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Psiquiatria e sociedade

Opinião|Batman e a angústia da corrupção

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Atualização:

Com atraso só justificável pela presença de um bebê em casa, fui finalmente assistir o filme Batman, o cavaleiro das trevas ressurge, último da trilogia dirigida por Christopher Nolan. Mesmo que você não tenha interesse por blockbusters ou super-heróis, vale a pena. A atual leitura do homem-morcego pouco tem a ver com os seriados dos anos 60 e 70, sucesso na TV brasileira, e mesmo com o mega-sucesso de Tim Burton, nos anos 90. Ainda que com os limitados recursos disponíveis num filme para esse fim, ele discute a questão da angústia e do luto, individuais e coletivos.

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Achei de uma coincidência ímpar um fato que até então não tinha me dado conta: o primeiro filme da trilogia, Batman Begins, estreiou no Brasil em 2005. A história mostrava uma Gotham City totalmente corrompida, com os três poderes afundados em falcatruas até um ponto sem volta, e era fácil fazer um paralelo com o escândalo recém descoberto do mensalão.

Sete anos depois, a história evoluiu para uma Gotham pacificada, na qual a corrupção está aparentemente controlada, mas em cujo subterrâneo um verdadeiro exército criminoso se prepara para tomar de assalto a cidade. Não é impossível fazer novamente uma analogia com o momento do país - quando vemos os primeiros réus do mensalão se encaminharem para uma condenação, é difícil refrear a sensação de que estamos entrando numa fase na qual a corrupção começa a ser punida, e quiçá coibida. Mas o que será que está acontecendo nos subterrâneos?

Uma das falas mais interessantes é quando o vilão diz que irá manter a esperança nas pessoas enquanto destrói a cidade, para que elas fiquem realmente desesperadas. Ele explica que somente enquanto acreditarem que podem sobreviver é que elas ficarão desesperadas, pois no momento em que acabassem as chances, terminaria esse desespero. Consciente disso ou não, ele distingue muito bem angústia e luto. Na angústia nós não sabemos mais o que fazer para mudar algo, enquanto no luto nós sabemos que não podemos fazer mais nada para mudar o que for.

A angústia de não saber se o julgamento do mensalão será eficaz para reduzir a corrupção, portanto, pode ser um bom sinal. Mostra que nós ainda acreditamos que podemos combatê-la, e que não chegou a hora de declar luto pelo país.

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Opinião por Daniel Martins de Barros

Professor colaborador do Dep. de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP. Autor do livro 'Rir é Preciso'

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