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Um blog de pai para filha

Na Lama

Pequenina, eu juro, quando comecei a escrever essa crônica não era sobre política. Mas tá difícil ignorar a lama.

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Por Victor Sá
Atualização:

Trilha sonora:

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Pequena telespectadorinha,

Antes de você nascer, papai tinha muitas certezas. Entre elas a de que você não assistiria televisão até completar pelo menos dois anos. Como tantas outras certezas, essa caiu por terra. A televisão, e mais especificamente a Peppa Pig, são responsáveis por minutos preciosos em que o papai consegue ir ao banheiro, tomar banho, escovar os dentes e, até mesmo, dar uma olhadela no jornal com uma xícara de café em mãos. (Conseguir abrir jornal e beber café me dão alguma dignidade de adulto funcional antes perdida entre tantas fraldas).

Em uma dessas manhãs, você assistia a nossa babá eletrônica enquanto eu olhava (ler seria demais) o jornal e tentava acompanhar você e a Peppa simultaneamente.

Na tela, a porquinha brincava em sua nova casa da árvore. Todos os outros bichinhos - a zebrinha Zoe, a ovelha Suzy, e os coelhinhos Rebecca e Richard - estavam lá se divertindo. Tomavam chá de mentirinha e eram felizes.

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No jornal, o atual vice-presidente falava em nomes para compor seu "provável", "futuro", "eventual" governo.

Na tela, o pônei Pedro e o cãozinho Danny ganhavam um castelo para contrapor a casa da árvore da Peppa. O castelo era bem bacana, tinha uma bandeira invocada e uma ponte levadiça. Os amiguinhos da Peppa não resistiram a todo aquele luxo e debandaram para o castelo do cachorrinho Danny. A Peppa ficou sozinha e triste.

No jornal, um dos principais nomes da oposição falava na importância de participar da "provável", "futura , "eventual" nova gestão.

Na tela, todos, exceto a solitária Peppa, brincavam felizes no castelo. Mas a festa acabou quando começou a chover. O castelo não tinha teto e todos os bichinhos correram de volta para casa da árvore (devidamente equipada com telhado) deixando o Pedro sozinho e molhado. A Peppa novamente se sentiu querida e feliz, agora, acompanhada de toda a turma.

No jornal, a situação falava em muita luta no caso de um "provável", "futuro", "eventual" afastamento da presidenta.

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Sabe, Amorinha, esse combo de jornal, desenho e sono me levou a concluir:

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a Peppa e o Danny são situação e oposição (tanto faz quem é o que aqui), enquanto a turminha de amigos sem ideologia e tremendamente infiel é o PMDB, o partido do "provável", "futuro", "eventual" novo governo.

A culpa dessa volátil galerinha estar sempre no rolê é da Peppa e do Danny que topam brincar com eles pra começo de conversa. Mas, aparentemente, no Brasil essa é a condição pra quem quiser brincar. Desde que papai aprendeu a ler jornais é assim. Desde que papai assistia desenhos é assim.

Na tela, parou de chover e - como quase sempre nos episódios da Peppa - todo mundo foi brincar na lama. Casinha da árvore e castelo ficaram vazios enquanto todos se emporcalhavam na lama.

No jornal, todos também se emporcalhavam na lama.

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Pequenina, eu juro, quando comecei a escrever essa crônica não era sobre política. Mas tá difícil ignorar a lama.

Amor emporcalhado,

Papai. 28.04.16

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