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Impressões sobre a vida e seus arredores

Muita sorte

Depois de três anos, talvez o amor renasça

Por Raul Drewnick
Atualização:

Seria muita sorte ele haver pensado o mesmo que você e, exatamente três anos depois da morte do amor, ter sentido uma recaída, como você hoje. E vir para este café, e sentar-se à mesma mesa onde vocês se disseram aquelas palavras tão tristes - e aquela, a mais dilacerante de todas: acabou. Seria muita sorte ele ter, como você, esquecido aquelas grosserias que vocês trocaram aquela manhã. Você precisava ter dito que a mãe dele parecia a Monalisa de Salvador Dalí, com aquele bigodinho de dom Pedro I? E você, gostou quando ele disse que você, como todos na sua família, tinha cara de dobermann? Bom, talvez não sejam coisas tão insuperáveis assim. Três anos atrás ele era o quê? Um garotão. E você? Uma meninona. Ele terá mudado, assim como você. Estará maduro, assim como você se sente agora, pronta para reconhecer seus erros, e quem sabe... Seria muita sorte, mas não é impossível que ele tenha visto na Fátima Bernardes aquele papo de casais separados há algum tempo que de repente se lembram de um dia especial, de uma hora única, em que tudo era rosa sobre azul, e pensam se o amor não pode ter volta. E aqui está você, na mesma hora e no mesmo café, como três anos atrás. Na mesma hora é modo de dizer: você está três minutos adiantada. Seus olhos estão fixos na galeria por onde ele, se vier, chegará. Casado ele não deve estar. Você saberia. Ouviu algumas histórias de namoricos. Bem, isso está dentro do perfil dele. Ele sempre se achou irresistível. Você também não teve seus casinhos? Até ai, tudo normal. O que importa é que - hoje você sabe - ninguém foi como ele para você. Isso tem um nome: amor. É amor que você sente agora. Esta aflição, este nó na garganta, esta vontade de rir, de chorar. Ele vem vindo, é ele, ninguém conseguiria imitá-lo. É ele. O bigode que ele tem agora o deixou ainda mais bonito. Você o olha com um canto de olho. Ele veio, como você pôde duvidar? Não era uma questão de sorte. São os dez dedos do destino. Você começa a se levantar. É um daqueles momentos em que, no cinema ou na vida, os apaixonados correm para se abraçar. Você nota então a mulher ao lado dele, a loira que ele conduz pelo braço. Bem do tipo que ele sempre apreciou. Relaxadona? É, é essa a palavra. Ainda bem que ele nem olhou para dentro do café. Nem lembra que dia é hoje, não está nem aí. Passa direto com a mulher, sorrindo, com aquele bigode que o fez ficar, como a mãe, com cara de Monalisa machona.

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