Passado um mês da quarentena - no meu caso, exatas seis semanas em razão do fechamento da escola das crianças - não há como negar que chegamos à certeza de que vivemos em meio ao excesso. Ele é representado pela quantidade de roupas, sapatos, mobília, comida, louça, livros e muito mais daquilo que nos cerca em todos os cômodos da casa. Perdoe-me se este não for o seu caso, mas a cada dez pessoas com quem tenho conversado no período, ao menos oito relatam "pra quê eu tenho tanta coisa?".
(Anelisa Lopes escreve sempre às terças. Acompanhe alguns de seus projetos e referências no Instagram: @anelisalopes)
Se vamos mudar nossa forma de consumir ou não após a passagem dessa pandemia é outra questão. O fato é que acumulamos demais - e, pior, sem saber muitas vezes o porquê. E, nosso templo que deve ser restrito a descanso, reflexão e sociabilidade está lotado de... vazio.
Na correria do dia a dia, não damos valor ao prazer de um banho quente após um dia de trabalho, da satisfação de uma comida feita na hora, da conversa jogada fora com o vizinho ou de observar os minutos finais do sol se pondo. Mas temos nas mãos um companheiro diário que não pode substituir o que é real, o celular, e que nos rouba um tempo precioso de consciência que deveríamos ter em casa.
É chegada a hora de se livrar do que não é necessário. De "limpar" nosso refúgio e manter apenas aquilo que nos traz bem-estar, boas memórias e funcionalidade. Deixar nossa casa pura e viva: limpar, organizar, se desprender do que não nos serve, doar, consertar em vez de substituir, cultivar uma mini-horta, cuidar das plantas, dar bom dia ao faxineiro do prédio ou ao guarita da rua. Desacelerar e entrar em contato consciente com cada canto do nosso abrigo e, definitivamente, entender que o virtual em demasia e o consumo em excesso nos projeta para cada vez mais longe de nós mesmos.