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Psiquiatria e sociedade

Opinião|Os psicopatas entre nós - só desonestos ou graves doentes?

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[tweetmeme] A moda de ver psicopatas em tudo quanto é lugar não parece ser restrita à nossa mídia local: a comunidade científica anda, literalmente, caçando os psicopatas "bem sucedidos", aqueles que nunca foram pegos com a boca na botija (ou que não aprontaram tanto a ponto de serem incriminados). A maior dificuldade nesses estudos é encontrar voluntários: imagine o trabalho que não deve ser descobrir aquelas pessoas cuja habilidade é justamente não ser descobertas.

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Pensando nisso, um estudo publicado esse ano abordou o problema de forma inversa, e em vez de procurar os psicopatas, resolveu perguntar para psicólogos judicias, advogados e professores de psicologia se eles conheciam pessoas que pudessem ser caracterizadas como psicopatas, mas que tivessem sucesso na vida.

Contactados por carta, 81 dentre 118 dos psicólogos que responderam conheciam alguém, notadamente entre seus pares; 25 dos 31 advogados - principalmente entre seus clientes - e 41 dos 58 professores de psicologia, estes sobretudo entre pares e alunos. Para "diagnosticar" os conhecidos como psicopatas, os voluntários preencheram questionários específicos sobre personalidade, e os resultados indicaram que, além a frieza, desonestidade, manipulação, tais psicopatas de sucesso seriam menos impulsivos, mais autocentrados e controlados.

Uma questão não resolvida, e que ainda dará muito pano para manga na literatura, é se tais pessoas poderiam ser de fato consideradas psicopatas, já que na descrição clássica dessas pessoas a baixa tolerância à frustração e o comportamento impulsivo são centrais para o diagnóstico. Descrever pessoas manipuladoras e desonestas como psicopatas aponta para uma perigosa tendência de utilizar categorias médicas com finalidades sociais, preocupação que externei em recente entrevista (Link).

O comportamento humano é variável, e para um lado ou para outro sempre haverá os que sofrem ou fazem sofrer a sociedade. Mas a psicopatia é uma disfunção grave e permanente para ser usada de forma tão ampla, e traçar a linha divisória a partir de onde deixa-se de ser mau para se tornar doente é uma tarefa muito, mas muito mais complicada do que querem fazer parecer os simplistas.

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Opinião por Daniel Martins de Barros

Professor colaborador do Dep. de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP. Autor do livro 'Rir é Preciso'

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