+ Minha saudade manda-te boa noite e pede que eu te diga coisas belas. Talvez seja belo isto: minha saudade manda-te boa noite e pede que eu te diga coisas belas.
+ Tenho saudade de um tempo em que fui vassalo do amor. Que alegria era ver uma vez por dia a mão dele, quando enfiava dentro da cela o pratinho de comida e a tigelinha de água.
+ Ele nunca beijou a mão dela, quando podia. Se o tivesse feito, talvez hoje ela, esteja onde estiver, sentisse uma coceguinha reminiscente e sorrisse, sussurrando: ah, aquele sujeito, que maluquinho ele era, às vezes chego a ter saudade.
+ Dos cinquenta anos de casamento, ela se lembra com mais ternura do primeiro, aquele em que um dos seis copos do armário da cozinha era um pote de requeijão cremoso.
+ Não seja avarenta. Sorria sempre, à brisa da manhã, ao sol da tarde, à beleza da noite. Mas guarde um de seus sorrisos diários, mesmo que seja o menos expressivo, para o momento em que talvez você venha a lembrar-se de seu amigo distante.
+ Que saudade do tempo da licença poética, quando se podia embrulhar um beijo bem carinhoso num papel feito de nuvem branca, chamar um pombo gentil, dar-lhe o endereço da amada e ficar pensando no sorriso com que ela o receberia. Tempo em que os poetas tinham várias vidas, todas à disposição daquele ser cujos delicados pés eles beijariam, se já não os beijassem nos versos, com lábios que saberiam buscar o sagrado mel entre dedos esmaltados.
+ Tudo que ocorreu a eles foi casto. Amaram-se com as palavras e, antes que estas fossem deturpadas pelos apelos do sangue e da carne, um generoso desígnio os afastou. Quando sentem saudade, as palavras ainda estão ali, intactas, sem as marcas de todo o tempo passado, tenras ainda como eram quando ele e ela as pronunciavam como se pronuncia o nome de um deus rigoroso.
+ Agora navega em um lago cujas águas o vento não toca e ondas não agitam. Mas tem saudade do mar proceloso, do azul repentinamente irado, das chibatadas do tufão no casco e dos brados coléricos dos marinheiros. Tem saudade de gritar pela amada no convés devastado e de, absurdamente salvo, acordar numa praia desconhecida e atribuir o milagre não à invocação de Deus, mas do nome dela no meio da borrasca.
+ A caridade pública recolheu pelas ruas os sonetos e levou-os a um asilo. Alguns eram tão velhos que rimavam saudade com quem há de...