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Reflexões sobre gênero, violência e sociedade

Aplicativo reúne leis sobre cidadania LGBT e encaminha denúncias de violência

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Por Nana Soares
Atualização:
 Foto: Tãnia Rêgo/Agência Brasil

O Brasil é um país extremamente LGBTfóbico, discriminando e segregando gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais de diferentes maneiras. Somos o país que mais mata LGBTs do mundo. Por aqui, uma vida é perdida a cada 25 horas por ódio e preconceito. Segundo o Grupo Gay da Bahia (GGB), que há anos compila dados que aparecem na mídia e em relatos de familiares, foram 347 mortes de pessoas LGBT em 2016.

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E não para por aí: o Brasil é também o campeão absoluto de morte de pessoas trans no planeta, sendo responsável por quase 40% dos assassinatos de todo o mundo, segundo levantamento da ONG Transrespect.

Esses dados, no entanto, não representam a totalidade, já que não há dados oficiais com o recorte em identidade de gênero e orientação sexual. E os crimes de ódio devidamente catalogados também representam apenas uma parcela do que realmente acontece.

Tudo isso mostra a necessidade de leis que promovam a cidadania LGBT e garantam nossos direitos. E mais necessário ainda é que essas leis sejam colocadas em prática. Recentemente descobri uma ferramenta importante para isso, é o aplicativo TODXS App, que compila informações sobre leis de proteção a LGBTs, organizações representativas e também permite que os usuários façam denúncias de casos de LGBTfobia.

O aplicativo, disponível gratuitamente para Android e IOS, compila 820 leis e normas referentes a direitos LGBT no país, de âmbito municipal, estadual e nacional. As pesquisas foram feitas junto à Secretaria de Direitos Humanos do Governo Federal, em Assembleias Legislativas, Câmaras Municipais e Prefeituras de cidades com mais de 300 mil habitantes, que disponibilizam seus dados em plataformas online. O usuário pode buscar também uma lista de ONGs e instituições representativas da população LGBTI+ em todo o país.

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A ideia para o app surgiu após um amigo de um dos fundadores ser expulso de um restaurante em Fortaleza por estar de mãos dadas com o namorado, sob o pretexto de que aquele era um "ambiente familiar". Por não saberem como agir, os rapazes acataram ao "pedido", mas depois descobriram uma lei municipal que penaliza estabelecimentos comerciais que pratiquem discriminação a clientes com base em sua orientação sexual.

Disparidades regionais

As 820 leis e normas sobre cidadania LGBT compiladas no aplicativo mostram um país desigual em relação a proteção de gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais. São Paulo é o estado que mais possui leis (93), seguido por Minas Gerais com 83. O ranking estadual segue com Bahia (57), Rio Grande do Sul (52), Paraná (44), Pernambuco (44), Rio de Janeiro (42), Goiás (27), Mato Grosso do Sul (26) e Distrito Federal (16).

Curioso é notar que alguns dos estados com maior número de leis foram também os que mais mataram LGBTs segundo o levantamento do Grupo Gay da Bahia mencionado no início do texto. São Paulo estava no topo do ranking, com 49 mortes, seguida pela Bahia (32), Rio de Janeiro (30) e Amazonas (28). Para Duda Carvalho, gerente de comunicação da TODXS, isso pode acontecer porque esses estados têm mais visibilidade nos casos de violência. Para ela, duas perguntas têm de ser feitas: As cidades e suas respectivas administrações estão implementando, as leis? Os dados focam em zonas específicas do país ou estão, de fato, mensurando o Brasil como um todo?

"Hoje não temos como responder essas perguntas, mas estamos pesquisando justamente para conseguir dados mais próximos da realidade. Além disso, é importante frisar que hoje no Brasil a LGBTIfobia não é crime de ódio a nível federal, o que torna ainda mais difícil identificar o número exato de mortes." A TODXS tem a meta de lançar a Base Nacional de Dados LGBTI+ no Brasil até 2019, para levantar dados confiáveis que possam ser usados em políticas públicas.

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Em relação ao tipo das normas sobre a população LGBT, a maioria versa sobre a inclusão social dessa população (284 dos 820 itens catalogados), seguidos pela regulamentação de órgãos que combatem a discriminação e recebem denúncias de violação de direitos, com 121 documentos.

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Um terceiro tema atingido pelas leis brasileiras diz respeito a educação, especialmente normas que garantam direitos como o nome social, a educação livre de discriminaçãoe o combate ao bullying. Na avaliação da equipe da TODXS, a divisão reflete o percurso da cidadania LGBT no país, que ainda dá os primeiros passos de inclusão. "Precisamos garantir primeiro os direitos básicos para essa população e, ainda mais importante, que eles sejam aplicados. Um exemplo é o nome social: é necessário reconhecer as pessoas por quem elas realmente são, e não infringir ainda mais o direito de alguém que já passa por discriminações em locais como escolas e no mercado de trabalho", completa a gerente de comunicação.

++ Leia mais: Homofóbico não é enrustido, não! 

Denúncias de LGBTfobia

Os usuários do aplicativo podem também realizar denúncias de violência de motivação LGBTfóbica. Até o momento, 32 pessoas já usaram o TODXS App para registrar essas ocorrências: a maioria delas tratava de casos de agressão verbal e 6 referiam-se a agressão física.

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A partir dessa semana, essas denúncias são formalmente registradas, já que os idealizadores firmaram uma parceria com a Controlaria Geral da União (CGU). O acordo faz parte do Programa de Avaliação Cidadã de Serviços e Políticas Públicas e permite que as ouvidorias públicas tratem e respondam às manifestações feitas por meio de apps desenvolvidos pela sociedade civil.

Em outras palavras: quando um usuário realizar uma denúncia e compartilhá-la com a CGU pelo aplicativo, ele poderá acompanhar o andamento da demanda. A CGU não tem poder de ação judicial ou investigativo, mas os dados serão utilizados para aperfeiçoamento de políticas e serviços públicos, compondo um levantamento sobre esse tipo de violência.


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