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Ser mãe é padecer na internet

Opinião|A volta às aulas 'seguindo todos os protocolos'

O desafio de ensinar as crianças que elas não podem se comportar como crianças

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Atualização:

 Foto: Pexels

Quando o assunto é a reabertura ou não das escolas, eu já mudei de opinião mais de uma vez. Como aceitar que nossos filhos estão há quase um ano sem entrar em uma sala de aula? Como fechar os olhos para o fato de que muitas crianças não tiveram aulas online por questões de falta de acesso, que há mães perdendo o emprego (ou sem poder procurar trabalho) pois não têm mais a parceria da escola dos seus filhos, que meninos e meninas estão ficando sozinhos em casa ou sendo cuidados por vizinhos, que a depressão está dando as caras cada vez mais cedo para essa geração de crianças e adolescentes trancados há onze meses em casa, que sem o olhar cuidadoso de um educador eles podem estar sendo vítimas de violência doméstica e sexual e que muitos jovens simplesmente desistiram de estudar por falta de condições ou motivação para prosseguir?

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Por outro lado, como não se preocupar com o contágio crescente em um país onde a pandemia está fora de controle e registra uma média de mortos maior que mil pessoas por dia, como aceitar que nossos filhos e seus professores vão se aglomerar em salas de aula muitas vezes minúsculas e abafadas, que educadores não tenham sido colocados no grupo prioritário de vacinação e que podem ficar doentes com essa retomada, levar o vírus para dentro de casa e contaminar seus pais idosos ou seus companheiros com alguma comorbidade?

Fato é que as escolas públicas e particulares vão reabrir a partir desse mês e pais, mães, cuidadores e educadores estão colocando na balança os prós e contras dessa retomada. Cada um sabe onde o calo aperta e toma a decisão de voltar ou não de acordo com suas possibilidades e necessidades. De olho nisso, conversei com a infectologista pediátrica Fabianne Carlesse, que atende no Hospital do GRAACC para saber quais são as medidas que temos que tomar para que a volta das crianças às escolas seja a mais segura possível. Segundo ela, não podemos desprezar a gravidade do momento. "Há uma grande euforia por conta da volta às aulas, mas não devemos esquecer que a pandemia ainda não acabou e que todos os cuidados devem ser tomados lembrando que as crianças podem carregar o vírus e não apresentarem sintomas. Por isso, é muito importante que os protocolos de segurança sejam rígidos e cumpridos à risca, por pais, alunos e professores", afirmou. Ela conversou com o blog e pontuou quais são os cuidados que devem ser tomados pelas famílias, quais são as conversas que devemos ter com os nossos filhos e o porquê é importante a reabertura das escolas.

Blog: Como fazer com que essa volta as aulas seja segura para todos?

Fabianne: Em primeiro lugar, os pais nunca devem mandar a criança doente para a escola, por isso devem ficar atento a algumas manifestações clínicas de síndrome gripal, como coriza, espirro, tosse, falta de ar, febre e, se elas aparecerem, não mandar para a escola. Se a criança tiver diarreia e mal-estar ela também não deve ir para a aula. Isso protege a criança, porque quando ela tem uma infecção por qualquer vírus, não necessariamente o coronavírus, fica com a imunidade mais baixa e está sujeita a pegar outras infecções. Não mandar a criança que tiver qualquer um desses sintomas também protege os amiguinhos dela.

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A segunda coisa é fazer um kit de higiene pessoal. Que ela tenha um frasquinho de álcool-gel na mochila, uma máscara para trocar - a gente tem que lembrar que a máscara fica úmida de tanto a criança falar e aí ela perde a função, o ideal é que a criança troque essa máscara de duas a quatro horas. Então, dependendo do tempo que ela vai ficar na escola, os pais têm que mandar uma ou duas máscaras para trocar. Lembrar as crianças para que não compartilhem alimentos, nem brinquedos - e isso é uma coisa difícil para os menorzinhos.

Blog: Como explicar para as crianças, principalmente para as menorzinhas, a não dividir objetivos e brinquedos, a não abraçar e beijar os amigos?

Fabianne: A gente tem que fazer com que a criança entenda como a gente pega o coronavírus, que a gente pode pegar no contato próximo com as pessoas, que o abraço, o beijo e o aperto de mão podem transmitir o vírus. Para as crianças pequeninhas pode se fazer de uma forma mais lúdica, ensinando a cumprimentar com o cotovelo, com o calcanhar. E a escola talvez possa ajudar a fazer isso também, as professoras incentivarem esse tipo de cumprimento, fazendo com que seja divertido.

Uma outra coisa é dizer para eles que hoje a gente tem que andar de máscara, e como é difícil beijar de máscara, temos um jeito novo de cumprimentar e que deixa o vírus longe da gente. Quando a gente faz isso não traz o vírus para casa. Temos que explicar que não dá mais para a gente beijar e abraçar do jeito que a gente beijava e abraçava antes, então abraço e beijo a gente dá em casa, com o papai e com a mamãe.

Blog: É verdade que as crianças correm menos riscos, que quando têm coronavírus os casos são mais leves?

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Fabianne: A infecção nas crianças ocorre de uma forma mais leve do que a gente está observando nos adultos - então a incidência é menor. E quando ela acontece é de uma forma mais leve e acaba se assemelhando a um resfriado comum. A criança tem coriza, dor de garganta, um pouco de dor no corpo. O que a gente tem que ficar de olho é com uma febre mais alta, que demora para passar, ou sintomas como falta de ar, principalmente em criança que tenha alguma comorbidade, algum problema respiratório, como nas crianças asmáticas ou que têm algum problema de saúde, como obesidade, diabetes, depressão. Essas crianças podem apresentar formas mais graves de coronavírus. Então, nessas crianças, ficar de olho em sintomas como febre, falta de ar, coriza, tosse importante, que leva à falta de ar e sintomas que são um pouco mais persistentes.

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Blog: Existe grupo de mais risco para o coronavírus entre as crianças?

Fabianne: A doença tende a se apresentar de uma forma mais grave em crianças que tenham alguma doença de base, como uma cardiopatia, obesidade, diabetes, imunossupressão -nessas crianças o coronavírus tende a ser um pouco mais grave. Entre as formas graves da doença, a gente tem a insuficiência respiratória aguda, e a pneumonia que pode levar à insuficiência respiratória aguda. E a gente tem, na pediatria, a síndrome respiratória multissistêmica, que é vista mais nas crianças do que nos adultos e geralmente acontece depois da infecção pelo coronavírus, como se o coronavírus fosse o desencadeante dessa síndrome. Os sintomas são febre alta, miocardite, alteração no rim, alteração gastrointestinal, alteração de pele - a síndrome inflamatória multissistêmica provoca um rash cutâneo e uma alteração importante de todos os marcadores inflamatórios.

Blog: Por que esse retorno as escolas é visto como urgente, mesmo com a pandemia longe de um fim?

Fabianne: A volta às aulas para as crianças é muito importante. A gente passou um ano difícil, que todo mundo teve que ficar dentro de casa, um ano que a gente teve que aprender a lidar com uma adversidade grande, que a gente nunca tinha tido antes. As aulas online mostraram a dificuldade das crianças manterem a concentração, a falta que elas sentem dos amigos, das brincadeiras, do convívio social - tudo isso afetou muito as crianças. Como consequência, tivemos um aumento dos casos de depressão - em isolamento elas acabaram deixando de fazer as coisas da escola, não tinham ânimo para fazer. Então a gente precisa incentivar essa volta às aulas com segurança, fazendo todos esses protocolos de segurança, não mandando a criança doente para a escola, ensinando as crianças a higienizar as mãos frequentemente, a usar a máscara, praticar o distanciamento social, ficar a uma distância de dois metros entre os amiguinhos, tudo isso vai fazer com que ela continue no seu convívio social, diminuindo esses sintomas de depressão que a gente viu tanto esse ano nas crianças. Eu acho que a gente precisa incentivar essa volta as aulas com segurança.

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Dicas importantes para a família:

o Não mandar a criança para a escola se perceber que está febril, com tosse contínua ou síndrome gripal

o Colocar na mochila pelo menos duas máscaras para trocas durante o dia. Lembre-se: a máscara não é pretexto para afrouxar as regras de higiene e afastamento

o Um frasco de álcool em gel também pode ser uma opção na mochila para crianças maiores

o Preparar lanches e refeições em casa

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Dicas importantes para a escola:

o A temperatura da criança deve ser medida ao entrar e sair do colégio

o Utilizar máscara cobrindo o nariz e a boca durante todo o período que a criança estiver na escola

o Higienizar as mãos sempre que tocar na máscara e quando for efetuar a troca

o Respeitar o distanciamento social. Abraços e beijos devem ser evitados

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o A criança deve ter seu próprio talher e copo

o Não compartilhar objetos e refeições

o O ambiente escolar deve estar totalmente higienizado e as crianças devem ser orientadas a não colocar as mãos em qualquer superfície.

o Orientar as crianças a evitarem levar a mão no rosto nos olhos. Levá-las e orientá-las a lavar as mãos frequentemente com água e sabão

Leia mais: A vida das crianças já estava difícil antes da pandemia

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Opinião por Rita Lisauskas

Jornalista, apresentadora e escritora. Autora do livro 'Mãe sem Manual'

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