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Cada história é única

Os filhos crescem e tudo muda com eles

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Por Priscilla de Paula
Atualização:

 

Fiz um sinal de coração com as mãos e gritei pela janela o nome dele, enquanto ele atravessava a rua com dois novos vizinhos do esquema da carona solidária. Eu sou a mãe que os levo pra escola. Hoje é o dia dele: 11 de fevereiro.

Rafael era pra 07 de março de 2009. Adiantou. Também, eu vivia num ritmo louco! Estava havia dois anos sem férias porque troquei de emprego e ainda fazia trabalhos extras em alguns fins de semana.

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Quando o ultrassom identificou que a placenta tinha envelhecido antes da hora e estava quase seca, quase enfartei, mas as roupas da maternidade já estavam lavadas.

Ele teria nascido no dia 10/02, mas tivemos de esperar vagar um leito na UTI de prematuros da Pró-Matre, caso precisasse ao nascer e acabou virando o dia seguinte. Graças a Deus, Rafael não precisou de UTI, mas nasceu antes da hora.

Pois, nesses 13 anos de aventura intensa, deliciosa e desafiadora, uma coisa me transformou pra sempre: a inversão de prioridades e a forma como a gente enxerga o mundo.

Depois de ter filho, muda tudo!

 

Algo começou a mudar pra mim no dia em que eu descobri a gravidez, porque decidi que ia escrever sobre essa experiência revolucionária. O primeiro desejo era de fazer registros pra que meu filho pudesse ler no futuro. Foi onde tudo começou. Lá em 2008, criei o blog  www.mundorafael.blogspot.com.

Me lembro bem do prazer que eu sentia em sentar na frente do computador e escrever e escrever - na hora que fosse - como se estivesse contando a história pro pequeno. Só divulgava os textos para a família e para as amigas.

 

Aí, quando Rafael fez dois anos e aquela fase ainda era chamada de "The Terrible Two", corri para a análise! O termo foi banido pela parentalidade positiva, mas a compreensão que a definição me causou e a minha constatação de que eu não tinha elementos pra ser a mãe que eu gostaria de ser, por mais amorosa e dedicada que eu fosse e por mais planejado, amado e desejado que ele fosse, eu entendi que eu precisava de ajuda. Foi a melhor coisa que fiz.

Aliás, gente sempre precisa de ajuda, né!?

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Fiquei anos em sessões no divã da minha analista lá na Vila Madalena, reconstruindo um olhar sobre a personalidade do meu primeiro filho e, sobretudo, sobre mim. Sobre o meu jeito de ser, sobre as escolhas que fiz na vida, sobre a pessoa que me tornei, sobre os meus muitos desejos... Ser mãe dele me virou do avesso e também me fez jogar luz sobre traços da minha personalidade que eu nunca tinha parado pra pensar sobre e, "de repente", sem nem sonhar, meu primeiro filho me fez querer um tanto de coisa que eu nunca tinha querido antes.

 

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As minhas descobertas em sessões também me faziam querer escrever sobre o que eu aprendia. Naquela época e durante muitos anos, eu queria dividir, queria fazer com que pessoas que não tinham as mesmas oportunidades ou o mesmo desprendimento e coragem para olhar pra dentro, como eu tinha, pudessem parar pra pensar sobre a maternidade e sobre si. E, quem sabe, tomassem a decisão de buscar ajuda profissional...

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Eu nunca vou me esquecer da sessão em que eu me dei conta de que não tinha receita pra criar filhos e que eu teria de descobrir saídas próprias e únicas pra maternidade. Cheguei no consultório chorando porque tinha decidido chamar a atenção dele olhando olho no olho, exatamente como tinha lido numa revista que pais deveriam fazer. Pra ficar frente a frente dele, abaixei... E levei um tapa na cara! (Ele só tinha dois e, obviamente, ainda não tinha a noção do que é um tapa na cara. Mas demorei a entender).

"Eu fiz exatamente como estava escrito!", cdf, lamentei inconformada. E a intervenção da minha psicanalista foi transformadora: "Nem tudo que está escrito serve pra gente, né, Priscilla?"

Bingo! Não tem receita. Me senti a Priscilla Álvares Cabral! (Risos)

 

Dali em diante, decidi escrever um livro que se chamava Mãe Sem Receita e que teve oito capítulos escritos durante as férias, antes do Rafael fazer três anos. Só que o computador estava com o teclado de espaço estragado e as palavras se juntaram todas. Percebi na primeira frase, claro, mas meu marido disse que era fácil resolver. Fui escrevendo ao longo das férias, mas nunca resolvemos. Foi um balde de água fria, claro, mas fui fazer outras coisas depois com aquele desejo. Este blog mesmo já tem quase seis anos. Aqui fiz entrevistas, escrevi muito, fui a palestras, li livros, criei coisas novas. Fui estimulada a pensar fora da caixa, alimentei sonhos, fui feliz. Mas as ideias e o esforço não me levaram para os lugares que eu esperava. E não me abriu as portas que eu desejava.

C'est la vie, uns dizem.

 

Treze anos se passaram. Com ou sem aqueles sonhos lá do começo, a maternidade continua sendo a experiência mais intensa, desafiadora, enlouquecedora e prazerosa pra mim.

Tem horas que a gente acha que vai pirar de vez ou ter um troço. Ah, tem. Mas quando recebe um abraço sincero e ouve um "eu te amo" mesmo descabelada é a coisa mais maravilhosa do mundo.

E tem outro prazer que eu também amo: ouvir mães de amigos falando bem dos meus filhos. Que eles são educados, gentis, amorosos, conversadores... Cataploft!

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Aliás, como pode eles se comportarem melhor fora de casa do que diante de nós mesmas, hein? Ai, ai...

 

Feito como a gente não desiste de filho e sabe que o investimento tem resultado (mesmo que não seja como desejamos), eu também não desisti de sonhar, nem de me esforçar.

Na análise, que deixou de ser sobre a minha maternidade e passou a ser muito mais sobre mim mesma, eu falava das sementes que estava plantando e trabalhava na paciência pra esperar ver florescer, enquanto regava, adubava e cuidava da terra, pra não deixar morrer.

Mas se as coisas não acontecem como a gente planeja, temos de andar pra frente. Acabei tendo que desistir de projetos e de muitas coisas que acreditava piamente que seria uma fonte de prazer, a minha liberdade e ganha-pão.

Só que não desisti de continuar buscando me sentir realizada. Pra isso, não pode faltar resiliência, determinação e coragem. E, graças à maternidade, também me tornei flexível, o que ajuda.

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Comemoro os 13 anos do Rafael grata a Deus pelo mais importante, orgulhosa de ter aprendido tanto em análise e aliviada de, finalmente, conseguir me despedir agora deste blog que eu tanto amei, que tanto me ocupou nos últimos quase cinco anos, mas que já não cabe no caminho. Sem receita eu sempre vou ser, na maternidade e na vida, mas não mais publicamente aqui.

Não foi fácil fazer esta ruptura, pensada e sofrida ao longo dos últimos muitos meses, e eu estou até surpresa que a solução tenha vindo num dia tão marcante e especial. É que já não estou mais dando conta, mas hoje quis escrever. Curioso como o aniversário de um filho possa causar tantas reflexões e mudanças mesmo depois de alguns anos.

Me despeço, então, agradecendo de coração pela companhia até aqui. E, se você conhece, gosta, participou um pouquinho da vida do Rafael e quiser desejar felicidades e bençãos pro meu Fefel, te agradeço ainda mais.

"Vida que segue", como diz o querido e admirado Ricardo Kotscho. Ou "Kotschão", como uma vez disse o Rafael ainda pequenininho e ficou registrado lá no Mundo dele.

 

*Ando um tanto sumida, mas ainda continuo no @eupriscilladepaula, no Instagram. E, desde dezembro, na RecordTV Minas.

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