alimento para o banco de leite humano do Hospital e Maternidade Santa Joana, onde os pequenos nasceram. Enquanto isso, ela foi instruída pela equipe a estimular a produção de leite nas próprias mamas, cuja quantidade ainda era insuficiente para o que os filhos precisavam.

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"O banco de leite faz toda diferença na vida dos bebês prematuros, que nascem antes do tempo e, com isso, têm certa imaturidade gastrointestinal. O leite que eles melhor toleram é o humano, daí a importância. Você consegue salvar muitas vidas, modela a flora bacteriana de forma adequada, colabora para o bebê ter menos infecções gastrointestinais, patologias específicas da prematuridade e ajuda no sistema nervoso central. É indiscutível o impacto do uso dos bancos de leite na nutrição dos prematuros", diz Clery Bernardi Gallacci, coordenadora dos berçários setoriais do Santa Joana.

A especialista explica que é importante para as mães com bebês em UTI estimular o seio com bombas de sucção, por exemplo. Alguns medicamentos podem ser utilizados para ajudar na produção de leite materno, mas devem ser avaliados de acordo com o caso junto com o médico. "Existe o leite imaturo da mãe que teve parto prematuramente, ela vai se adequando enquanto o bebê vai crescendo. Assim que a mãe tiver condições, é importante fazer extração (do leite)", explica Clery.

A Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano tem cadastrados em sua base 222 bancos de leite e 211 postos de coleta de leite humano em todo o País. Veja aqui a localização deles por região. A doação de leite materno deve serguir alguns requisitos, como uso de proteção para evitar contaminação do alimento, armazenamento correto e transporte adequado caso a coleta seja feita em casa. Desde janeiro deste ano, a entidade contabilizou mais de 131,7 mil litros de leite coletado, 104.555 doadoras e 121.707 receptores.

Em meados de julho, Joaquim começou a mamar no peito de Tissiane, que teve a produção de leite aumentada nesse período. Uma semana depois, foi a vez de Vicente iniciar o aleitamento materno. "No começo, era só estímulo, mas só de sentir o olhar deles, a mãozinha quando segura, é uma troca, não dá para explicar", descreve a engenheira. "Eu queria muito ter muito leite para fazer questão de doar. É um leite que faz toda diferença no desenvolvimento dos bebês. Se pudesse, eu agradeceria cada mãe que doou leite."

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Falta de informação para o aleitamento materno

Ter informações corretas é fundamental para que a amamentação ocorra da melhor forma possível. Infelizmente, não foi isso que a biomédica Willana Caparelli Borges, de 34 anos, teve. Quando engravidou do filho Eduardo, hoje com quase três anos, ela tinha em mente que precisava se preparar para o parto e que o aleitamento materno seria algo instintivo, natural, sem necessidade de preparo.

Após o nascimento, de parto normal, o menino foi diagnosticado com hipoglicemia e a profissional que acompanhava Willana orientou oferecer fórmula infantil para ele, porque não seria indicado aplicar glicose. O alimento foi introduzido no segundo dia de vida de Eduardo. "Juntou a minha falta de conhecimento, a confusão de bico, insegurança, falta de informação e várias pessoas interferindo, sem profissional preparado com apoio à amamentação e isso me levou a não amamentar o Eduardo de forma exclusiva", conta a biomédica. O peito dela, na verdade, era o complemento da alimentação do pequeno.

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Willana com os filhos Eduardo e Ana Carolina. Foto: Cedida por Fabiana Leite Graciano

Ela não desistiu e continuou tentando amamentar, mas o bebê não tinha se acostumado ao seio da mãe. "Isso me gerou trauma grande, senti como se meu filho estivesse me rejeitando, procurei ajuda psicológica quando meu filho estava com cinco meses", disse. Foi nesse momento que indicaram uma consultora de amamentação para ela, a pediatra Loretta Campos. A médica destaca a importância do emocional no processo de amamentação. "É preciso que familiares e profissionais estejam apoiando essa mulher no desejo de amamentar, por mais dificuldade que tenha. Se não tem do lado dela pessoas que apoiem, ela fica cada vez mais insegura e dificulta muito resgatar e salvar esse aleitamento", afirma.

Há pouco mais de um ano, Willana deu à luz Ana Carolina, que continua sendo amamentada desde o nascimento. "Estudei demais sobre amamentação, a cabeça estava diferente, a falta de sono não me incomodava tanto. Há três anos, no Agosto Dourado, me senti muito mal, frustrada por não ter amamentado. Hoje, é a minha felicidade!, diz a biomédica.

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