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Psiquiatria e sociedade

Opinião|Vivendo no futuro - como ansiedade e otimismo atrapalham o brasileiro

O brasileiro é o povo mais otimista e mais ansioso do mundo. E de tanto pensar no futuro, esquecemos de agir no presente.

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Atualização:
 Foto: Estadão

Há cerca de três anos um estudo internacional ganhou manchetes ao apontar o brasileiro como o povo mais otimista do mundo. Os dados mostravam que ninguém acredita mais do que nós num futuro melhor. Paradoxalmente, contudo, nesse início de 2017 a OMS revelou também sermos os campeões mundiais de transtornos ansiosos. Dessa vez os números revelam que ninguém teme o futuro mais do que nós.

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Vivemos ao mesmo tempo com muita fé e muito medo. Por que será?

O motivo pode estar na nossa cabeça. O córtex órbito-frontal (COF) é a área cerebral que nos faz civilizados, digamos assim, permitindo o autocontrole emocional e ajuste de comportamentos de acordo com as possíveis consequências, prevendo resultados de nossas ações. É ali que antecipamos mentalmente o futuro - para bem e para mal. Ano passado cientistas verificaram que as pessoas com o córtex órbito-frontal maior eram menos ansiosas, e durante a investigação notaram que essa redução da ansiedade se dava por meio do aumento do otimismo. Mais massa cinzenta ali era igual a maior otimismo, protegendo os sujeitos da ansiedade.

Portanto o otimismo e ansiedade vivem no futuro. E embora não sejam exatamente antônimos, ficam em polos opostos. O otimista acha que tudo dará certo. Seu antônimo, o pessimista, acha que tudo dará errado. E o ansioso queria que desse certo, mas teme que dê errado.

Ser o povo mais otimista e mais ansioso pode significar então que somos o povo que mais pensa no amanhã. Mas ao mesmo tempo em que acreditamos demais sermos o país do futuro, como reza nosso slogan extraoficial, também tememos muito as reviravoltas que nos aguardam logo adiante.

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Mas tanto otimismo e ansiedade têm dois lados, um bom e um ruim. Por temer tudo, o ansioso perde oportunidades, tem menos qualidade de vida, mas também se expõe menos a riscos, ficando menos sujeitos a acidentes, imprevistos. O otimista, acreditando que o futuro lhe sorrirá, sofre menos, é mais alegre, mas gerencia pior seus recursos, muitas vezes não se preparando para eventuais contratempos.

Só que o problema não é ser otimista ou ansioso. (Ou ambos, como em nossa paradoxal realidade brasileira). O problema é ficarmos parados, seja congelados de medo, seja esperando as promessas de um futuro melhor e deixarmos de agir agora para construir um presente melhor.

Opinião por Daniel Martins de Barros

Professor colaborador do Dep. de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP. Autor do livro 'Rir é Preciso'

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