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"Ser designer é um estilo de vida"

Por Vanessa Friedman
Atualização:
Nicolas Ghesquière, diretor criativo da Louis Vuitton Foto: Reprodução

PARIS – A nova garota Louis Vuitton é descolada, adora brilho, usa minivestidos e acha graça em exibir bolsinhas com o famoso logotipo LV (há pouco tempo gostar de monogramas estava fora de moda). Mérito do estilista Nicolas Ghesquière, diretor criativo da grife francesa há dois anos e meio, que injetou frescor e um toque urbano à imagem da tradicional maison. Em entrevista ao New York Times, concedida no escritório dele, em Paris, Ghesquière fala sobre decoração, explica como funciona a mente de um estilista e conta como lida com a pressão do mundo fashion.

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Este espaço gigantesco no topo do Edifício Louis Vuitton sempre foi o escritório de design?  Não, era o showroom. Eu pedi para ocupá-lo. O coração da moda da Louis Vuitton é dividido em dois espaços: este, no quarto andar, e o segundo andar, onde estão a oficina, seleção de tecidos e tudo o mais. A Louis Vuitton é um labirinto. Nos primeiros meses eu vivia me perdendo. Parece que acontece com todos: quem chega, se perde. 

Por que você quis esta sala em particular?  É importante para mim ter um espaço aberto onde possa realmente trocar ideias com minha equipe. Não sei o que faria em um escritório particular, pois meu trabalho é interagir com muita, muita gente. Às vezes me encontro com 60 pessoas num dia. Gosto da energia de desenvolver as coisas em conjunto. Mas, ao mesmo tempo, assusta um pouco chegar a este ambiente, em que você sabe que vão cobrar novas ideias, e definir coisas, especificar coisas. Se não estiver pronto para isso, você pode se ver numa situação desconfortável. Por isso, às vezes preciso de um tempo sozinho, em casa ou outro lugar, para pôr as ideias em ordem antes de chegar à Vuitton.

 A decoração do escritório ficou parecida com a da sua casa? Na verdade, não. A mobília tem alguma semelhança, mas minha casa é mais aconchegante. Aqui é muito funcional. Sou fã da arquitetura, do design, mas preciso de uma neutralidade que deixe espaço para a criação. Assim, as cadeiras são genéricas, mas do genérico mais bonito possível. A escrivaninha é de vidro, com pés de metal. A prateleira, achei no mercado de pulgas de Paris. Gosto do modo como é presa na parede. Às vezes você precisa de coisas estáveis, que não se mexam. Em design, acho a atemporalidade mais importante que na moda. Normalmente, você renova mais o guarda-roupa que a mobília. 

É uma mobília bem moderna. Em design, gosto especialmente dos anos 70, de parte dos 80 e de um certo período dos 90, quando me mudei para Paris. Recentemente, tive uma recaída por esse período de design. Às vezes você ama, depois rejeita alguma coisa, e de repente volta a sentir atração por ela. Gosto de misturar. 

Você faz alguma coleção?  Comecei, mas parei quando senti que ia ficar viciado. Tenho algumas quedas, como por cerâmica, mas procuro ser moderado. Posso ser um comprador compulsivo. Se gosto mesmo de algo, vou longe, encho todos os quartos. Por isso, prefiro maneirar. 

Conforto é muito importante para você? Nunca fico muito tempo no mesmo lugar. Portanto, conforto importa por um tempo, mas não pelo resto da vida. Se você gosta do formato de uma cadeira, tem de aceitar que ela possa não ser exatamente confortável. Mas há um conforto espiritual em sentar nessa cadeira, e isso também conta. Sinto o mesmo em relação a roupas.

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Você vê roupa do mesmo modo que vê outras coisas de sua vida?  Ser designer é um estilo de vida. Algo que eu buscava quando garoto e quando adolescente. A capacidade de transformar tudo em moda. Pode parecer meio superficial, mas é como me expresso em relação ao que gosto. Você pode andar na rua e encontrar alguém que ache inspirador, ou, diante de uma comida excelente num restaurante, observar a cor do prato. Estranhamente, as duas coisas podem se associar no cérebro e daí nascer um vestido. 

É assim que você começa uma coleção de moda?  Começo com uma conversa com minha equipe. Discutimos o que temos em mente, avaliamos a última estação, o que fizemos, qual a tendência para a próxima, o que é importante para a Louis Vuitton, que elementos pretendemos destacar. Colocamos tudo na mesa. Ao mesmo tempo, estou pensando no que quero propor. Vou colhendo informações e construindo o esquema na cabeça. Então, vou conversar com o pessoal dos tecidos, dos couros, das bolsas, dos sapatos. Levo esboços e fazemos o que chamo de oficina, que é basicamente muito simples: usando uma modelo, começo a definir o formato da roupa, ou pego um desenho da estação passada e o transformo. Aí surge aquele momento em que procuramos formas e emoções. É hora de encontrar o tecido certo, a construção certa, a associação certa e a mulher que queremos definir. Para isso, preciso de diálogo. Procuro definir cada vestido do desfile meses antes, a textura, a forma, as cores. 

É um bocado de coisa...  Conjugar o tempo com nossa proposta é a parte mais difícil. Você tem que ficar focado. Às vezes o tempo é tão pouco que isso assusta. Você trabalha sob um ultimato. Mas hoje sei como me proteger da pressão. Sei bem como dizer não e como me distanciar. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ   

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