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Self-service de humor

Opinião|Urubu no Réveillon

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Atualização:

"O que me importa o que só me importa a mim?"

(André Malraux)

 

(Pixabay) Foto: Estadão

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Carta, de próprio punho, por Rosamélia. Deixada nas fronhas do leito matrimonial e lavrada nos primeiros raios desse 1º de janeiro, logo após os festejos reveiônicos:

"Sim, eu lhe perdoo, Bem-Bem. Perdoo, mas não esqueço. Vou me recordar sempre das suas presepices. Como as de agorinha de pouco, logo que deu-se 10 da noite do 31. Sempre foi assim: abriu a primeira rolha, vem a primeira desgrama. Esse ano foi botar a perder a única tarefa que lhe passei: ficar com olho de sentinela no bacalhau gratinê. Fui me banhar e, já por cima das toaletagens, senti aquele futum. Enfreguei mais água de rosas nos adebaixos. Mas, Bem-Bem, não vinha de minhas partes aquilo não, vinha era da sua desresponsabilidade: quando desci, o peixe estava esfarinhado no pretume. Urubu é de comer em passagem de ano? - até berrei nos nervosos da momentância.Desacorçoado, você logo arregimentou um Uber e foi atrás de comedoria. E quem diz que voltava? Foguete subiu, rolha de chuva de prata desceu, e nada de Bem-Bem mostrar a carantonha.Quando foi ali pelas três e tanta lá se vem a sua pessoa. Mais um homem, uma mulher e três crianças. Um trazendo um frango assado, outro a farofa amarela e o resto cada qual com uma breja nos dedos das mãos. Quando você, Bem-Bem, entrou nos explicativos a vontade que me deu foi de lhe espocar os mastigadores de torresmo, um por um, das presas aos dentes do juízo...

- Rosinha, fui buscar a ceia, peguei o Uber e o motorista era Mengo. Tinha que trazer o rapaz e o povo dele pra comemorarem as conquistas do Mister com a gente. Taí, ó: seu Zezo, dona Concha, Pedroca, Juca e Tininha. Tudo ninho do Urubu!

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O frango, a farofa e as brejas não deram nem pra cobrir o dente cariado do seu Zezo, que manguaçava e rangava mais que lima nova. Tive que descongelar pizza portuguesa, fazer requisito de cerveja ao vizinho e apurar purê pra tal da Tininha. Pode?

Mas lhe perdoo, Bem-Bem. Só que, por amor da Virgem de Montserrat, tira o homem do Uber e a família dele de cima de nossa cama."

Opinião por Carlos Castelo

Carlos Castelo. Cronista, compositor e frasista. É ainda sócio fundador do grupo de humor Língua de Trapo.

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