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Crônicas do cotidiano

Reunião de condomínio

O que somos ali, podemos ser lá fora

Por Ricardo Chapola
Atualização:

A reunião de condomínio aqui do prédio, na semana passada, me fechou num casulo contemplativo:

 

"Que merda é essa?" - pensei por um longo período, até me dar conta de que aquilo era o que a vizinhança chamava de diplomacia.

 

Se um dia o Brasil virar a casa da mãe Joana, podem ter certeza, parte disso será por causa das das relações políticas entre os vizinhos. Afinal, são eles, é você, sou eu quem faz essa bagaça toda funcionar, à nossa imagem e semelhança.

 

 Foto: Estadão

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Ilustração: Felipe Blanco

O primeiro problema está na ordem - ou na falta dela - dentro da dinâmica que move as reuniões dos condomínios brasileiros. A ágora moderna está mais para feira livre, ficando inviável qualquer tentativa de debate sobre a criação da horta nos fundos do prédio, ou a ampliação da edícula para churrascos mais convidativos.   Pessoas gritam pelos seus interesses, me dando a clara sensação de que o berreiro todo é aberto só pela satisfação de verem suas causas solapando as do vizinho. Vence quem bradar mais alto. (#sqn)   Existe também um pouco de sociopatia nas relações diplomáticas nos condomínios, ou talvez até de despotismo na mentalidade das pessoas que dividem com você as paredes, a área de lazer e o elevador. Há nesse contexto um afã maior do que o normal em fazer prevalecer o interesse privado sobre o público, por mais bizarros que sejam os temas em pauta. Na semana passada, deparei-me com todo o tipo de gente, inclusive vizinhos contrários ao livre direito dos varais na varada.
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+ Curta a página de Crônicas de Ricardo Chapola no Facebook + Siga-me no Twitter + Leia outros textos do blog _________________________________ Ora, pensei, defendo a democracia participativa, sou a favor do sufrágio universal, luto pela igualdade, mas tenho dificuldades em saber por qual motivo um cidadão não poderia colocar suas cuecas ao sol, 10 andares acima da cabeça de alguém. Critério estético? Se fosse, seria uma absoluta incoerência tendo em vista os cacarecos que algumas pessoas resolvem pendurar em suas sacadas, muitas vezes até piores do que um varal.   Espera-se tolerância diante da batalha perdida. Posso achar frescura um outro vizinho reclamar do barulho da esteira da academia, no entanto, devo respeitar se, pelo voto, a decisão for fazer uma vaquinha para trocar o aparelho. Há quem combata sozinho a instalação do aquecedor na piscina, mas não significa que a dissidência mereça ser provocada, hostilizada, ou discriminada.   Falta ainda um pouco de civilidade ao ser humano na forma como ele lida com o outro. Esperamos que todos sejam iguais a nós, que lutem pelos mesmos interesses, ou que engulam as nossas exigências, sem choro, nem vela, por um momento fazendo parecer que ainda estamos atolados na ditadura. Ninguém é obrigado a nada: a concordar com a maioria, a discordar com a minoria. A rigor, ninguém é obrigado a ir a uma reunião de condomínio. Mas desistir revela fraqueza. A gente não pode tolerar a intolerância, que começa no prédio, abre o portão, depois toma as ruas.
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