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Self-service de humor

Opinião|Do caderno de notas

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Atualização:

Lavar louças, como os versos, também não deve se afastar muito da música.

 

(OpenClipart-Vectors por Pixabay) Foto: Estadão

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A POÉTICA DA LAVA-LOUÇA

A poesia é um ritual, assim como lavar louças. Na pandemia, a prática da higienização das cerâmicas, plásticos e vidros cresceu exponencialmente. Com o tempo gasto diante da pia e da lava-louça surgem as idiossincrasias. As peças favoritas pela facilidade no manuseio: garfos, facas, colheres que podem ser inseridos nos furos do porta-talher e pronto. Os odiosos pratos lambrecados de manteiga, infindáveis tupperwares encardidos, canecas tingidas de achocolatado. Ah, e os utensílios usados pelas crianças, sempre inversamente proporcionais à graciosidade delas. Lavar louças, como os versos, também não deve se afastar muito da música. A melopeia se dá quando o bardo de torneira usa fones de ouvido enquanto manipula seu material. As trilhas sonoras podem ir de fugas de Bach até Sex Pistols, dependendo do tamanho da pilha. Lavar louças é pura poesia concreta.

PERDÃO E ENTREGA

Pedi compras pelo aplicativo. O entregador se embananou no setor de frutas. Trouxe água gasosa em vez natural. Cenoura no lugar de cebola. Não respondia aos chamados. Ao chegar em casa derrubou uma garrafa de 600 mililitros de cerveja no dedão do meu pé. Após todo o show de erros pediu avaliação. Dei cinco estrelas. É preciso amar os entregadores de aplicativos como se não houvesse hoje.

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LEITURAS E SÉRIES

O mundo escolheu as séries de TV como principal entretenimento. É um caminho, nada contra. No entanto, seria preferível ter optado pelos livros ruins. A maioria das séries são histórias de baixa qualidade filmadas com alta produção. É provável que digam: "ler um livro de segunda linha, em vez de assistir Netflix, é a mesma coisa". Não, não é. No livro ruim você imagina os cenários por si, é benéfico aos neurônios. Pode escolher a trilha sonora enquanto lê (bem melhor que a dos episódios, com certeza). Edita ainda a narrativa, pulando as partes chatas sem precisar mexer no controle remoto. E o melhor de tudo: não fica recebendo spam do streaming, toda hora, sobre outras séries deploráveis que vêm por aí. Ler é bom até quando é ruim.

LÁ NO FUNDO

O poço é um lugar múltiplo. Em muitas propriedades, especialmente rurais, é sinônimo de vida. Se não há poço, não há água. Se não há água, não há vida. Por outro lado, ninguém quer ir para o fundo do poço. Mesmo lá tendo água e água sendo vida. Estar no fundo dele é quase como estar à beira da morte. Ou a caminho dela. Olhe em volta, o fundo do poço é o Purgatório terrestre.

 

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Opinião por Carlos Castelo

Carlos Castelo. Cronista, compositor e frasista. É ainda sócio fundador do grupo de humor Língua de Trapo.

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