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Comportamento, saúde e obesidade

Opinião|A vida é um ciclo de impermanências

O processo de luto é uma experiência de muita dor e também de aprendizagens

Foto do author Luciana  Kotaka
Atualização:
  Foto: Estadão

Recentemente perdi uma gatinha, não tinha nem dois anos de idade, uma fofura, eu a adotei junto com mais dois irmãozinhos. Os três faziam uma festa, eram três bolinhas peludas estilo frajola, espertos, carinhosos e muito divertidos.

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Porém de repente meu olhar de mãe percebeu algo sutil, mas ainda assim foi tarde, ela estava com uma doença sem cura. Após meses de buscas por uma mágica, a saúde dela foi ficando debilitada e chegou um momento que eu precisei escolher entre submetê-la a mais uma transfusão de sangue ou deixá-la ir. Foi a decisão mais difícil de minha vida, mesmo recebendo sangue ela não tinha mais vida, não brincava, não corria e eu sabia que era o momento de soltar.

O tempo todo eu estava atenta aos meus sentimentos e a dor que ela poderia estar sentindo, mas um misto de angústia e desespero tomou conta de mim em vários momentos e eu pensava nos pais que perderam os seus filhos para doenças desse tipo, a leucemia.

Mas ainda assim no desespero eu a levei de novo ao hospital mesmo sob os protestos de meu primogênito que, aliás, é um ser de luz na minha vida, mas eu precisava ouvir de outra pessoa que era momento de parar, pois essa seria uma decisão desafiadora e dolorida. E foi o que ouvi, e eu me recolhi em minha pequenez, em minha dor, e a levei para casa.

Ajeitei-a no sofá bem confortável e fiquei ali olhando nos olhinhos dela, vi o brilho de quem queria ficar, mas o corpinho dela não permitia mais. Olhei para a morte e vi que ela é cruel, pois tirou dela a oportunidade de viver e de permanecer com a nossa família.

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E assim é a vida, um ciclo de impermanências. Desde que nascemos sabemos que a morte em algum momento se apresentará e que não teremos como fugir, mas mesmo assim são raras as pessoas que conseguem lidar com essa separação de forma mais tranquila.

A sensação de impotência é imensa e é nesse momento que começamos a compreender que nada está sob nosso controle, tudo tem um tempo e este está sob o comando de algo muito superior a nós.

Estou contando a minha história sabendo que muitos de vocês já perderam seus bichinhos de estimação ou entes queridos e sabemos como essa passagem traz uma imensa dor. Para uns é mais fácil e para outros é uma dor desesperadora.

A morte em nossa cultura não é leve, nós a encaramos com muito peso pois o apego é muito forte. Não aprendemos a lidar com essa passagem que é tão natural, tudo nasce e morre, o fim é uma consequência natural de tudo o que tem vida. Um ciclo de dualidades assim como o dia e a noite, o frio e o calor, o quente e o frio, a presença e a ausência.

Quando conseguimos entender e aceitar esses desafios a dor fica mais leve, pois toda situação que passamos traz uma aprendizagem que é necessária para o nosso desenvolvimento como pessoa. Nada é por acaso e se tivermos essa consciência, mesmo com a dor se fazendo presente, o processo fica mais leve, conseguiremos passar por essa experiência e sairmos mais fortalecidos.

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Porém, quanto mais a negarmos, mais complexo será passar pelas fases do luto e fechar os ciclos. Quanto mais difícil soltar e aceitar, mais adoecemos, pois a tristeza vai ganhando terreno e adoecendo também o nosso corpo. A depressão se instala, o pulmão grita a sua dor, e assim vamos sobrevivendo a cada dia.

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No entanto tudo isso é um processo esperado, a dor da perda é imensurável e cada pessoa irá vivê-la de uma forma, não existe certo ou errado, existe a dor, e ela é verdadeira. O texto tem o objetivo de levar a uma reflexão sobre as passagens da vida, do ciclo da natureza. Compreender todo esse processo não me fez deixar de chorar, de sentir dor, raiva e revolta, mas a consciência sobre todo o processo me trouxe o equilíbrio e passei a encarar a vida de forma mais tranquila.

O estado de presença faz muita diferença, o olhar para si mesmo para entender o que esse processo está exigindo de você, pois é preciso olhar para os apegos e a necessidade de controle não só em relação às pessoas que amamos, mas também para as mágoas e os ressentimentos que teimamos em manter em nossos corações. A vida nos dá a oportunidade de soltar e deixar fluir, aceitar, navegar no mar aberto, sem a necessidade de se agarrar, mas de aproveitar a experiência presente. Isso requer olhar ao redor e aproveitar ao máximo as oportunidade que temos.

Perder um animalzinho de estimação para muitos é tão dolorido quanto perder uma pessoa, o luto segue o mesmo processo, as questões que surgem são as mesmas. O que nos resta é sorrir com as lembranças boas, ter gratidão por todos os momentos vividos, compreender a lição e aceitar que estamos aqui temporariamente, só de passagem.

 

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Opinião por Luciana Kotaka
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