Quero que cantem e toquem para mim. Que montem os instrumentos num canto da sala e façam ecoar as notas pelos ares e que os acordes preencham cada espaço vazio de quem estiver ali. E que os sons, assim como os risos, as lágrimas e as flores façam da minha despedida um alegre e contagiante ponto de partida. Porque a minha história não acabará ali. Continuará comigo por onde quer que eu vá do lado de lá, e continuará por aqui nas recordações das pessoas para as quais, um dia, eu tive a sorte e privilégio de ser querida.
Quando eu morrer, quero que contem causos, tomem bastante café e comam biscoitos secos de polvilho. Quero que celebrem a oportunidade de estar ali, juntos outra vez, porque a vida anda tão corrida, que os velórios, mais que o casamentos e muitíssimo mais que os nascimentos, têm sido uns dos poucos instantes capazes de reunir parentes e amigos que há tempos não se viam. Quero que contem como andam suas vidas, os seus sonhos e quero, sim, que rezem por mim. Quero seus bons pensamentos e quero que me perdoem, se possível, por aquilo que eu não conseguir ser perdoada enquanto estiver viva. Não por não ter pedido perdão ou não ter me arrependido, mas pura e simplesmente por não ter percebido. Porque muitas vezes não percebemos as mágoas que vamos deixando pelo caminho.
Quero que se abracem e que em cada abraço se despeçam de mim como se eu estivesse ali. Quero que sintam na plenitude essa despedida e que, então, me deixem partir, seguir sem amarras a minha nova caminhada. Serena, segura e feliz. Feliz porque terei o conforto e o apoio daqueles que foram e são parte de mim. Quando eu morrer eu quero a vida, e não a morte, porque quero que a minha partida seja um começo, e não um fim.